segunda-feira, 31 de maio de 2010

EMBARCAÇÃO TURCA COM DESTINO À GAZA: AJUDA HUMANITÁRIA OU RADICAIS ISLÂMICOS?

Na madrugada de hoje tropas israelenses entraram em conflito com ativistas internacionais que ocupavam uma embarcação de bandeira turca. O episódio teve repercussão internacional.

O Haaretz publicou a versão dos militares israelenses. Segundo o jornal eles “disseram que foram obrigados a abrir fogo depois de serem atacados pelos ativistas assim que embarcaram no navio". Israel manifestou pesar pela perda de vidas humanas, mas defendeu a ação das tropas. 

A versão inicial de que os ocupantes da embarcação tinham intenção de levar ajuda humanitária para Gaza foi questionada pelo representante de Israel na ONU, Daniel Carmon: "Apesar dos meios de comunicação terem apresentado o grupo como sendo uma missão humanitária com o objetivo de entregar ajuda a Gaza, esta frota não tinha nada de humanitário". Esta notícia foi divulgada pelo G1.

O Aljazeera divulgou uma declaração do porta voz do governo israelense Mark Regev: "Eles fazem parte do CMI, que é uma organização islâmica radical turca  que tem sido investigada por governos ocidentais e pelo governo turco”.

Murat Mercan, o chefe da comissão de Relações Exteriores da Turquia, disse que isso é uma inversão do governo israelense visando encobrir seu erro: “Qualquer alegação de que os membros deste navio estão ligados à Al-Qaeda é uma grande mentira", disse à Al Jazeera.

domingo, 30 de maio de 2010

DEUS, O BIG BANG E A FÍSICA QUÂNTICA

Há duas matérias publicadas no IHU que certamente vão despertar o interesse de quem gosta de cosmologia. Para lê-las, clique aqui e aqui.

A RELAÇÃO ENTRE NEOPENTECOSTALISMO (TEOLOGIA DA PROSPERIDADE) E CAPITALISMO

Andei procurando livros que falassem sobre uma possível relação entre a teologia da prosperidade e o capitalismo e acabei me deparando com um livro do sociólogo Ricardo Mariano. Num trecho, ele destaca que o neopentecostalismo
“baseia-se na defesa da prosperidade como algo legítimo e mesmo desejável ao cristão, no estímulo ao consumo e progresso individual e em acentuado materialismo”[1].  
Mas Mariano vê uma diferença entre a ética capitalista puritana (segundo a ótica weberiana) e o neopentecostalismo. Se a ética puritana interditava ao fiel qualquer modalidade de consumo supérfluo, no neopentecostalismo o crente quer enriquecer para consumir e usufruir de suas posses nesse mundo. A motivação é consumista e mundana, fugindo totalmente  ao espírito do protestantismo ascético.


Outro livro que pode ajudar quem está estudando o assunto é este aqui:

BATISTA, Israel (org.). Graça, cruz e esperança na América Latina. Tradução de Vicente Eduardo Ribeiro Marçal. São Leopoldo: Sinodal; Quito: CLAI, 2005, p. 185.

Nota:
[1] MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do neopentecostalismo no Brasil. 1999, p. 185.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

UMA BREVE HISTÓRIA DO EXORCISMO: DO MEDIEVAL AO NEOPENTECOSTAL

Por Jones Mendonça

Quem observa as igrejas neopentecostais com sua ênfase no exorcismo muitas vezes não percebe que no passado eram os católicos que tinham a mania de ver demônio em tudo. Em 1603, Samuel Harsnett, bispo de Londres (e mais tarde bispo de York), publicou um ataque aos excessos dos exorcistas católicos, intitulado, A declaration of egregious popish impostures (Uma declaração de notórias imposturas papistas)[1]. O Vaticano parece ter ouvido as críticas de Harsnett. Em 1614, visando regular e inibir os excessos, o Papa Paulo V mandou publicar o Ritual romano. Vejamos o que ele diz a respeito da postura dos sacerdotes quando diante de um suposto caso de possessão:
O Sacerdote não deve acreditar facilmente que uma pessoa esteja possuída pelo demônio. Ele deve conhecer os sinais pelos quais uma pessoa possuída pode ser diagnosticada, diferentemente daqueles que sofrem de melancolia ou alguma doença [2].
 Dentre esses sinais estão o falar em idiomas desconhecidos,  revelar coisas ocultas e demonstrar força acima do normal. Ainda que tais “sintomas” ainda pareçam bastante inocentes, já representaram um grande avanço se comparados aos métodos descritos no Malleus Maleficarum, um manual medieval que ensinava como identificar uma bruxa. Com a entrada em circulação do Ritual Romano a descrença no diabo foi crescendo cada vez mais.

A partir da Reforma o diabo passou a ter pouco espaço no imaginário cristão.  Calvino, nas suas Institutas, declara crer na existência pessoal de anjos e demônios, mas se refere ao assunto como “coisas supérfluas” e de “frívolo saber”[3]. No século XVIII o ceticismo em relação à crença no diabo chegou ao seu auge no pensamento do teólogo reformista Friedrich Schleiermacher (1768-1834). Em seu livro “A fé cristã apresentada de forma sistemática segundo as doutrinas fundamentais da Igreja Evangélica” ele duvida abertamente da existência do diabo:
 “A idéia do diabo tal como se desenvolveu entre nós é tão instável que não podemos esperar que alguém se convença de sua verdade. Além disso, nossa Igreja nunca fez uso doutrinário da idéia”[4].
Mas a crença no "chifrudo" parece jamais ter sido um consenso até mesmo entre os protestantes. Ficou famoso o caso das “bruxas de Salém” (Massachussetts, 1692). Após uma escrava negra ter confessado induzir moças da cidade a participar de uma dança noturna com práticas de magia, teve início uma verdadeira histeria coletiva que levou à morte várias de pessoas. É preciso perguntar se quem servia ao diabo era a negra “pagã” ou os “piedosos” puritanos.

Os movimentos avivalistas e mais tarde o chamado pentecostalismo também valorizaram a atuação do diabo. Atualmente há uma verdadeira cruzada contra Satã nas igrejas neopentecostais. Dia desses alguém me dizia que a Igreja Católica estava copiando os “cultos de libertação” dos neopentecostais.  Voltemos ao início do texto...

Referências bibliográficas:
MARQUES, Renato; KELLY, Henry Ansgar. Satã, uma biografia. Tradução de Renato Rezende. São Paulo: Globo, 2008, pp. 342, 343.
VV. AA. O livro negro do cristianismo: dois mil anos de crimes em nome de Deus. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007.
CALVINO, João. Institutas – Edição clássica (latim), Livro I, cap. XIV, 2007.
KRAMER, Heinrich; SPRENGER, Jacobus. Malleus Maleficarum: El martillo de los brujos. Barcelona: Círculo Latino, 2005.

Notas:
[1] MARQUES, Renato; KELLY, Henry Ansgar. Satã, uma biografia, p.342.
[2] Id. ibid., pp. 342, 343.
[3] CALVINO, João. Institutas – Edição clássica (latim), Livro I, cap. XIV, 2007, pp. 168 e 177.
[4] MACINTOSH, H. R.; STEWART, J. S. Der christliche Glaube nach den Grundsätzen der evangelischen Kirche im Zusammenhange dargestellt Edimburgo: Clark, 1928, p. 161 apud MARQUES, Renato; KELLY, Henry Ansgar. Satã, uma biografia. 2008, p. 347.

Imagem:
Raffaello Sanzio
São Miguel e o Diabo
1518
Óleo
transferido a partir de madeira para tela, 268 X 160 cm
Museu do Louvre, Paris

quarta-feira, 26 de maio de 2010

JOSÉ DATRINO, O PROFETA DA GENTILEZA E DA TERNURA

Por Jones Mendonça

Cabelos, barba e túnicas brancos, bordão e placas coloridas nas mãos, assim peregrinava pelo Brasil José Datrino[1] (1917-1996). Era um José como tantos outros, tinha família, emprego e esperança por dias melhores. Mas como que seduzido pelo Espírito Divino e condenado ao escárnio[2] recebeu a espinhosa missão de proclamar o amor, a gentileza e a fraternidade aos homens. Da suas boca saía uma mensagem cheia de ternura e graça: Gentileza gera gentileza!. O impacto de suas palavra fizeram com que ficasse conhecido como “Profeta Gentileza”.

O fim de sua vida como homem comum se deu no dia 17 de dezembro de 1966, quando ocorreu um grande incêndio num circo norte-americano em Niterói. Tal infortúnio abalou profundamente José Datrino, que entre o meio dia e uma hora da tarde, enquanto entregava mercadorias com seu caminhão, recebeu o chamado divino. Às vésperas do Natal, comprou duas pipas de vinho de cem litros, foi à Niterói, e lá começou a distribuí-lo em copos de papel: “quem quiser tomar vinho não precisa pagar nada, é só pedir por gentileza... é só dizer agradecido”. O profeta tinha uma linguagem própria. Ele dizia: “Não diga obrigado, diga agradecido”, e “não diga por favor, diga por gentileza”.

Mas o comportamento inusitado do profeta não parou por aí. Durante quatro anos instalou-se no local do incêndio, cercou-o e transformou-o num jardim cheio de flores. Na entrada vinha escrito: “Bem-vindo ao Paraíso do Gentileza. Entre, não fume, não diga palavras obscenas, porque tornou-se agora um campo santo”. Como todo profeta que se preze, Gentileza também idealizou seu paraíso terrestre, arquétipo do paraíso celeste.

Em 1980 uma nova marca do profeta surgiu.  Inscreveu suas frases nas 55 pilastras do viaduto do Caju, no Rio de Janeiro. Ele gostava de culpar as desgraças do mundo pelo que chamava de “capeta-capital”.  Leonardo Guelman, autor do livro “Univvverrsso Gentileza”, diz que “é no capeta-capital, neologismo criado por ele [José Datrino], que se encontra ‘a origem dos  males’ e a verdadeira oposição à gentileza. O individualismo, a lógica da competição e a ética de ‘levar vantagem em tudo’ tornam-se regras desse contexto”[3]

O Escritor, jornalista e professor de literatura brasileira, Edmilson Caminha entrevistou-o em 98 no estúdio da Rádio Educativa do Piauí. Quando perguntado a respeito de sua maneira insólita de escrever, dobrando letras e  enxertando números, respondeu: “Sou eu que não sei escrever ou as pessoas que não sabem ler?”[4]. Leonardo Boff, teólogo brasileiro e um dos maiores expoentes da Teologia da Libertação, explica o motivo da repetição de letras: “Essa simbologia arquetípica aparece claramente nas mensagens do profeta Gentileza. O universo, por exemplo, vem escrito assim ‘Univvverrsso’ para significar a atuação as três divinas pessoas (vvv) em particular o Filho (rr) e o Espírito Santo (ss)”[5].  Outra curiosidade do Profeta Gentileza é que quando se referia ao amor divino, grafava “amorrr”, mas o amor mundano, ligado às coisas materiais, grafava com um r só.

Um homem com comportamentos tão bizarros certamente despertava nas pessoas os mais diversos sentimentos. Para alguns um louco, para outros um verdadeiro profeta. Aos que o consideravam louco respondia: “maluco para te amar, louco para te salvar”. Ou: “seja maluco como eu, mas seja maluco beleza, da natureza, das coisas divinas”. O ministério profético de Gentileza terminou no dia 28 de maio de 1996, aos 79 anos de idade. Sua vida expirou, mas sua mensagem continua nos falando através das coloridas e curiosas mensagens estampadas nos cinzentos viadutos da cidade do Rio de Janeiro.

Referências bibliográficas:
VIANNA, Beto (ed.). Biologia da libertação: ciência, diversidade e responsabilidade. Belo Horizonte: Mazza edições, 2008.
CAMINHA, Edmílson. Lutar com palavras. Brasília: Thesaurus, 2001, p. 293.
BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do ser humano – compaixão pela terra. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

Imagem:
Capa do livro “Univvverrsso Gentileza”
Leonardo Guelman
Ed. Mundo das Idéias
336 pags. Pb e cor
Notas: 
[1] Leonardo Boff grafa seu nome como José da Trino.
[2] O mesmo ocorreu com Jeremias, o profeta bíblico: “Seduziste-me, ó Senhor, e deixei-me seduzir; mais forte foste do que eu, e prevaleceste; sirvo de escárnio o dia todo; cada um deles zomba de mim” (Jr 20,7).
[3] Disponível em:<http://www.riocomgentileza.com.br/sinopse.html>. Acesso em 26 de maio de 2010.
[4] CAMINHA, Edmílson. Lutar com palavras. Brasília: Thesaurus, 2001, p. 293.
[5] BOFF, Leonardo. Saber cuidar. 1999, p. 182.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

O PENTATEUCO NO MAPA

Nas últimas semanas tenho trabalhado na confecção de mapas bíblicos para meus alunos. Utilizei o site bibleatlas.org e alguns programas que editam imagens para tornar o visual mais interessante.  Os primeiros mapas ilustram o Pentateuco:




Observe como o Egito é "verdinho", "verdinho". Não é à toa que quando havia fome em Canaã todos buscavam refúgio lá. Apesar do local da travessia do Mar Vermelho (ou Mar dos Juncos)  não ter sido identificado até hoje, resolvi acompanhar os mapas da maioria dos livros sobre o assunto. O mesmo pode ser dito em relação ao Monte Horebe (ou Sinai). No mapa acima ele está situado na Peníncula do Sinai, mas há que prefira a região de Midiã, na margem oriental do Golfo de Áqaba.

O LIVRO DE CRÔNICAS: UMA TEOLOGIA PÓS-EXÍLICA

Por Jones Mendonça

1. Introdução
Na Bíblia hebraica o livro de Crônicas recebe o nome de “sepher dibrê hayyamîm” (livro dos fatos cotidianos, anais). Jerônimo, parafraseando o termo hebraico escolheu o nome “Chronicon totius divinae historiae” (crônica de toda a história divina), título que foi resumido e  adotado por Lutero, permanecendo até hoje em nossas Bíblias. Na Bíblia grega (séc. III a.C.) o livro recebeu o nome de Paralipomena (coisas omitidas ou deixadas de lado). O título foi escolhido provavelmente porque Crônicas acrescenta informações omitidas nos livros de Samuel e Reis. Na Bíblia hebraica foi posto depois de Esdras e Neemias, ocupando o último lugar entre os livros canônicos.  

2. Autoria e data
Escrito após o exílio, Crônicas reconta a história de Israel com claro objetivo de exaltar seus momentos gloriosos. Os judeus atribuem Crônicas a Esdras, mas tal afirmação já não encontra defensores entre os estudiosos modernos. Atualmente o termo “cronista” tem sido usado para se referir ao autor (ou autores) do livro. Há um relativo consenso de que a obra foi redigida no século IV por membros da classe sacerdotal, tendo recebido sua forma definitiva por volta do ano 200 a.C. Muitos estudiosos pensaram que os livros de Crônicas/Esdras-Neemias fossem obra de um só autor. Os defensores dessa teoria, que foi tomada como certa até o final do século XIX, argumentavam que no processo de canonização os livros foram separados por um motivo desconhecido. Em 1934, Adam C. Welch contestou essa posição. Mais tarde, outros estudiosos, como a pesquisadora israelita Sarah Japhet e Hugh G. M. Williamson defenderam a tese de que Crônicas e Esdras-Neemias possuem origem independente[1]. Atualmente não há consenso em relação à unidade redacional dos livros.

3. Estrutura do livro
Neste livro destacam-se quatro grandes blocos: a) 1 Cr 1-9: a história de Adão a Davi, na forma de genealogias e listas; b) 1 Cr 10-29: o reinado de Davi; c) 2 Cr 1-9: o reinado de Salomão; d) 2 Cr 10-36: a história dos reis de Judá.

Na época em que o livro foi escrito havia uma intensa rivalidade entre a comunidade de Jerusalém e a de Samaria, por isso ele enfatiza que apenas o templo construído em Jerusalém por Salomão era legítimo e a dinastia davídica a única abençoada por Deus. Crônicas omite completamente a luta de Davi com Saul, suas várias esposas, a rebelião de Absalão (2Sm 15) e o pecado com Bat-sheba (2Sm 11). Apesar disso são mantidos o fato do recenseamento (1 Cr 21)  do insucesso da primeira tentativa de transferência da arca (1 Cr 15,11-15) e a recordação de que ele foi um homem que derramou sangue (1 Cr 22,7-8; 28,3). Mas se o livro omite, também acrescenta. Eventos que não aparecem em Samuel e Reis, tais como os preparativos de Davi para o templo e seus serviços litúrgicos recebem atenção especial do cronista. Cerca de um terço do primeiro livro  é composto por uma extensa genealogia, iniciada por Adão. As genealogias de Judá e Benjamim são mais desenvolvidas, já que são as tribos que viviam no território de Jerusalém. O desprezo por Saul é notório, apenas um capítulo é dedicado a esse rei (cap. 10). Muitos estranham uma genealogia tão longa no início do livro, mas é preciso compreender que os israelitas estavam recontando sua história com o objetivo de reconstruir sua identidade. Todo o restante do primeiro livro é dedicado aos feitos de Davi. Samaria é sempre vista como reino apóstata, por isso sua história é simplesmente ignorada.

O tratamento dado a Salomão também é diferenciado. O segundo livro de Crônicas começa enfatizando que Deus era com Salomão. O livro não narra, por exemplo, o brutal assassinato dos rivais de Salomão por ocasião da sua assunção ao trono (1Rs 2). Também não relata o luxo, a idolatria e a vida dissoluta que levou no final do seu reinado. Os sacrifícios oferecidos no templo e a instituição dos sacerdotes por Salomão também recebem grande destaque. Fatos inéditos surgem no livro. Os eventos descritos em 2 Cr 8,13-16, por exemplo, não aparecem em Reis.

4. Teologia
Diferenças teológicas entre Crônicas e Samuel/Reis são bem evidentes. O exílio parece ter feito os teólogos judaítas refletirem sobre várias questões. Satã, por exemplo, que aparece em Samuel e Reis apenas um substantivo que significa adversário (ver 1Sm 29,4; 2Sm 19,22; 1Rs 5,4; 1Rs 11,23), é personificado em Crônicas surgindo como o opositor do próprio Yahweh. Comparar o texto de 2Sm 24,1 com 1Cr 21,1 mostra essa nova percepção teológica.
A ira do Senhor (Yahweh) tornou a acender-se contra Israel, e o Senhor (Yahweh) incitou a Davi contra eles, dizendo: Vai, numera a Israel e a Judá (2 Sm 24,1).
Então Satanás (Satan) se levantou contra Israel, e incitou Davi a numerar Israel (1Cr 21,1 ).
O livro de Crônicas também evita o nome Jacó, substituindo-o por Israel (2 Cr 30,6), talvez pela proximidade do nome Yacob(el) com yacab (trapaceiro). A teologia da retribuição, uma característica bem presente na obra historiográfica deuteronomista (Josué a Reis) continua forte no livro. Os últimos reis de Judá são apresentados como maus, por isso Deus decide finalmente purificar seu povo, fazendo-o passar pela prova do exílio babilônico, que durou cerca de meio século. Outra característica de crônicas é a valorização da função dos levitas. 1 Cr 23,3-5 lhes confere quatro tarefas: O serviço na casa de Yahweh, o serviço como funcionários e juízes, porteiros e músicos litúrgicos. Termos chave como “buscar a Deus”, “humilhar-se”, “praticar o que é bom, justo e verdadeiro perante Deus” são típicos no livro. Georg Steins acrescenta que “É o Templo que constitui o centro gravitacional da exposição cronista e da sua teologia”[2].

A obra termina com a transcrição do decreto de Ciro, rei da Pérsia, que concede aos judeus exilados a permissão de voltar à pátria e reconstruir o templo destruído pelos babilônios. Com isto começa uma nova etapa na história da salvação.

Referências bibliográficas:
DONNER, Herbert. História de Israel e dos povos vizinhos: São Leopoldo: Sinodal, 1997.
GABEL, John B. A Bíblia como literatura. São Paulo: Loyola, 1993.
GUNNEWEG, Antonius H. J. Teologia bíblica do Antigo Testamento. São Paulo: Editora Teológica: Edições Loyola, 2005.
SCHMIDT, Werner H.; SCHMIDT, Wermer. Introdução ao Antigo Testamento. São Leopoldo: Editora teológica: Edições Loyola, 2005.
GRADL, Felix; STENDEBACH, Franz Josef. Israel e seu Deus: guia de leitura para o Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 2001.
TÜNNERMANN, Rudi. As reformas de Neemias: a reconstrução de Jerusalém e a reorganização de Judá por Neemias no período persa. São Leopoldo: Sinodal: São Paulo: Paulus Editora, 2001.
VV.AA. Introdução ao Antigo testamento. São Paulo: Loyola, 2003.
VV.AA. Nuevo comentário bíblico. El Passo, TX: Casa Bautista de Publicaciones, 1996.
VV.AA. Lexicon – Dicionário teológico enciclopédico. São Paulo: Loyola, 2003.


Notas:


[1] Cf. TÜNNERMANN, Rudi. As reformas de Neemias: a reconstrução de Jerusalém e a reorganização de Judá por Neemias no período persa, 2001, pp. 34, 35.
[2] VV. AA. Introdução ao Antigo testamento. 2003, p. 221.

sábado, 22 de maio de 2010

EUA QUEREM MESMO UM ACORDO COM O IRÃ?

O governo dos Estados Unidos tenta impedir a todo o custo que o Irã consiga enriquecer urânio num nível que permita a construção de uma bomba atômica. Seria uma iniciativa louvável, caso liderasse uma campanha mundial pelo desarmamento atômico e inutilizasse suas 10.500 ogivas nucleares[1]. França, China e Reino Unido também possuem esses “brinquedos”. Outros países com potencial nuclear são a Índia, Paquistão, Israel e Coréia do Norte.

O Al Jazeera publicou uma matéria louvando a iniciativa do presidente Lula. O autor do artigo ironiza a postura norte americana, que aparentemente não quer qualquer tipo de acordo com o Irã.

Nota:
[1] VON, Cristina. A cultura da Paz. São Paulo: Peirópolis, 2003, p.26.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

ENCONTRADO ALTAR ROMANO DO SEGUNDO SÉCULO

Foi anunciada ontem pela Autarquia Israelense de Antigüidades a descoberta de um altar romano datado do primeiro/segundo século d.C. O objeto, adornado com cabeças de touros e uma coroa de louros, foi encontrado na área onde será construída uma sala de emergência no hospital Barzilai, em Ashkelon.

A área se tornou foco de intensa polêmica após terem sido encontradas ossadas humanas no local. No entendimento de alguns grupos ortodoxos judaicos, caso os ossos fossem de judeus, a obra deveria ser interrompida.

Diante dessa descoberta, os ossos parecem ser de pagãos (odeio esse termo, mas não pude achar outro melhor). 

Leia aqui a polêmica envolvendo o caso dos ossos.


Fonte: Haaretz

quinta-feira, 20 de maio de 2010

PEQUENOS APONTAMENTOS SOBRE O RACISMO NO BRASIL

Antes da abolição da escravatura circulou no Brasil um dicionário enciclopédico de autoria de Araújo Correia Lacerda.  Ele assim definia o negro: “escravo, preto; que macula, denigre, calunia; horrível, hediondo, medonho, tenebroso, malvado, cruel”[1]. Tal definição parece pouco crível, mas é verdade.

Vejamos agora um Código de Postura que vigorava em São Paulo:
 Art. 46 – São proibidos na cidade os bailes de pretos (de qualquer natureza), salvo com licença de autoridade policial: multa de 10$ e três dias de prisão”[2].
 Art. 62 – São proibidas as cantorias e danças de pretos se não pagarem os chefes de tais divertimentos o imposto de 10$[3].
Sei que estou um pouco atrasado para o dia da consciência negra (13 de maio), mas acho que sempre é momento para refletirmos sobre o racismo. Permitam-me a heresia de modificar levemente um texto bíblico:
“Então não haverá nem judeu nem negro, nem bárbaro nem cita, nem escravo nem livre, mas somente Cristo que será tudo em todos” (Col 3,11). 
Negro, grego... que diferença faz!

Notas:
[1] DOMINGUES, Petrônio. Uma história não contada: Negro, racismo e branqueamento em São Paulo: SENAC, 2003, p. 7.
[2] CLMSP (São Paulo: Tip. Correio Paulistano, 1883), p. 270, Postura Municipal de Amparo apud DOMINGUES, Petrônio. Uma história não contada: Negro, racismo e branqueamento em São Paulo: SENAC, 2003, p.36
[3] CLMSP (São Paulo: Tip. Correio Paulistano, 1887), p. 291, Postura Municipal de Paranapanema apud DOMINGUES, Petrônio. Uma história não contada: Negro, racismo e branqueamento em São Paulo: SENAC, 2003, p.36.

O GENIAL NATURALISMO BARROCO DE CARAVAGGIO


O gosto pelo desenho e pela pintura é algo que cultivo desde a minha infância. Sou fascinado pelo surrealismo, principalmente pelo de René Magritte, e Salvador Dali.  Mas o naturalismo barroco do italiano Michelangelo Merisi, mais conhecido como Caravaggio (1573-1610), é algo que também me impressiona. Caravaggio gostava de retratar pessoas simples, tais como camponeses e prostitutas. Em uma das suas obras São Mateus foi retratado como um humilde artesão. Em outras telas os apóstolos surgem com a pele curtida pelo sol e pelo vento. Caravaggio sentia que o evangelho havia sido pregado aos pobres pelos pobres[1]. O espírito crítico da Reforma havia influenciado o pintor italiano, que inquietava a ortodoxia católica com suas inovações.

Seria Caravaggio um continuador da obra de Francisco de Assis segundo um viés artístico? Um precursor da Teologia da Libertação numa linguagem estética? Suas telas refletem a personalidade forte, às vezes violenta, de uma pessoa que passou a fugir da justiça italiana após matar um homem numa briga.

Uma de suas obras mais impressionantes é uma tela que retrata Davi com a cabeça degolada de Golias. É interessante notar que Davi não é apresentado com uma expressão triunfante. Seu olhar é sério, como o de quem cumpriu uma tarefa necessária, mas paradoxalmente fatídica. O fundo é escuro, não se vê a multidão que certamente acompanhou o combate e nem a paisagem de fundo. Com este artifício a cena ganha intensidade e dramaticidade. O contraste causado pelo jogo de luzes reforça o efeito, dando a impressão de que os personagens saltam da tela. A oposição entre luz e sombra é uma especialidade de Caravaggio. Por causa desse talento fora do comum, muitos pintores seguiram seu estilo, que acabou ficando conhecido como caravagismo.

Simplesmente fantástico!

Referências bibliográficas:
ARGAN, Giulio Carlo. Renacimiento y barroco. Madrid: Ediciones Akal, 1999.
BARBE-GALL, Françoise. Cómo hablar de arte a los ninõs. San Sebastián: Editorial Nerea, 2009.
MÂLE, Émile. El arte religioso de la contrarreforma. Madrid: Ediciones Encuentro, 2001.

Nota:
[1] MÂLE, Émile. El arte religioso de la contrarreforma. Madrid: Ediciones Encuentro, 2001, p. 21.

Imagem:
David
Caravaggio (Michelangelo Merisi)
1606-07, óleo sobre tela, 90,5 x 116 cm
Kunsthistorisches Museum, Viena (Áustria)