terça-feira, 31 de dezembro de 2013

FRAGMENTOS DA TEOLOGIA REFORMADA [PROVOCAÇÕES]

A retomada da teologia agostiniana pelos reformadores trouxe de volta antigas questões. Como explicar a presença do mal no mundo? Como o homem pode ser responsabilizado por suas faltas se no fundo correspondem aos decretos divinos? Se a soberania de Deus é absoluta qual o papel do diabo e dos humanos?

Para Lutero não há vácuo de poder. Todo o poder é poder de Deus. Daí a frase: “o diabo é o diabo de Deus”. Tal ênfase levou o reformador a dizer: “não sei se Deus é o diabo ou se o diabo é Deus”. Lutero percebeu uma dimensão “demoníaca” no sagrado (o tema é amplamente discutido por Jung e Tillich). É o “Deus que trucida”, que “como o fogo consome uma casa”, que “nos atormenta e nos tortura sem se importar conosco”. O reformador rejeitou totalmente o dualismo. Deus, uma espécie de déspota volúvel.

Calvino, como Lutero, via Satanás como absolutamente sujeito aos decretos divinos. Não age com a permissão de Deus, mas de acordo com sua vontade. É a ação divina na ação do diabo. Ocorre que para Calvino a dimensão “demoníaca” do sagrado é totalmente repudiada. A lei, o juízo, a santidade e a pureza são temas bastante presentes na teologia calvinista. O mesmo Deus que decreta o pecado é o Deus que odeia esse pecado. O resultado: um temor quase neurótico do impuro.



Jones F. Mendonça

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

NATAL

Ano zero, início do calendário cristão: Herodes, pastores, magos do Oriente, presentes inauditos, estrela no céu, manjedoura na terra. Nasce Jesus, o belemita, da estirpe de Davi. Jesus rei asceta que a tradição consagrou.

Terra de gentios, homem de Nazaré no tempo do Augusto César. Peregrino na Galileia, confins de Zabulom e Naftali. Discípulo do João que batiza nas águas barrentas do Jordão. Que anuncia um reino terreno sem templo, sem sacerdotes e sem o servilismo imperial. Jesus da história que a igreja apagou.

Jesus da bênção, Jesus das sandálias desbotadas.  Jesus do céu, Jesus da terra. Jesus do kerigma, Jesus da história. Jesus de todos nós.


Jones F. Mendonça


segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

O NOVO TESTAMENTO DE ERASMO NA BIBLIOTECA NACIONAL

André Fonseca, meu aluno, dá aula de inglês no centro do Rio. Entre um aula e outra acabou dando um pulinho na Biblioteca Nacional. Examinou três edições do Novo Testamento grego de Erasmo de Roterdã: 1516, 1527 e 1543 (sim, a Biblioteca Nacional possui esses exemplares e podem ser manipulados por você!). 

Algumas de suas observações podem ser lidas aqui


Jones F. Mendonça

sábado, 21 de dezembro de 2013

HISTÓRIA DA ARTE: EGITO ANTIGO


Aos interessados na arte egípcia recomendo "A history of art in ancient Egypt, Vol. I e II, no projeto Gutemberg. Destaque para o capítulo IV - a arquitetura sagrada do Egito. A figura 210, por exemplo, mostra um interessante tabernáculo portátil egípcio da 19ª dinastia.


Download gratuito aqui. 




Jones F. Mendonça

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

ESPERTINHOS

Durante o festival Yadnya Kasada devotos hindus lançam oferendas na cratera do monte Bromo, Indonésia. Alguns espertinhos, aproveitando-se da ocasião, posicionam-se na borda da cratera com o objetivo de coletar as iguarias arremessadas pelos devotos. 

Foto: The Atlantic

Jones F. Mendonça

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

AS FESTAS JUDAICAS NO EVANGELHO DE JOÃO

"e era inverno" (Jo 10,22). Foto: YNet

Jo 5,1  Depois disso havia uma festa dos judeus; e Jesus subiu a Jerusalém (Pentecostes? Purim? Trombetas?).

Jo 6,4  Ora, a páscoa, a festa dos judeus, estava próxima (mês de nisan=mar/abr).

Jo 7,2  Ora, estava próxima a festa dos judeus, a dos tabernáculos (mês de tishri=set/out).

Jo 10,22  Celebrava-se então em Jerusalém a festa da dedicação (Hanukkah). E era inverno (mês de kislev=nov/dez).

Jo 19,14  Ora, era a preparação da páscoa, e cerca da hora sexta. E disse aos judeus: Eis o vosso rei (mês de nisan=mar/abr).

Mais sobre as festas judaicas aqui e aqui.



Jones F. Mendonça

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

NOVA IMAGEM DE CABEÇALHO [CARAVAGGIO]

Decidi mudar a imagem de cabeçalho do Blog. Voltei com o belíssimo "São Jerônimo escrevendo", de Caravaggio. O artista adorava sombras e tons escuros. Um crânio está sobre a mesa, contrapondo-se à imagem do autor da Vulgata Latina, alusão à caducidade das coisas. 



Jones F. Mendonça

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

DE REIS, SACERDOTES, PROFETAS [E LADRÕES]

Na Bíblia hebraica reis, sacerdotes e profetas geralmente são tratados com respeito. Mas nos chamados “livros proféticos” as manifestações críticas às cerimônias religiosas mortas e aos líderes mercenários e egoístas são abundantes. Amós, por exemplo, critica sem pudor os reis (e suas esposas, aquelas “vacas”, cf. 4,1), sacerdotes e até profetas.

Isaías critica os jejuns artificiais e os cultos hipócritas (1,13-14; 58). Denuncia os crimes cometidos pelos “príncipes rebeldes e companheiros de ladrões” (1,23). O profeta enxerga o Israel de seu tempo como sendo composto por pessoas muito preocupadas com o “culto solene” e ao mesmo tempo indiferentes aos desamparados como órfãos e viúvas.

Oseias não mede palavras para denunciar reis corruptos (5,1) e “sacerdotes assassinos que matam no caminho para Siquém” (6,9). “Quero misericórdia e não sacrifícios” (6,6), proclama o profeta, filho de Beeri.

Miqueias acusa os “cabeças de Jacó” (líderes de Israel) de abominarem o juízo e perverterem o direito (3,9).  Chama os sacerdotes de “interesseiros” e os profetas de “mercenários” (Mq 3,11).

Diante da injustiça que toma conta de Israel, Amós expõe aos quatro ventos a inutilidade das festas religiosas, das reuniões solenes, dos sacrifícios e dos cânticos, tornados desprezíveis diante de um cenário no qual impera o suborno, os pesados tributos sobre o pobre e o abandono dos necessitados à porta (5).  

Malaquias, conhecido apenas pelo versículo “trazei todos os dízimos à casa do tesouro” (3,10), faz graves denúncias aos sacerdotes que “tropeçam na lei” (2,8) fazendo acepção de pessoas (2,9).  Vaticina que o excremento dos animais sacrificados será lançado em seus rostos e que serão considerados tão imundos quanto esses dejetos fétidos (2,3, cf. Lv 4,11).

Hoje você denuncia aquele “profeta ladrão”, aquele “sacerdote explorador”, aquele “rei ungido” que usa a política para manipular fiéis ingênuos, aquele “levita” que enriquece às custas de fãs transloucados e é tido como herege. Dois mil anos e pouca coisa mudou...



Jones F. Mendonça

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O ORIENTE MÉDIO E OS BASTIDORES DA DIPLOMACIA

De acordo com diversos analistas os EUA tem se afastado gradativamente dos problemas do Oriente Médio. Supõem que o motivo seja sua auto-suficiência em petróleo. O Irã está cada vez mais perto de conseguir um artefato nuclear e o país de Obama mostra-se tímido nas negociações. Israel e Arábia Saudita fazem alarde. Caso consiga produzir uma artefato nuclear os dois países serão alvos em potencial.

Pessoalmente duvido muito que o Irã tenha a intenção de atacar qualquer país vizinho, mesmo sendo liderado por radicais xiitas. O que o país persa quer é construir uma blindagem contra ações militares estrangeiras em seu território e conquistar a hegemonia na região. Mesmo que obtenha sucesso não terá ainda mísseis capazes de atingir países como os EUA, mas os vizinhos que se cuidem.

Em Israel já se fala no fim da parceria EUA/Israel (leia este artigo publicado no Haaretz, 05/12/13). Lembro que um dos principais aliados dos EUA no Oriente Médio já foi – acreditem - o Irã. Depois da revolução islâmica, em 79, a aliança se desfez e Israel foi se fortalecendo cada vez mais como parceiro político. Estaria Israel temendo perder privilégios para os iranianos?

Guga Chacra, do Estadão, duvida que a aliança EUA/Israel esteja no fim (leia aqui). Ele chega a especular um alarde exagerado do primeiro ministro israelense a fim de facilitar o acordo entre Obama e Rouhani. Os protestos inflamados de Natanyahu seriam pura encenação planejada em coordenação com Washington, visando pressionar a ala mais radical do Irã a dar carta branca para Rouhani nas negociações. Será?

Certo mesmo é que o cenário no Oriente Médio dá sinais de mudança. O futuro, no entanto, continua incerto. Você tem um palpite?


Jones F. Mendonça

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

O FUNDAMENTALISTA

Você diz que adora chocolate. Ele se apressa: “adorar só a Deus”. Você diz que Pelé é o rei do futebol. Ele não perde tempo: “rei é nosso Senhor Jesus Cristo”. Você diz que está com dor. Vem um versículo: "Ele levou sobre si as nossas dores". Você espirra. Ele grita: "sai demo!"

Sujeito chato!



Jones F. Mendonça

JESUS, HUMANISTA ANTES DO HUMANISMO

Pouco antes de divulgar suas 95 teses contra as indulgências, em 31 de outubro de 1517, Lutero escreveu 97 teses contra a escolástica. Em sua tese 50 o reformador alemão chegou a dizer que “Aristóteles está para a teologia como as trevas estão para a luz’. Mas o fantasma do filósofo grego desprezado pelo reformador não iria deixar seus continuadores em paz.

Foi-se Lutero, foi-se Zwínglio, foi-se Calvino e algumas lacunas deixadas pelos reformadores logo passaram a ser alvo da investigação minuciosa da ortodoxia luterana e calvinista. A lógica de Aristóteles voltava à cena com trajes de gala e cabelo engomado.

No âmbito calvinista, por exemplo surgiram discussões tão proveitosas quanto a natureza sexual dos anjos. Os teólogos reformados não conseguiam dormir pensando em qual teria sido a ordem lógica dos decretos de Deus. Os supralapsarianos (supra = antes + lapso = queda) entendiam que o decreto da predestinação ocorrera antes da queda. Para os infralapsarianos (infra = abaixo, depois) o decreto da predestinação deve se situar depois da queda. Coisa muito útil.

Entre os luteranos a coisa descambou para outro lado. As conclusões de Galileu a favor do heliocentrismo, por exemplo, deixaram Valentin Ernst Löscher com uma baita dor de cabeça. Ele defendeu que o que se chama “escolástica luterana”, propondo uma reformulação da metafísica de Aristóteles. Löscher achava que as observações feitas por meio dos telescópios não eram confiáveis, afinal foram feitas pelos olhos de um pecador (!). Lessing deu boas risadas desse argumento. Houve ainda uma certa obsessão por confissões doutrinárias. Sobraram discussões a respeito da ceia, da união hipostática e da predestinação.  

Século XXI e de modo geral os protestantes continuam obcecados por doutrina. E pensar que mesmo o Jesus do kerigma, aquele anunciado por seus seguidores nas linhas dos evangelhos, não se mostrava preocupado com formulações teológicas sofisticadas e rígidas. Em uma de suas falas enfatizou que não se deve colocar a doutrina acima do homem: “o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado”. Foi humanista antes do humanismo. Mataram-no.



Jones F. Mendonça

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

QUANDO O SOL ABRAÇAR O SHEOL

Daqui a cinco bilhões de anos o combustível do sol vai se exaurir. O astro rei irá se tornar uma gigante vermelha e engolirá os planetas mais próximos. A terra se converterá num pavio fumegante. Depois da exuberante expansão - seu último suspiro - o sol irá se contrair até se tornar uma opaca e densa anã branca. A terra, agora sem lastro, vagará seca e morta pelo infinito vazio.

GIGANTE VERMELHA
Horizonte em mil sóis,
Lavas rubras flertando indóceis o último quinhão da energia
Fogo ardente em convulsão, réquiem da agonia.
É o sol deitando em seu esquife, para não sorrir jamais.



Jones F. Mendonça

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

AS PLACAS E AS VACAS

As placas foram feitas para as vacas e não o contrário. Quanta gente age como essas vacas...



Mais: IranCartoon


Jones F. Mendonça

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

FUNDAMENTALISMO [PROVOCAÇÕES]

Fé cega, razão manca, obra estéril, coração cadáver.
Extremismo que desintegra a alma, a humanidade.
Piedade muda, sensibilidade surda.
Certeza de cristal sob o manto de um discurso ardente.
Diatribe oco levado pelo vento da ignorância...



Jones F. Mendonça

SOLA TRADITIO

“Toda a Escritura é divinamente inspirada...”, diz-nos um verso da segunda carta a Timóteo (2Tm 3,16). Tal “Escritura” não pode ser uma referência a Bíblia completa tal como conhecemos hoje (Antigo e Novo Testamento) por duas razões óbvias:

1) A Bíblia só ganhou sua forma atual no século IV, após muitas divergências quanto à canonicidade de alguns escritos que circulavam entre os cristãos.
2) No verso anterior o autor da carta exalta Timóteo por conhecer “desde a infância as sagradas letras”.

No tempo da infância de Timóteo os quatro Evangelhos sequer existiam. “Escrituras”, neste texto, é uma referência às Escrituras judaicas (Tanak) na qual Timóteo fora instruído como filho de uma mulher judia (cf. At 16,1-3).

É verdade que a carta de Pedro atribui valor escriturístico a alguns escritos de Paulo (2Pe 3,16), mas a carta só foi escrita na década de 80 e com certeza não abrange todo o material que compõe o Novo Testamento. Apocalipse, por exemplo, só foi escrito cerca de uma década depois e as epístolas gerais não são mencionadas.

Para crer que a Bíblia é a Palavra de Deus é preciso apelar à inspiração e inerrância dos hagiógrafos, à exatidão dos copistas e por fim à orientação divina aos padres que decidiram o cânon no final do século IV. Enfim, para crer que a Bíblia é a palavra de Deus é preciso crer na tradição.

E me aparece um sujeito ingênuo berrando aos quatro cantos: “sola scriptura”.



Jones F. Mendonça

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

A "LÓGICA FREEMAN" II

Zuleica tem sido constantemente assediada por seu chefe. Resolveu aplicar o conselho de Morgan Freeman ao seu problema: “a melhor maneira de combater o racismo é não falar sobre ele”. Zuleica já foi estuprada três vezes pelo patrão. Continua calada esperando que as coisas se resolvam naturalmente.

Acorda Zuleica, Freeman é ótimo ator, mas péssimo conselheiro.


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A "LÓGICA FREEMAN"

João e Maria são um casal. João só toma banho em dias pares apesar de morar num país tropical. Maria só escova os dentes em dias ímpares apesar de comer a cada quinze minutos. João odeia mau hálito. Maria não suporta cheiro de suor. Os dois resolveram aplicar a famosa frase do ator Morgan Freeman aos seus problemas conjugais: “a melhor maneira de combater o racismo é não falar sobre ele”.

João finge que não existem problemas em seu casamento. Maria faz o mesmo. Essa é a lógica Freeman...


Jones F. Mendonça

terça-feira, 12 de novembro de 2013

O DRAMA DE TEÓFILO E O “FIDES QUAERENS INTELLECTUM”

Teófilo Eusébio. Quarenta e dois anos. Casado. Pai de dois filhos. Crise da meia idade e ele reflete sobre a religião herdada de seus pais. Sempre pensou que sua conversão ocorrera devido à aceitação de uma doutrina. Invertendo santo Anselmo pensava buscar "compreender para crer". Uma decisão baseada na razão, portanto. Começou a achar que estava enganado.

Tratou de pensar que o indivíduo que adere a uma religião faz isso sem conhecer suficientemente seus fundamentos. No caso do cristianismo, por exemplo, em primeiro lugar o sujeito declara seu desejo de participar do grupo de fé (não resiste ao apelo e “levanta a mão” no culto ou explicita seu desejo ao pastor). Tal decisão – pensa - não pode ser racional. Num segundo momento ele aprende os dogmas, os códigos morais, a linguagem religiosa, a liturgia... E então começam as dúvidas, as perguntas, as inquietações.

A decisão primária parte de uma crise existencial e não de um julgamento racional. A razão só é acionada depois. Trata-se de uma razão manca, é verdade, mas que se esforça para justificar sua crença aos ateus, aos agnósticos, aos deístas e membros de outras religiões e a si mesmo. No âmbito protestante tal tarefa cabe à apologética. Entre os católicos à teologia fundamental.

O Teófilo do Evangelho de Lucas (Lc 1,3), xará do nosso personagem, parecia buscar razões mais sólidas para a fé que acabara de aderir: fides quaerens intellectum (a fé em busca de entendimento), como gostava de dizer Agostinho, teólogo que se esforçou para apresentar o cristianismo nos termos da filosofia platônica. Na escolástica foi a vez de Tomás de Aquino, impulsionado pala lógica aristotélica. A filosofia dava seus trotes sob o pulso firme da teologia: Agostinho abraçado a Platão, Aquino empoleirado em Aristóteles.

No século XX a “fé que busca compreender” ganhou ares sofisticados e linguagem quase hermética. Alguns deles inspirados num novo princípio hermenêutico: o existencialismo de Heidegger. Assim foi com Bultmann e Tillich. Amparada na teoria da evolução de Darwin apareceu Teilhard de Chardin e sua cristologia cósmica. E outros, como Bonhoeffer (secularização), von Buren (neopositivismo), Moltmann (filosofia da esperança de E. Bloch), etc. As Escrituras lidas e interpretadas com as lentes das filosofias e cosmovisões do século XX. A velha apologia renovada com Botox e bisturi.

Teófilo Eusébio leu todos esses teólogos em busca de uma justificativa racional para sua fé. Não encontrou. Debruçou-se sobre os livros de Craig e Plantinga, atuais ícones da apologética cristã. Pura ilusão. Quer saber se tornou ateu? Não, não se tornou. Continua indo aos cultos onde dirige um pequeno coral. Participa dos sacramentos. Encanta-se com a arquitetura das igrejas góticas. Distribui de sopa aos sem teto. Não faz isso para herdar o céu o por medo do inferno. Mantém–se ligado à religião porque de alguma forma ela o atrai (sim, ele se vê como uma mariposa ao redor de uma lâmpada acesa). Gosta de religião como gosta de olhar a lua ou o dorso de uma mulher. Talvez seja ingênuo. Talvez seja um niilista como supôs Nietzsche. Talvez seja um neurótico como defendia Freud. Talvez a religião seja para ele uma espécie de ópio como dizia Marx.

Talvez...


 Jones F. Mendonça


segunda-feira, 11 de novembro de 2013

ACAN, ACAR, OCAR, ACOR E O TUMULTUADO TEXTO DE JOSUÉ 6-7

No capítulo seis do livro de Josué toda a cidade de Jericó é declarada “herem”, exceto Raabe, livrada da morte por ter acolhido os mensageiros israelitas. Na história Acã (Akan) acaba punido por ter subtraído alguns objetos incluídos no herem. Tal atitude implicou na extensão do herem a todo o arraial de Israel (cf. 6,18), perturbando-o (hb. akar). A solução encontrada para que a ordem fosse restabelecida foi a morte da Acã. Há quem traduza a palavra hebraica herem por “maldito” ou “condenado”, ou “destruído” ou ainda “anátema”. Dada a carga negativa que tais palavras trazem esse texto geralmente tem sido mal interpretado.  

De acordo com o texto Acã apanhou, além de uma capa babilônica, “duzentos siclos de prata, e uma cunha de ouro do peso de cinqüenta siclos”, objetos declarados herem que deveriam ser “consagrados” (hb. qodesh) a Yahweh (cf. 6,19). Um leitor atendo sente-se confuso: como tais objetos poderiam ser ao mesmo tempo “condenados” (herem) e “santos” (qodesh)? Compare:

O herem-qodesh - Js 6,19  e toda a prata, e o ouro, e os vasos de bronze e de ferro, são santos (qodesh) a Yahweh; irão para o tesouro de Yahweh.
O pecado - Js 7,1  Mas os filhos de Israel cometeram uma transgressão no tocante ao anátema (herem), pois Acã [...] tomou do anátema (herem); e a ira do Senhor se acendeu contra os filhos de Israel.
A confissão - 7,21  quando vi entre os despojos uma boa capa babilônica, e duzentos siclos de prata, e uma cunha de ouro do peso de cinqüenta siclos, cobicei-os e tomei-os

Ocorre que “anátema”, “coisa condenada”, “destruída” ou “maldita” não traduzem bem o termo hebraico. Herem é coisa isolada, interditada para um propósito específico. Não é sem razão que em alguns textos herem é traduzido por rede (como em Ez 32,3, Hab 1,15). A semelhança de herem com harém (palavra árabenão é coincidência. Harém é lugar fechado só para mulheres (de um soberano). Herem é lugar sagrado, espaço interditado aos humanos. 

Neste caso específico (aparentemente único, compare com 1Sm 15) além do herem que deveria ser destruído, uma parte precisava ser levada para o santuário, tais como a prata o ouro e outros objetos valiosos. Acã tocou no herem - coisa isolada para propósitos específicos conforme determinação de Yahweh - daí sua culpa. Se tivesse salvado outra pessoa além de Raabe (livrada do herem) também teria sido declarado culpado (cf. Lv 27,29). A mensagem do texto é clara: No herem, seja ele reservado ao templo ou à destruição, não se toca (cf. Dt 13,17).

Apalavra herem como coisa separada para um propósito específico também aparece em Lv 27,21:
Mas o campo, quando sair livre no ano do jubileu, será santo (qodesh) ao Senhor, como campo consagrado (herem); a possessão dele será do sacerdote".
Em outros casos o termo “destruição” cabe bem como tradução para herem, como neste texto de Ml 4,6:
“e ele converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais; para que eu não venha, e fira a terra com maldição (herem)”.
A narrativa presente nos capítulos 6 e 7 do livro de Josué  tem claro caráter etiológico e visa explicar o porquê do vale ter recebido o nome de Acor (atormentado) e qual a origem de um amontoado de pedras. Em 1Cr 2,7 o nome de Acan é mudado para Acar, dada sua semelhança com Ocar, que significa perturbador. No jogo de palavras presente no texto figuram: Acan e Acar (duplo nome atribuído ao personagem, cf. Js e Cr), Ocar (=perturbador: predicado do personagem), Acor (=atormentado: nome do vale) e finalmente Yahweh. Diz ao final Josué: “Por que nos perturbaste (Akartanu)? hoje o Senhor te perturbará (yakarkha) a ti”.

Mais que isso, o texto busca inculcar na cabeça do povo que não se deve tocar nas coisas de Yahweh (que na verdade são dos sacerdotes).


Jones F. Mendonça

terça-feira, 5 de novembro de 2013

OS CRISTÃOS MELQUITAS DA SÍRIA

Os livros de história do cristianismo geralmente fazem referência a dois grandes cismas (separação, fenda) ocorridos no cristianismo: o Grande Cisma do Oriente (1054) e o Grande Cisma do Ocidente (1378-1417). O primeiro deu origem à igreja ortodoxa grega e o segundo teve caráter temporário, marcado pela existência simultânea de dois papas: um em Roma e outro em Avignon, na França (há quem fale em três!).

Mas o primeiro grande cisma ocorreu já nos primeiros séculos, em decorrência de divergências a respeito da formulação do dogma cristológico firmado em Calcedôdia (451) que declara a dupla natureza de Cristo (divina e humana).  Alguns grupos de cristãos, principalmente da Palestina, Síria e Egito, inclinados ao monofisismo (insistiam numa só natureza de Cristo após a encarnação), repudiaram a doutrina da “união hipostática” (unidade da pessoa de Cristo em duas naturezas) e formaram as chamadas igrejas “não-calcedonianas”: a igreja armênia, a igreja copta e a igreja sírio-jacobita. A controvérsia ganhou o nome de “cisma acaciano”, uma referência ao patriarca Acácio de Constantinopla, autor de um documento que visava solucionar a controvérsia monofisista. A ambigüidade do texto acabou expondo Acácio à excomunhão e contribuindo para acentuar as diferenças entre Roma e Constantinopla.

Por terem se mantido fiéis à doutrina adotada pelo imperador romano (apesar de situados geograficamente no Oriente), um grupo de cristãos sírios ganhou o apelido pejorativo de melquita (maliki, em árabe; melekh, no siríaco e no hebraico = rei).

É importante frisar que o cristianismo nunca experimentou plena unidade. Paulo em sua carta aos Coríntios já se mostrava incomodado com a existência de grupos com tendências diferentes:
...cada um de vós diz: eu sou de Paulo; ou, eu de Apolo; ou eu sou de Cefas; ou, eu de Cristo. Será que Cristo está dividido? (1Co 1,12-13) 
Este registro feito por Paulo revela a tendência dos fiéis em seguirem os fundadores das comunidades das quais faziam parte. Comunidades cristãs estabelecidas no Oriente pelos demais discípulos desenvolveram patrimônio litúrgico e teológico próprios ao longo dos primeiros séculos, constituindo um enorme obstáculo para a unidade da Igreja.

Parte dos melquitas, separados de Roma em 1054 juntamente com os ortodoxos, reconciliou-se com o papado no ano de 1684. São chamados de uniatas: praticam o rito oriental, liderados por um patriarca, mas são filiados à igreja católica. Como minoria na Síria, os melquitas tendem a apoiar o governo de Bashar  al Assad, uma vez que o ditador garante a liberdade religiosa no país.



Jones F. Mendonça

sábado, 2 de novembro de 2013

TEXTOS UGARÍTICOS DE RAS RHAMRA [DOWNLOAD GRATUITO]

A partir de 1929, no norte da Síria (Ras Shamra), foram sendo descobertos antigos textos em ugarítico (um dialeto cananeu) que revelam a vida cultural e política da região no segundo milênio a.C. Os textos, escritos em placas de barro, contém mitos e poemas épicos, fábulas, documentos comerciais e legais, textos de presságios e de rituais. 

Particularmente interessante é um poema épico de Baal em cujas linhas aparece uma série de figuras importantes da mitologia Cananeia também presentes na Bíblia hebraica. O deus El, por exemplo, surge como chefe da assembleia divina, assim como elohim (Deus de Israel), no Salmo 82,1: “Elohim está na assembleia de El; julga no meio dos elohim”. Outras divindades que aparecem no poema e estão presentes na Bíblia hebraica são Yam (Jó 38,8), Mot (Jó 28,22), Lotan e Tanin (cf. Sl 74,13; Jó 3,8; 40,25), Shahru (em hebraico Shahar, cf. Is 14,12), Shalmu (hebraico Shalem, cf. Gn 14,18; Sl 76,2) e Rashpu (o Nergal acadiano, em hebraico reshef, cf. Dt 32,24; Hab, 3,5; Sl 76,3; Jó 5,7; Ct 8,6).

Você pode fazer o download do livro: “Religious Texts from Ugarit”, de Nicolas Wyatt, contendo uma série de textos descobertos em Ugarit aqui.

O crédito notícia do download gratuito vai para Jim West (Zwinglios Redivivus), via Airton José (Observatório Bíblico).


Jones F. Mendonça

sábado, 26 de outubro de 2013

YHWH, YEHOWAH, JEOVÁ, YEHWIH, YAHWEH E JAVÉ: PICUINHAS SOBRE O NOME DIVINO II

Na Bíblia hebraica as consoantes YHWH aparecem ora com as vogais de adonai (Yehowah ou Yehwah - mais comuns), ora com as vogais de Elohim (Yehowih - menos comum, cf. Gn 15,2, Jz 16,28). Note que no caso de Yehowah há uma troca do "a" pelo "e" explicável por uma regra do hebraico que não vem ao caso agora. O uso das vogais de adonai e elohim visavam impedir que o leitor pronunciasse o nome divino. 

A escolha de Jeová como pronúncia do nome divino, presente em antigas versões da Bíblia e na Tradução do Novo Mundo (Testemunhas de Jeová), baseia-se na transliteração “Yehowah” sem levar em conta a mudança proposital das vogais pelos massoretas (estudiosos judeus que inseriram os sinais vocálicos a partir do V século d.C.). A troca do “Y” pelo “J” possui uma explicação simples. O “yod”, primeira consoante do nome divino tem um som que se aproxima tanto do “J” como do “Y”. No alemão, idioma que não contempla o “J”, a consoante escolhida como equivalente ao “yod” foi o “Y”. Nos idiomas latinos a consoante que mais se aproxima do som do “yod” é o “J”. Daí Jeová (e não Yehowah). Daí Joshua (e não Yeshua).

Há quem pense (como os exegetas da Bíblia de Jerusalém) que a pronúncia correta do nome divino seja Yahweh (outras Bíblias católicas preferem simplesmente Javé, mais adequado ao nosso idioma). Trabalhos acadêmicos sobre a Bíblia hebraica e a religião dos antigos israelitas geralmente adotam essas duas formas. Alguns nomes bíblicos - chamados teofóricos - como (Jeremias - Yermeyah) apresentam um “yah” no final, referência ao deus adorado pelos israelitas. O mesmo ocorre com aleluia (haleluyah = louvemos a yah). Tais indícios, somados a outros parecem sugerir ser esta a pronúncia correta, mas a verdade é que não há certeza. 

Muitos judeus e cristãos messiânicos escandalizam-se quando alguém tenta pronunciar o nome divino (alguns ficam bastante irritados). Como sinal de reverência, sempre que o tetragrama aparece, lêem “adonai” (Senhor). Ouça o capítulo 7 do livro do Gênesis em hebraico e perceba que logo no início do áudio surge a palavra “adonai” (em substituição a “Yehwah”, tal como aparece no texto). O que você vai ouvir é mais ou menos o seguinte: “vaiômer adonai lenôar bô atá verrol beterrá el ratevá (“Disse YHWH a Noé: vai tu e toda a tua casa para a arca”).

Fora da Bíblia hebraica o tetragrama YHWH aparece em algumas inscrições encontradas na Península do Sinai (Kuntillet Adjrud - séc. IX), na estela do rei Mesha de Moabe (conhecida como estela moabita, também do século IX) e no túmulo Hirbet el Qom (século VIII). Muito se discute atualmente a respeito de sua origem e adoção pelos hebreus.



Jones F. Mendonça

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

YHWH, ADONAI, ZEUS, DEUS E D’US: PICUINHAS SOBRE O NOME DIVINO

Alguém em sala de aula (acho que foi o Roberto) perguntou-me a respeito do motivo que levou os judeus e messiânicos a escreverem o nome de Deus substituindo o “e” por um apóstrofo: “D’us”. Minha resposta ao aluno curioso: “não tenho a mínima ideia”. Fui investigar.

A explicação mais comum, exposta em sites judaicos e messiânicos, é que a mudança tem como objetivo evitar a pronúncia do nome divino, tal como ordena o segundo mandamento. Será?

No hebraico o nome divino sem sinais vocálicos é YHWH (tetragrama sagrado). Com sinais vocálicos (inseridos a partir do século V d.C.) a palavra pode ser transliterada da seguinte forma: YeHWaH. Para não pronunciar o nome sagrado durante a leitura os judeus substituíam YeHWaH por Adonai (Senhor). Em suma: onde estava escrito YeHWaH, passaram a ler “Adonai”. Assim é feito até hoje.

Agora pense comigo: se a palavra latina “Deus” já consiste numa substituição do tetragrama sagrado (nas nossas Bíblias escolheram “Senhor”), por que cargas d’água seria preciso fazer nova modificação? Trocar “Deus” por “D’us” seria como trocar “Adonai” por “Ad’nai”. Abandonei os sites e fui para os livros em busca de uma resposta que fizesse mais sentido.

Rubén Luis Najmanovich, em seu livro “Maimônides” (Zahar, 2006, p. 17) explica que a grafia “D’us” foi criada pelo sábio judeu que dá nome ao seu livro (também conhecido como Rambam, séc XII d.C.). Ele teria evitado “Deus” porque a palavra é derivada de “Zeus”, divindade adorada pelos gregos na antiguidade. A solução encontrada: “D’us”. Faz mais sentido. Mas será verdade?

Bem, se Maimônides tivesse escrito em latim a explicação seria perfeita. Isso porque tanto em latim como em português a grafia é a mesma: “Deus”. Mas há um problema com essa explicação. Até onde sei Maimônides escreveu em árabe (como seu famoso “Guia dos perplexos”). Só mais tarde suas obras foram traduzidas para o hebraico, grego e o latim.

Fiz uma busca no Google na esperança de encontrar algum site mantido pelo autor do livro ou qualquer outro canal de comunicação que me permitisse perguntar a respeito da fonte que deu origem a essa explicação. Não obtive sucesso. Consultei outros livros sobre Maimônides (até em outros idiomas). Nada!

Ao que parece o uso da forma “D’us” não faz lá muito sentido mesmo. 


Jones F. Mendonça


segunda-feira, 14 de outubro de 2013

APARIÇÃO DO JESUS RESSURRETO EM LUCAS: ENTRE PÃES E PEIXES

Mulheres no túmulo, de
Benozzo Gazzoli (1440-41)
Tenho me debruçado sobre os relatos da aparição do Jesus ressurreto nos Evangelhos, outros livros do Novo Testamento (Atos e 1 Coríntios) e no Evangelho de Pedro. Quem faz uma leitura vertical dos Evangelhos percebe harmonia entre os relatos. Quem faz uma leitura horizontal percebe desarmonia. Não tenho a pretensão de fazer um trabalho exegético, mas irei postando aos poucos minhas impressões a respeito do tema.

Quero começar com o Evangelho de Lucas. Nele Jesus aparece primeiro a dois homens que caminham em direção a Emaús e não às mulheres, como nos evangelhos de Mateus (mulheres; 28,8-9), João (Maria Madalena; 20,14) e Marcos (Maria Madalena; 16,9).

Outra diferença é que as aparições ocorrem em Jerusalém e seus arredores e não na Galileia, como Mateus (28,16-17), Marcos (16,7) e João, que parece unir as duas tradições (Jo 20 – Jerusalém; Jo 21 – Galileia). Segue um resumo do relato em ordem cronológica (primeiro bloco: túmulo vazio; segundo bloco: aparição): 
O túmulo vazio: mulheres > Pedro
1. No primeiro dia da sema na algumas mulheres vão ao sepulcro e não encontram o corpo de Jesus (Lc 24,1-3). Dois “varões resplandecentes” dizem às mulheres que Jesus ressurgiu (Lc 24,6);

2. As mulheres retornam do sepulcro e dão a notícia do túmulo vazio “aos onze” [Judas não está mais entre eles] e a “todos os demais” (24,9). Todos pensam que as mulheres estão delirando e não lhes dão crédito (24,11). Pedro, no entanto, corre ao sepulcro e também encontra o túmulo vazio (24, 12);

Aparição: dois homens > Pedro> os Onze e os demais
3. Jesus aparece a dois dos homens que seguem para a aldeia de Emaús discutindo os últimos acontecimentos (24,13). Eles só se dão conta de que se trata de Jesus no momento em que se sentam juntos à mesa e repartem o pão (24,30). Jesus desaparece.

4. Os dois voltam a Jerusalém e encontram “os onze e os que estavam com eles“. Esse grupo diz aos dois que Pedro também havia visto Jesus (24,33-34). Uma nova aparição ocorre enquanto os dois anunciam que haviam visto Jesus. O grupo pensa estar diante de “algum espírito” (24,36). Jesus come com eles e relembra suas antigas palavras a respeito de sua ressurreição. O entendimento de todos se abre. Jesus os abençoa e é elevado aos céus (24,43-45); 
Percebem o túmulo vazio: “algumas mulheres” e Pedro.
Ordem das aparições: “dois homens”, Pedro, “os onze” e “os que estavam com eles”.
Local das aparições: Caminho de Emaús e Jerusalém (não se fala em Galileia, como em Mt, Mc e Jo).

Esquema do contato com o Jesus ressurreto: aparição > dúvida > lembrança das antigas palavras de Jesus > refeição comunitária > abertura do entendimento > desaparecimento de Jesus.

Fato curioso: tanto os “dois homens” como “os onze” e os “demais” só reconhecem Jesus após comerem com ele: dois homens/pão (24,30-31); os “onze” e os “demais”/peixe (24,43-45).  Coincidência?


Jones F. Mendonça

domingo, 13 de outubro de 2013

DITADORES

Os EUA invadiram o Iraque e depuseram Sadam Hussein. Bagdá segue com a capital que mais sofre com atentados terroristas.

A OTAN (liderada pelos EUA) derrubou Kadafi. Atualmente a Líbia é uma terra caótica comandada por milícias, muitas delas ligadas à Al-Qaeda.

Tio Sam lutando contra os malvados ditadores. Sei...

Os EUA apoiam ditaduras no norte da África e no Golfo Pérsico. Uma delas até sedia corridas de fórmula 1 (o regime dos Al Khalifa do Bahrein). Como é bom ver a competição pela TV... Alonso, Massa, Haikkonen, as bandeiras tremulando, o som vibrante dos motores, tudo muito bonito. 

No fundo meus caros, os EUA só parecem se incomodar com ditadores que não entram no seu jogo, como Iraque a Líbia e agora com a Síria.

Há algum tempo andam implicando com o programa atômico (fins pacíficos?) do Irã dos Aiatolás. Não querem que tenha uma bomba atômica (como Israel tem, mas não declara publicamente), afinal, só os países ocidentais e Israel têm “moral elevada” o suficiente para tê-las. E pensar que o único artefato atômico usado contra um inimigo veio justamente de uma potência ocidental. Mas como ouvi de um analista americano, “as bombas lançadas em Hiroshima e Nagasaki pouparam muitas vidas ao pôr fim à guerra”. 

E viva a democracia americana!



Jones F. Mendonça  

"O REINO ESQUECIDO" DE ISRAEL FINKELSTEIN NA SBL [LIVRO]

Acabo de saber, via Observatório Bíblico, que o novo livro do arqueólogo israelense Israel Finkelstein, encontra-se disponível para download gratuito (para países de baixa renda per capita) no site da SBL (Society of Biblical Literature). 

Faça o download (livro em inglês) aqui


Jones F. Mendonça

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

CONFERÊNCIA DE COPENHAGUE: O AT SOB NOVA PERSPECTIVA

Sobre o livro
Com o objetivo de “avaliar algumas das principais mudanças no campo dos estudos bíblicos do Antigo Testamento” está programada para os dias 09 a 12 de outubro de 2013 uma conferência internacional em Copenhague, Dinamarca. Os principais conferencistas são Douglas Knight, Tomas L. Thompson, Philip Davies e Niels Peter Lemche (leia um pouco mais a respeito da escola de Copenhague neste post de abril de 2012).

Os títulos e resumos das palestras (em inglês) podem ser baixados em PDF no ObservatórioBíblico.

Fiquei particularmente curioso quanto ao trabalho do professor Philippe Wajdenbaum (Institut des Hautes Etudes de Belgique, Brussels), intitulado “From Plato to Moses: Genesis-Kings as a Platonic epic” (De Platão a Moisés: Gênesis-Reis como um épico platônico). Segue o resumo:
Desde que Niels Peter Lemche e Thomas L. Thompson postularam que a Bíblia Hebraica pode ser um Livro da era helenística, tem sido sustentada a hipótese de que ela se baseia em fontes clássicas gregas como Homero, Heródoto e Platão.
 
Em Leis, Platão imaginou um Estado de doze tribos regido por leis divinas, das quais cerca de cinqüenta possuem pontos de contato com leis do Pentateuco. Platão encorajou o fundador do seu estado ideal a usar mitos, contos e fábulas para ilustrar como a obediência à lei é recompensada pela divindade e como desobediência traz punição.
 
A narrativa de Gênesis a Reis ("História Principal") parece ter sido inspirada nesse projeto platônico. Os livros de Gênesis a Josué relacionam a fundação de tal estado, enquanto Juízes, Samuel e Reis parecem modelá-lo de acordo com a Atlântida de Platão, mito da um estado que poderia ter sido perfeito, não tivessem seus reis negligenciado as leis divinas e provocado sua destruição.
Hipótese pra lá de ousada. Das 28 palestras programadas para o evento esta talvez seja a mais polêmica.



Jones F. Mendonça

AS ORIGENS HISTÓRICAS DO MONOTEÍSMO [EBOOK]

Liberado para download pelo próprio autor - Juan Echánove -, o livro “Ecos del desierto – El origen histórico del monoteísmo” (Central Books, 2008, 413 p.) narra como Yahweh foi incorporando características de outros deuses ao longo da história (Elohim, Ormuz e o Logos grego).  A grande sacada do livro é sua linguagem simples e a apresentação dos temas numa ordem que facilita a compreensão de um leitor pouco familiarizado com o assunto. Segue uma sinopse do livro:
Ecos do deserto narra a surpreendente história de como uma divindade da tormenta, adorada por nômades em um remoto rincão do deserto, terminou se convertendo em um Deus universal de três das três grandes religiões monoteístas. Baseando-se em recentes e assombrosas descobertas arqueológicas e utilizando penetrantes argumentos históricos, Echánove nos oferece uma perspectiva completamente nova desta fabulosa história. 
O livro está disponível apenas em espanhol.

O livro no Google livros, aqui

Jones F. Mendonça

sábado, 5 de outubro de 2013

O MONOTEÍSMO ISRAELITA NO ASOR BLOG

O artigo, assinado por Richard S. Hess, é iniciado com a seguinte provocação:
A arqueologia das religiões israelitas continua a evocar novas evidências e abordagens. Reavaliações recentes tem levantado a questão do monoteísmo pré-exílico de Israel. Dito de outra forma, alguém acredita em uma única divindade antes da queda de Jerusalém em 587/6 AEC?

O texto completo, no Asor Blog, aqui.


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O ORGANON & O CAPITAL: APONTAMENTOS SOBRE UMA CRÍTICA INFUNDADA

Toda a teologia se constrói sobre dois princípios fundamentais: o princípio arquitetônico (um tema da Escritura, como por exemplo, a encarnação) e o princípio hermenêutico (uma chave de interpretação, uma filosofia). Durante a patrística a chave hermenêutica predileta foi o platonismo. Assim foi com Orígenes, Clemente, Gregório de Nissa, Agostinho e tantos outros. Na Escolástica Aquino usou e abusou de Aristóteles. O tomismo cristianizou o filósofo. "Corrigiu-o" à luz da fé cristã. 

No século XX a teologia da libertação (TL) utilizou como princípio hermenêutico o marxismo (e a libertação como princípio arquitetônico). O que Aquino fez com Aristóteles, a TL também fez com Marx, tomando dele apenas os elementos compatíveis o cristianismo. Do ponto de vista lógico-teórico a diferença entre o tomismo e a TL é que o tomismo é uma teologia dedutiva (parte do dogma) e a TL é uma teologia indutiva (parte da situação, de um problema concreto). Ambas lêem as Escrituras e o mundo com a ajuda de uma “filosofia pagã”. 

O que me inquieta: Aristóteles acreditava num mundo eterno (Deus era um mero motor imóvel), mas sua filosofia foi usada sem maiores traumas (tornou-se, inclusive, “philosophia perennis”). Marx era ateu, mas o uso de sua filosofia como chave hermenêutica tem sido repudiado por setores conservadores. Faz sentido?

Como se as crenças do filósofo (ou até mesmo sua fundamentação teórica) fizessem alguma diferença...



Jones F. Mendonça

terça-feira, 24 de setembro de 2013

SBL LIBERA NOVO TEXTO CRÍTICO DO NT PARA DOWNLOAD

Seguem informações publicadas no site da SBL: 
A SBL grego do Novo Testamento (SBLGNT) é uma nova edição do Novo Testamento grego, criado com a ajuda de edições anteriores. Em particular, quatro edições do Novo Testamento grego foram utilizadas como recurso primário no processo de criação do SBLGNT.

O SBLGNT é editado por Michael W. Holmes, que utilizou uma grande variedade de edições impressas, todos os grandes aparatos críticos, e os mais recentes recursos técnicos e descobertas de manuscritos. O resultado é um texto criticamente editado que difere do texto crítico de Nestle-Aland/United em mais de 540 pontos.
Faça o download aqui:



Jones F. Mendonça

REDESCOBRINDO EVA: O PAPEL DAS MULHERES NO ANTIGO ISRAEL

Segue uma sinopse do livro: "Rediscovering Eve: ancient israelite women in context", de Carol Meyers, professora de religião na Universidade de Duke (informações tomadas do site da Amazon via Paleojudaica): 
Especialista em estudos bíblicos e arqueologia, Carol Mayers sustenta que as fontes bíblicas por si só não dão uma imagem verdadeira das antigas mulheres israelitas, uma vez que foram os homens da elite urbana que escreveram a grande maioria dos textos bíblicos.  Com base em descobertas arqueológicas e informações etnográficas, bem como nos textos bíblicos, Meyers retrata as israelitas não como escravas submissas em um patriarcado opressivo, mas como mulheres fortes e atuantes dentro de suas famílias e comunidades. O trabalho de Meyers desafia a própria noção de patriarcado como uma designação apropriada para a sociedade israelita.
O livro foi escrito no final da década de 70 e ganhou uma nova edição em dezembro de 2012. O tema é pra lá de empolgante. A obra, infelizmente, só está disponível em inglês.


Jones F. Mendonça



segunda-feira, 23 de setembro de 2013

SBL LIBERA NOVA FONTE

A SBL (Society of Biblical Literature) acaba de liberar uma nova fonte (Font Type, v1.0 build 001, lançada 9/6/13) para download gratuito. A nova fonte inclui caracteres latino, hebraico e grego. 

Destaque para a variedade de sinais diacríticos e de transliteração. 

Baixe aqui.

Mais informações aqui.


Jones F. Mendonça

domingo, 22 de setembro de 2013

O INQUISIDOR, O ANCIÃO E O DIABO

Século XVI. O inquisidor chega a uma vila onde supostamente se tem praticado o culto ao diabo. O ancião, inquirido pelo sacerdote, diz nunca ter ouvido falar de um deus chamado diabo. Após três dias de intensa investigação, acompanhada de violenta e cruel tortura, a comitiva vai embora. O ancião comenta com um membro da vila: “devemos nos aliar a esse tal diabo. Se é inimigo dos inquisidores, então é nosso amigo”.

Minha constatação: muitos jovens aderem a religiões com alegado caráter satânico simplesmente porque percebem o cristianismo como religião de inquisidores. Antes tortura física, agora tortura emocional. Raciocinam como o ancião da vila.



Jones F. Mendonça