quarta-feira, 30 de março de 2011

PEDRO TROPEÇA NAS GUTURAIS E O GALO CANTA

Na época de Jesus ser um galileu significava ser um judeu de segunda classe. Indivíduos dessa região eram denunciados pelo sotaque, como na passagem em que Pedro nega ser um seguidor de Jesus, mas logo é identificado pelo sumo-sacerdote: “teu dialeto te denuncia” (Mt 26,73; Mc 14,70; Lc 22,59). O aramaico falado pelos hieropolitanos era considerado superior, levando em conta que a classe dominante vivia Jerusalém. Um exemplo que deixa evidente o sarcasmo que tinham que suportar os galileus perante os moradores de Jerusalém é citado por Geza Vermes. A historieta narra um galileu tentando fazer compras num mercado em Jerusalém. Como tinha dificuldade com as guturais, consoantes pronunciadas na garganta, logo se torna alvo de chacotas:
"Ô galileu, tolo, o que tu precisas é de uma coisa para montar (hamâr, um burro), de algo para beber (hamar, vinho), algo para fazer uma roupa ('amar, lã), ou algo para um sacrifício no Templo (immar, cordeiro)” (bEribin, 53b)[1].
É Pedro, teu sotaque te denuncia!

Nota:
[1] VERMES, Geza. As várias faces de Jesus. Rio de Janeiro: Record, 2006, p. 326.

terça-feira, 29 de março de 2011

YA’AKOV, QUE VIROU IÁCOBOS, QUE VIROU TIAGO...


Um dos meus alunos de hebraico que freqüenta igrejas messiânicas me perguntou o porquê dos cristãos chamarem o autor da “epístola de palha” (coisa de Lutero...) Tiago e não Ya’akov (Jacó), como consta nos manuscritos gregos. Fui conferir:
Iákobos  theos  kai  kuriou  iesos  xristos  doulos... (Tg 1,1).
Como se vê, no mundo grego Ya’akov virou Iákobos. Até aí tudo bem. Mas por que cargas d’água Iákobos virou Tiago? Continuei minha investigação e acabei achando a resposta num livro muito curioso: “A imprensa e o caos na ortografia”, de Marcos de Castro. Abaixo uma explicação do autor:

No mundo grego Ya’akov ganhou a forma Iákobos (na Vulgata Latina Iacobus). Na Espanha virou Iago, que precedida pela palavra Santo acabou se tornando Santiago (Santo Iago). O uso contínuo de Santiago gerou uma pequena confusão: em vez de Santo Iago, fez-se o corte em San Tiago. Em português ficou assim: Tiago. Na Espanha ainda permanece a forma Santiago[1].
Pronto, taí a explicação Eduardo.

Imagem:
Andrea del Sarto
São Tiago
1528-1529
Óleo sobre tela, 159 x 86 cm
Galleria degli Uffizi, Florença


Nota:
[1] Fiz um resumo da explicação apresentada pelo autor. As palavras grifadas são por minha conta. Cf. CASTRO, Marcos. A imprensa e o caos na ortografia: com um pequeno dicionário de batatadas da imprensa. Rio de Janeiro: Record, 2002, pp. 25, 26.

domingo, 27 de março de 2011

HOLI, O FESTIVAL DE CORES E ALEGRIA DO HINDUÍSMO

Devotos hindus celebrando o Holi em Vrindavan, 19/03/11
Foto via Big Picture

Celebrado em março ou abril, de acordo com o calendário hindu, o festival da primavera da Índia, o Holi, é comemorado com muitas cores e alegria. A festa, que parece ter origem num antigo ritual de fertilidade, é explicada num curioso mito: Tudo começou com a arrogância do rei Hiranyaskapishu, após exigir culto aos seus súditos. Permanecendo fiel aos deuses do hinduísmo, seu filho Prahlada foi lançado numa fogueira por sua malvada irmã Holika, que atendera ao pedido de seu pai. O que Holika não sabia é que ao passar pelas chamas juntamente com outra pessoa seus poderes ficavam enfraquecidos. O herói Prahlada passou intacto louvando seus deuses enquanto Holika morreu nas chamas. Na noite de Holi uma boneca da bruxa Holika é queimada. No dia seguinte as pessoas vestem roupas velhas e atiram água e pós coloridos umas nas outras. Quando anoitece todos se confraternizam com um feliz Holi.

Confesso que adoro esses mitos antigos. Mas eles ficam chatos quando alguém resolve historicizá-los. Uma pena... Certa vez perguntaram a um velho Xamã qual a teologia ou filosofia de sua religião. Sua resposta: não tenho filosofia ou teologia, eu apenas danço!

Belíssimas fotos do Holi deste ano aqui

sexta-feira, 25 de março de 2011

OS INTELECTUAIS E O SIONISMO

O filósofo judeu de origem sefardita, Edgar Morin, o sociólogo e catedrático argentino Sami Nair e a escritora francesa Daniéle Sallenave expressaram suas opiniões a respeito da situação dos palestinos frente à política de Israel num artigo intitulado “Israel-Palestina: o câncer” (Le Monde, 04/06/02). Abaixo, um pequeno trecho do documento (fiz uma tradução do espanhol):
Os judeus que foram humilhados, desprezados, perseguidos, humilham, desprezam e perseguem os palestinos. Os judeus, que foram vítimas de uma ordem impiedosa, impõem sua ordem impiedosa aos palestinos. Os judeus, vítimas da desumanidade, mostram uma terrível desumanidade […] o povo eleito atua como a raça superior [1].
Outro intelectual judeu que acusa Israel de praticar o racismo é Norman G. Finkelstain, filho de prisioneiros judeus no campo de extermínio de Auschwitz:
Se os israelenses não querem ser acusados de ser como os nazistas, eles só precisam parar de se comportar como nazistas[2].
Leio o Haaretz (jornal israelense de esquerda) sempre que posso. É incrível perceber que muito do que é denunciado lá em relação aos abusos cometidos contra os palestinos não aparece na mídia ocidental. Efatá!

Notas:
[1] Cf. BRUCKNER, Pascal. La tiránia de la penitencya: ensaio sobre lo masoquismo occidental, p. 63.
[2] Epígrafe do livro italiano “Israele uno Stato razzista”, de Mario Moncada di Monforte. Texto traduzido do italiano. 

quinta-feira, 24 de março de 2011

RELIGIÃO PODE ENTRAR EM EXTINÇÃO EM NOVE PAÍSES

De acordo com um estudo da Northwestern University (Illinois), o número de pessoas que se filiam a alguma religião tem decaído em países como Austrália, Áustria, Canadá, República Checa, Finlândia, Irlanda, Holanda, Nova Zelândia e Suíça.

Richard Wiener, da Corporação de Investigação em Ciências Políticas e da Universidade do Arizona, constatou que em alguns desses países o índice de pessoas que se declaram não religiosas ultrapassou 50% da população (a tradução é do Numinosum): 
Em um grande número de democracias modernas seculares tem havido uma tendência das pessoas se identificarem como não filiados a uma religião. Nos Países Baixos o número foi de 40%. O maior índice foi constatado na República Checa, que chegou a 60%.
No site da BBC News um irlandês fez um comentário sobre a matéria que merece ser lido:
Como irlandês não estou surpreso em ver que a Irlanda está na lista. A maior parte do povo irlandês na faixa etária de 30 anos rejeitou a religião. Aqueles que se casam na igreja o fazem como um gesto simbólico. Os jovens não querem perturbar os parentes mais velhos ao rejeitar abertamente a religião... isso vai fazer com que a religião tenha uma morte silenciosa na Irlanda.
Caso os países muçulmanos se convertam numa democracia secular após todas essas revoluções (num futuro não tão próximo, é claro) o risco da religião institucionalizada se tornar extinta será ainda maior. Mas é bom lembrar que o fim da religião já foi proclamado outras vezes sem que se concretizasse. 

Leia mais aqui e aqui

terça-feira, 15 de março de 2011

TRADIÇÃO E TRADICIONALISMO

A tradição é a fé viva dos mortos; o tradicionalismo é a fé morta dos vivos[1].
Nota:
[1] The emergence of the Catholic tradition (100-600), Chicaco, Univ. of Chicago Press, 1971, p.9 apud RUASCH, Thomas P. O catolicismo na aurora do terceiro milênio. São Paulo: Loyola, 2000, p. 88.

segunda-feira, 14 de março de 2011

A BÍBLIA E SUAS VERSÕES

Bíblia de Jerusalém, ed. Paulus
Por Jones Mendonça 

Desde a invenção da imprensa, no século XV, por Johannes Gutemberg, muitas versões da Bíblia foram impressas. Na medida em que manuscritos mais antigos foram surgindo (principalmente no século XIX), as Bíblias foram sendo atualizadas na tentativa de produzir uma tradução que expressasse com mais fidelidade o conteúdo dos textos originais. Ao longo do tempo foram sendo publicadas Bíblias para diversos gostos ou correntes teológicas: Versões populares, críticas, com capa colorida, com letras grandes, etc. Atualmente as Bíblias mais conhecidas são as seguintes: 

 1. As primeiras versões impressas em português

A mais antiga tradução completa da Bíblia para o português é obra de João Ferreira de Almeida, cristão protestante de origem judeu-portuguesa. Sua primeira tradução foi publicada em 1753 em três volumes.  A seguir as traduções de Almeida publicadas em um único volume.

1819 – “Versão Antiga” (BAIXE AQUI - PDF)– baseada nos modelos ingleses e holandeses do século XVII (Textus Receptus). A Almeida Corrigida e fiel (Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil) conserva até hoje o Textus Receptus como base para sua tradução.

1898 – Versão Revista e Corrigida (ou revisada) – revisão ortográfica e eliminação de termos obsoletos.

1956 – Versão Revista e Atualizada – utiliza o texto crítico, baseado em manuscritos do século IV (codex Vaticanus e Sinaiticus) descobertos após a primeira tradução de Almeida.

Em 1790 surgiu a versão de Figueiredo, elaborada a partir da Vulgata pelo padre católico Antônio Pereira de Figueiredo. Foi publicada em sete volumes, depois de 18 anos de trabalho. 

2. Edições recentes

1981 – Bíblia de Jerusalém (BJ). Tradução empreendida por exegetas católicos e protestantes e por um grupo de revisores literários. Esta Bíblia possui muitas notas críticas, que, aliás, são muito técnicas para um leitor sem formação teológica. É, sem dúvida, uma das melhores Bíblias de estudo.

1982 – Bíblia Sagrada Vozes – Tradução original do texto hebraico/aramaico e grego. Possui introdução aos livros e muitas notas (existe uma excelente versão digital em CD).

1988 – Bíblia na linguagem de hoje (BLH), elaborada pela Sociedade Bíblica do Brasil a partir dos idiomas originais. Apesar da louvável tentativa de tornar o texto bíblico acessível às pessoas menos instruídas, possui alguns anacronismos imperdoáveis, tais como a palavra “despacho” em Dt 18,11 e “médiuns” em 2 Cr 33,6.

1990 – Edição pastoral Paulus - Tradução dos textos originais em linguagem corrente. A preocupação básica, de acordo com a editora, é oferecer um texto acessível ao povo, principalmente às comunidades de base, círculos bíblicos, catequese, escolas, celebrações. As notas críticas possuem a mesma qualidade que as da Bíblia de Jerusalém, com a diferença de serem mais acessíveis àqueles que não possuem formação teológica (também ganhou uma ótima versão em CD).  

2001 – Nova Versão Internacional (NVI) - Publicada pela Editora Vida e pela Sociedade Bíblica Internacional. Tem sido elogiada pela clareza do texto. As críticas mais contundentes a essa versão vem de setores conservadores do meio protestante, por causa da adoção do texto crítico como base para a tradução do Novo Testamento.

1997 – Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB) - Segue a edição francesa tanto nas notas como no texto bíblico, sendo, porém, cotejada com os originais hebraicos, aramaicos e gregos.  

2002 - Bíblia do Peregrino - tradução do grande exegeta espanhol Luís Alonso Schökel, publicada pela Editora Paulus. É a Bíblia com o maior número de notas publicadas no Brasil. A edição brasileira é uma tradução do espanhol.

2007 – Bíblia Almeida Século XXI - As principais críticas a esta versão são excessivo conservadorismo teológico presente nas introduções dos livros e no uso não inclusivo da palavra “homem” para se referir à totalidade da espécie humana (homem e mulher). 

VÍDEOS DE ISRAEL

Quem estiver interessado em vídeos e/ou fotos das paisagens de Israel, não pode deixar de visitar o site da Albatross perspectivas aéreas.  Caso queira ir direto para os vídeos, clique aqui

Mar Morto (Israel)

FAMÍLIA DE COLONOS ISRAELENSES É ASSASSINADA NUM ASSENTAMENTO EM ITAMAR

Imagem: Desertpeace
Cinco membros da família Fogel (inclusive crianças) foram assassinados num assentamento em Itamar. O Comitê Popular Palestino de Itamar condenou a ação:
Embora o crime tenha sido cometido em terras colonizadas, vemos a morte de crianças como um crime desprezível independentemente da sua nacionalidade, sexo, cor, raça ou religião.
Imagens do funeral aqui. Enquanto atos como este continuarem sendo praticados (tanto por árabes como por israelenses) a paz na Palestina continuará sendo algo distante. 

sábado, 12 de março de 2011

BAÚ DO THÉO, UM BLOG DO SEMINÁRIO TEOLÓGICO BATISTA CARIOCA

Comecei há algum tempo a produção de um Blog para o STBC. Quem quiser dar uma olhada é só clicar aqui


MOISÉS, O MONOTEÍSMO, FREUD E AKHENATON

Robert Feather, um metalúrgico muito interessado nos manuscritos do Mar Morto (particularmente em um singular manuscrito de cobre) escreveu um livro muito interessante[1]. Ele faz várias comparações entre o culto monoteísta dirigido a Aton, divindade adorada pelo faraó Akhenaton (décima oitava dinastia: 1353-1335) e o culto israelita. Sigmund Freud já havia falado sobre isso na sua obra “Moisés e o monoteísmo”. Abaixo uma comparação entre idéias presentes no Salmo 104 e o Grande Hino a Aton. Veja você mesmo:


Nota:
[1] FEATHER, Robert. O mistério do pergaminho de cobre de Qumran: o registro dos essênios do tesouro de Akhenaton. São Paulo: Madras, 2006.

O DIA EM QUE A TERRA SANGROU

Abaixo uma imagem produzida pelo National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) mostrando a altura das ondas provocadas pelo terremoto no Japão. As ondas mais altas ocorreram no epicentro do terremoto (em preto). 

Foto: National Oceanic and Atmospheric Administration
Muitas fotos em alta resolução aqui

sexta-feira, 11 de março de 2011

TERREMOTO DE MAGNITUDE 8.9 NA COSTA LESTE DO JAPÃO

Um terremoto de magnitude 8.9 atingiu a costa nordeste do Japão nesta sexta-feira provocando maremotos no Havaí e na Indonésia. As imagens são assustadoras. Um ótimo local para conseguir informações sobre terremotos é o site do Serviço Geológico dos Estados Unidos. Lá você consulta estatísticas, mapas, animações e informações detalhadas sobre os terremotos que fazem tremer a terra (e nossas pernas) desde 1990. Para baixar um mapa mundi em alta resolução com indicação de vulções, terremotos e placas tectônicas, clique aqui e aqui.  Alguns vídeos mostrando a devastação no Japão aqui. Abaixo um mapa com informações sobre o terremoto que sacudiu o Japão:

Mapa: Serviço Geológico dos EUA

quarta-feira, 9 de março de 2011

DORME, SOFIA!

Quando minha filha nasceu pus nela o nome de Sofia (em grego, sabedoria). Inspirei-me na personagem muito curiosa do livro de Jostein Gaarder "O mundo de Sofia".  Mas lhe caberia bem um outro nome grego: "Dynamus" (poder ou potência), tamanha a sua energia. Djavan compôs uma belíssima canção (de ninar) que expressa bem minha dificuldade em fazer Sofia dormir. Para ouvi-la clique aqui

terça-feira, 8 de março de 2011

ENFIM, ACHEI O LIVRO!

Depois de muita procura finalmente achei um livro que investiga a hermenêutica a partir de Schleiermacher. E o mais surpreendente: é possível entender o que o autor diz! Isso pode parecer estranho, mas a maioria dos livros limita-se a fazer citações das obras dos principais pensadores. Tive um problema parecido quando escolhi "a moral cristã em Nietzsche" como tema de minha monografia. É um momento de extrema felicidade. 


Para dar uma espiada no conteúdo do livro, clique aqui:

DIA INTERNACIONAL DA MULHER

Hoje é o dia internacional da mulher e o Numinosum não podia deixar passar em branco uma data tão especial. O Listicles.com disponibilizou dez belíssimos posters que fazem alusão a este dia. Abaixo o que me chamou mais atenção:

FESTAS JUDAICAS

Encontrei um didático esquema que põe em paralelo o calendário judaico, com suas festas mais importantes, e o calendário ocidental (para vê-lo no contexto original, clique aqui). Fiz uma pequena adaptação traduzindo os nomes das festas. Como indica o calendário, estamos perto do Purim, uma festa comemorada de maneira bastante curiosa pelos judeus. Veja aqui e aqui.


domingo, 6 de março de 2011

CARNAVAL: FESTA DA CARNE?

Carnaval medieval: a festa funcionava como válvula de escape para os
camponeses oprimidos pela nobreza e pelo o clero. 

Sempre ouço as pessoas dizerem que a palavra carnaval significa “festa da carne”, como se o objeto festejado fosse a carnalidade, ou seja, a bebedice, a glutonaria, o sexo desenfreado, etc. Vejamos o que dizem algumas pessoas que estudaram o assunto (citações traduzidas do espanhol):
A palavra carnaval vem do italiano carnevalle, refere-se a um período de tempo que se pode comer carne: carnal ou carnevale (carne vale). Esta palavra vem do latim Carnem levare (retirar a carne), refere-se à proibição da carne durante os quarenta dias da Quaresma. É celebrado durante três dias antes da quarta feira de cinzas, que é dia em que começa a Quaresma no calendário cristão [1].
De acordo com Alcides Mareja Moreno a palavra aparece pela primeira vez no dicionário de Antonio de Nebrija, publicado em 1492 e tem origem em uma frase atribuída a Gregório Magno (século VI) para se referir ao domingo anterior à Quaresma: “dominicas ad carnes levandas”. Daí surgem as palavras carnelevarum, carnevale e carnelevare [2].

A carne, neste caso, nada tem a ver com a carnalidade no sentido paulino. No carnaval as pessoas aproveitavam para comer carne antes que sua ingestão fosse proibida. Como em toda as festas (inclusive o Natal) os excessos eram (e são) comuns.

Notas:
[1] BOBES, Jesús Maire. Teatro breve de la Edad Media y del siglo de oro. Madrid: Ediciones Akal, 2003, p. 29.
[2] MORENO. Alcides Marejas. El carnaval cruceno a través del tiempo. Casilla: Editorial La Hoguera, 1999, p. 14.

sábado, 5 de março de 2011

YANNI NO TAJ MAHAL (1997)

Andei arrumando meus antigos DVDs e encontrei um show do Yanni apresentado no Taj Mahal. A última música é de deixar o queixo caído. Fiquem atentos ao cara que toca um instrumento que se parece com um bambu. Ele rouba a cena com o som bizarro do seu instrumento e com sua estranha dança no final. Encontrei a música no YouTube e gostaria de compartilhar com os leitores do Numinosum.  Aproveitem!

ROGER WATERS DO PINK FLOYD: DERRUBEM OS MUROS!

Roger Waters, o lendário músico e membro-fundador da icônica banda Pink Floyd, fala ao Al-Jazeera sobre sua campanha apaixonada pelos direitos do povo palestino. No álbum "The wall" os muros representavam o rígido sistema educacional inglês. Waters se concentra agora nas barreiras construídas por Israel na Palestina. 



Você também pode ler sobre o assunto no The Jerusalem Post e no site da ONG palestino/israelense AIC (The Alternative Information Center). A decisão de Waters foi tomada após uma visita à Belém, em 2006 (A tradução é do Numinosum): 
Eu tinha aprendido [quando visitei] Belém, em 2006, algo a respeito do que significa viver sob ocupação, preso atrás de uma parede. Isso significa que um agricultor palestino deve assistir olivais plantados há séculos sendo arrancados. Isso significa que um estudante palestino não pode ir para a escola porque o posto está fechado. Isso significa que uma mulher precisa dar à luz em um carro, porque o soldado não vai deixá-la passar para o hospital que fica a dez minutos de distância. Isso significa que um artista palestino não pode viajar ao exterior para apresentar seu trabalho, ou para mostrar um filme em um festival internacional de cinema.
O Numinosum apóia o boicote até que os palestinos sejam tratados com dignidade. 

IMAGENS DA GUERRA NO AFEGANISTÃO

Os filmes tentam embelezar a guerra com os efeitos especiais, romances, soldados valentes, etc. Mas a guerra é sempre feia, suja, cruel. No Afeganistão a batalha contra o Talibã se arrasta e quem mais sofre é o povo, principalmente os idosos, as mulheres e as crianças.  Veja fotos recentes aqui, e reflita.  

Afegão lamenta a morte de civis após ataque aéreo da OTAN

quarta-feira, 2 de março de 2011

CODEX SINAITICUS GANHA IMPRESSÃO DE LUXO

Tommy Wasserman examinando
o codex
Segue notícia divulgada no Evangelical Textual Criticism:
O Codex [Sinaiticus] foi preservado durante séculos no mosteiro de Santa Catarina, no Monte Sinai, até que em 1844 Constantin von Tischendorf atraiu a atenção mundial [...] por sua descoberta. Nos anos seguintes, suas páginas foram divididas e dispersas. Agora, mais de 160 anos depois, após um esforço extraordinário e histórico de colaboração entre a Biblioteca Britânica, a Biblioteca Nacional da Rússia, o Mosteiro de Santa Catarina, a Biblioteca da Universidade de Leipzig e Hendrickson Publishers, todas as páginas existentes do Codex Sinaiticus foram reunidas em forma de livro.”  
Leia aqui, aqui e aqui

CARL JUNG, O CATOLICISMO E A ALQUIMIA

Apesar de protestante, Carl Jung atribuía extremo valor a alguns elementos do culto católico. Não por uma questão doutrinária, mas pela importância vital que tais elementos tinham para a psiquê humana. Certa vez ele chegou a dizer que os católicos precisavam menos de seus serviços que os protestantes, devido ao caráter terapêutico da confissão feita ao padre.  

Sobre a missa como repetição do sacrifício pascal, tão criticada por protestantes, Jung declara:
Na missa, Cristo é sacrificado como um ato atemporal do mundo exterior e ressurge sob a forma de substâncias transmutadas. O ritual de sacrifício de morte não é uma repetição do sacrifício histórico, mas o primeiro e único acontecimento eterno. A experiência da missa é, por esse motivo, a participação num momento de transcendência da vida, que resiste a todos os limites de espaço e tempo (GW 9/1, §209).
É preciso que algo fique claro. Jung não estava preocupado se tais práticas eram corretas do ponto de vista doutrinário ou se correspondiam a um fato histórico ocorrido no passado. Para ele, os ritos religiosos muitas vezes descrevem processos do inconsciente.  

Além das religiões cristãs, Jung também se interessou por religiões orientais e pela alquimia, vista por ele como um modelo ou imagem da individualização (processo de amadurecimento e transformação da psiquê). Ele demonstrou que o simbolismo dos processos alquímicos se ritualiza em sonhos de pessoas que sequer sabem o que é a alquimia. Num caminho paralelo ao de Jung seguiu Mircea Eliade, famoso mitólogo e historiador das religiões. Na sua obra “Ferreiros e alquimistas” Eliade apresenta um conjunto de mitos, ritos e símbolos associados aos ofícios de mineiro, metalúrgico e forjador, cujos segredos se transmitem de geração em geração através dos ritos iniciáticos.  

terça-feira, 1 de março de 2011

HERMENÊUTICA E REVELAÇÃO

Por Jones Mendonça

Poucos cristãos param para pensar de onde vem o material utilizado como fonte para as traduções das Bíblias modernas. Alguém mais atento poderá fazer as seguintes perguntas: Há manuscritos originais escritos de próprio punho por Isaías, Oséias, Paulo ou João? Se não, que material dispomos, onde se encontram e quando foram escritos? Todos os manuscritos de um mesmo livro são iguais ou apresentam divergências? Se há divergências, qual deles se aproxima mais dos originais? Por último: quem definiu os livros que deveriam ou não ser considerados inspirados e que critério utilizou?

É de suma importância para todo aquele que se debruça sobre as Escrituras, levando em conta seu conteúdo sagrado e relevante para os dias atuais, conhecer, ainda que de maneira sucinta, a história da transmissão do texto bíblico. Depois de acurada análise, esse leitor curioso e inquieto a respeito das coisas divinas, certamente será levado uma profunda reflexão a respeito do significado da palavra “revelação”. No texto sagrado palavra humana e palavra divina se confundem como fogo e rocha ardente expelidos das entranhas da terra. Separá-las não é tarefa fácil. Eis o desafio da hermenêutica.

Breve história do texto do Antigo Testamento

Há entre os especialistas um relativo consenso de que os primeiros registros por escrito do Antigo Testamento ocorreram por volta do ano 1000 a.C., na época da monarquia davídica. Nessa época as tradições orais relativas aos patriarcas, ao êxodo e a tantos eventos ligados à fé e à história dos hebreus começavam a ser documentados por escrito. O material mais comum para a escrita empregado na época era o papiro.

Os registros mais antigos de textos do Antigo Testamento em hebraico foram encontrados entre os anos de 1947 e 1956 em algumas grutas em Qumran, às margens do Mar Morto. Datados em geral de 100 a.C. - 100 d.C. esses documentos (pergaminho, papiro ou cobre) ficaram conhecidos como Manuscritos do Mar Morto (MMM). De todos os livros que compõem a Bíblia hebraica, apenas os livros de Neemias e Ester não foram encontrados em Qumran.

Antes da descoberta dos manuscritos do Mar Morto os documentos mais antigos disponíveis do Antigo Testamento eram códices do final do primeiro milênio. Ao invés de costuradas e enroladas em carretéis como os pergaminhos, nos códices as folhas eram dispostas como num livro moderno. Alguns dos mais importantes códices em hebraico são os seguintes:

  • O Códice do Cairo dos Profetas C: É o manuscrito massorético mais antigo conhecido pelos eruditos. Foi escrito em Tiberíades e contém os Profetas Anteriores (de Josué a Reis) e Posteriores (de Isaías a Malaquias). Foi escrito por volta de 895 por Moisés ben Asher. 
  • O Códice Or 4445 B: Também é conhecido como Códice Britânico e encontra-se atualmente no Museu Britânico de Londres. Abrange o Pentateuco com omissões. Foi escrito entre 925/930, talvez por Moisés ben Asher. 
  • O Códice de Alepo A (ou Codex Alepensis): Também conhecido como Códex aleph. Originalmente continha todo o texto do Antigo Testamento, mas um incêndio criminoso feito na sinagoga de Alepo em 1947 lhe causou danos irreparáveis. Foi escrito em Jerusalém por volta de 925/930 por Shelomoh ben Buya'a. Encontra-se atualmente na Biblioteca do Instituto Ben-Zvi, em Jerusalém. 
  • O Códice de Leningrado B19a (L): Foi escrito por volta do ano 1000 d.C. por Shemuel ben Yaakov no Cairo, Egito. Encontra-se atualmente na Biblioteca de São Petesburgo (antiga Leningrado). Este é o mais antigo manuscrito completo do Antigo Testamento e é a base da moderna Bíblia Hebraica Stuttgartensia (BHS). Uma nova edição do Antigo Testamento hebraico baseada neste códice está prevista para este ano: A Bíblia Hebraica Quinta (BHQ).
Todos os códices acima são conhecidos como Textos Massoréticos, desenvolvidos por um grupo de judeus conhecidos como massoretas (= transmissores e fixadores da tradição textual). Diferenciam-se dos manuscritos encontrados em Qumran por possuírem os sinais vocálicos e notas explicativas acrescidas ao texto.

Versões do Velho Testamento

Após a dramática experiência do exílio (586-537 a.C.), o hebraico como língua falada e escrita pelos judeus foi dando lugar ao aramaico (comunidades da Palestina e Babilônia) e ao grego (comunidades formadas em Alexandria, Egito). Esse deslocamento geográfico dos judeus fez surgir a necessidade de traduções do texto sagrado do hebraico para o aramaico (Targun) e para o grego (Septuaginta). O cisma com judeus que retornaram do exílio fez com que os samaritanos produzissem a sua própria versão do Pentateuco, que ficou conhecida como Pentateuco samaritano. Com o advento do cristianismo surgiu uma tradução para o latim (Vulgata Latina), língua oficial adotada pelo Império Romano. Após a difusão do cristianismo para outras regiões, logo surgiram versões em siríaco (dialeto do aramaico oriental falado por cristãos da Síria), copta (falado no Egito), o etiópico (falado na Etiópia), eslavo e árabe.  Tais versões são extremamente importantes, uma vez que podemos compará-las com textos escritos em hebraico e determinar variantes. Vejamos com um pouco mais de detalhes cada uma delas:

  • Os targuns - versão parafraseada em aramaico da Bíblia hebraica. Os mais antigos de que dispomos são da era cristã. Os Targuns mais importantes são os de Onquelos, amigo de Gamaliel e Jonatã Ben Uziel, suposto discípulo de Hilel. 
  • A Septuaginta – Também chamada de Setenta ou simplesmente LXX, foi elaborada por judeus que viviam em Alexandria, no Egito. Um escritor que se quis passar por um gentio chamado Aristeas relata que a tradução da LXX foi realizada por 72 judeus (seis de cada tribo) e completada em 72 dias no ano 285 a.C. Essa história é considerada inautêntica por estudiosos modernos. 
  • O Pentateuco samaritano – Escrito num dialeto da mesma família da língua hebraica e com caracteres do antigo hebraico, o Pentateuco samaritano é um manuscrito medieval preservado pela comunidade samaritana. Ele apresenta cerca de seiscentas variantes em relação ao Texto Massorético. Em Dt 27,4, por exemplo, no lugar do monte Ebal aparece o nome do monte Gerizim. 
  • A Vulgata Latina – É uma tradução do Antigo e Novo Testamento feita para o latim por Jerônimo em 404 d.C. Esta versão se tornou oficial na Igreja católica por mais de mil anos. Substituiu a Antiga Vulgata (conhecida como Vetus Latina), que por sua vez foi substituída pela Nova Vulgata no pontificado de João Paulo II, em 1995. 
  • A Siríaca – Iniciada por volta do século II d.C. a versão siríaca conhecida como Peshitta segue fielmente o texto massorético. 
Além das versões listadas acima, há ainda outras versões menos importantes, tais como a etíope (baseia-se na LXX), copta (sec. IV), gótica (também baseada na LXX - 360 d.C.), armênia (séc. V), eslavônica (séc. V) e árabes (séc. VIII ao XII).

Breve história do texto do Novo Testamento

Com relação ao Novo Testamento, as primeiras produções literárias dos discípulos de Jesus foram as cartas de Paulo, na década de 50. Marcos, considerado o primeiro dos evangelhos, parece ter sido escrito durante a guerra judaica (66-70 d.C.), ou seja, cerca de três décadas após a crucificação de Jesus. O mais antigo registro dos Evangelhos é um papiro (conhecido tecnicamente como Papiro P 52) que contém um fragmento do Evangelho de João, datado de 125 d.C. Os livros do Novo Testamento também são citados em escritos produzidos pelos Pais da Igreja. Dentre eles podemos destacar Justino Mártir, Irineu, Clemente de Alexandria e Orígenes.  

Além dos fragmentos de papiro e citações antigas feitas pelos primeiros cristãos e seus opositores, os mais importantes códices do Novo Testamento são os seguintes:

  • O Códice Alef ou Sinaítico: Foi descoberto em 1859 no Convento de Santa Catarina (península do Sinai) por um jovem catedrático da universidade de Leipzig chamado Constantin von Tischendorf. O códice foi datado para o século IV. Contém o Antigo Testamento em grego e todo o Novo Testamento, acrescido das Epístolas de Barnabé e parte do Pastor de Hermas. Encontra-se atualmente no Museu Britânico. 
  • O Códice A ou Alexandrino: Foi oferecido ao rei Carlos 1º da Inglaterra por Cirilo Lucar, Patriarca de Constantinopla, em 1627. Produzido em meados do século V, contém o Velho Testamento grego e o Novo Testamento a partir de Mt 25,6, mas omite partes do Evangelho de João (Jo 6,50 – 8,52) e II Coríntios (4,13 – 12,6). Contém ainda a Primeira Epístola de Clemente de Roma e uma pequena parte da segunda. Este documento também pertence ao Museu Britânico. 
  • O Códice B ou Vaticano: Manteve-se oculto dos estudiosos na Biblioteca Vaticana desde que lá foi colocado pelo Papa Nicolau V (1447-1455). Como o Sinaítico, foi produzido no século IV. Contém o Velho Testamento em grego (com omissões) e o Novo Testamento até Hebreus 9,14. Faltam-lhe as epístolas pastorais (Timóteo e Tito), Filemon e o Apocalipse. 
  • O Códice C ou Ephraimi Syri Recriptus: Trata-se de um palimpsesto (pergaminho reutilizado). O texto original foi recuperado porque a tinta do primeiro copista era de melhor qualidade que a do segundo. Contém fragmentos do Velho Testamento e todos os livros do Novo Testamento (com grandes omissões). Encontra-se atualmente na Biblioteca Nacional de Paris. 
Todos os manuscritos acima foram escritos em unciais (letras maiúsculas). Existem 101 manuscritos unciais dos Evangelhos, 22 de Atos e Epístolas católicas, 27 de Epístolas paulinas e 6 de Apocalipse. Além dos unciais, há inúmeros manuscritos escritos em “minúsculos”, também chamados de manuscritos cursivos.  O número de manuscritos cursivos é bem maior: 1420 dos Evangelhos, 450 do livro de Atos e Epístolas Católicas, 520 de Epístolas Paulinas e 194 do Apocalipse.

Versões do Novo Testamento

Como dito anteriormente, o Novo Testamento ganhou uma versão latina no século IV d.C., fruto do trabalho de Jerônimo. Além da versão de Jerônimo, o Novo Testamento também ganhou algumas versões siríacas (Peshita, Diatessaron e a versão Filoxeno-Harkeliana), uma versão armênia (fim do quarto século) e algumas versões em copta e etíope.

Obras consultadas:
ANGUS, Joseph. História, doutrina e interpretação da Bíblia – vol I. Tradução de J. Santos Figueiredo. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1951.
DRANE, John. Enciclopédia da Bíblia. São Paulo: Loyola, 2009.
FITZMYER, Joseph. 101 perguntas sobre os Manuscritos do Mar Morto. São Paulo: Loyola, 1997.
GEISLER, Norman L.; NIX, William E. Introdução Bíblica - Como a Bíblia chegou até nós. Tradução de Oswaldo Ramos. São Paulo: Editora Vida, 1987.
MEUNIER, Bernard. O nascimento dos dogmas cristãos. São Paulo: Loyola, 2005.
SICRE, José Luis. Introduccion al Antiguo Testamento. Estella: Verbo Divino, 2000, p.65.
SIMIAN-YOFRE, Horácio. Metodologia do Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 2000.
SCHNELLE, Udo. Introdução à exegese do Novo Testamento. São Paulo: Loyola, 2004.
VALDÉS, Ariel Álvares. Que sabemos sobre a Bíblia? – Vol II. Tradução de Afonso Paschotte. Aparecida, SP: Santuário, 1997.
VV.AA. Comentário bíblico em três volumes. São Paulo: Loyola, 1999.
VV. AA. Lexicon: dicionário teológico enciclopédico. São Paulo: Loyola, 2003.