sábado, 27 de abril de 2024

JÓ E ECLESIASTES EM ANCIENT NEAR EASTERN TEXTS (ANET)


1. Ebora os livros bíblicos de Jó e Eclesiastes possuam cada qual suas próprias singularidades, textos refletindo sobre o sofrimento do justo (Jó) e da aparente falta de sentido da vida (Eclesiastes) são bem atestados entre os diversos povos do Antigo Oriente Próximo desde o II milênio antes da era comum. Quem tiver interesse em conhecer tais escritos deve se debruçar sobre uma coletânea de textos conhecida como ANET (Ancient Near Eastern Texts), que em português pode ser traduzida como “Textos do Antigo Oriente Próximo”. A obra reúne material oriundo da Mesopotâmia e do Egito. Seguem os escritos que de algum modo possuem afinidade com Jó e Eclesiastes e suas respectivas datações/páginas em ANET:

1. “Homem de Deus” ou “Jó sumeriano” (~2000 a.C.); ANET, pp. 589-591.
2. “Eu enaltecerei o Senhor da Sabedoria” (~1200 a.C.); ANET pp. 596-601;
3. “O diálogo de um sofredor com seu amigo” ou “Teodiceia babilônica” ou “Qohelet babilônico” (1000-800 a.C.); ANET pp. 601-604.
4. Textos egípcios classificados como “controvérsia sapiencial” (ANET, pp. 475-479), “O lamento do agricultor” (ANET, pp. 407-410), “O diálogo da pessoa cansada da vida com sua alma” (ANET, pp. 405-407) e “As palavras de exortação de Ipu-Ver (ANET, pp. 441-444).


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 18 de abril de 2024

SOBRE EPILÉTICOS E ALUADOS


1. Nesta semana, na aula de "poesia e Sabedoria na Bíblia Hebraica", percorremos por toda a Bíblia na tentativa de reconstruir a história do desenvolvimento da figura de Satã (a aula é uma introdução ao livro de Jó). Chegamos a Mateus 17,15, passagem que descreve um exorcismo realizado por Jesus em um menino supostamente "epilético" (σεληνιαζομαι). Assim traduzem algumas versões, como a Almeida Revista e Atualizada. Na Idade Média a doença ficou conhecida como "morbus demoniacus" (doença do demônio).

2. Mas o termo grego "seleniazomai" indica mesmo um "epilético"? Algumas versões optaram por "lunático" e já posso adiantar que estão mais próximas do sentido original de "seleniazomai". É que no mundo antigo as instabilidades emocionais eram associadas à lua (selene), por isso o jovem mencionado no texto é classificado como "seleniazomai" = "pessoa afetada pela luminosidade da lua" (você se lembra do "Da Lua", de Mulheres de Areia?). É óbvio que a lua nada tem a ver com a loucura, mas era assim que os antigos entendiam.

3. A passagem descreve um menino que parecia ter pouco controle sobre seus movimentos e suas faculdades mentais. O texto sequer supõe que o menino tinha alguma doença, mas atribui seus descontrole à influência de um daimonion (δαιμονιον), termo que podia ter muitos sentidos no mundo greco-romano, como demonstra o historiador francês Denis Fustel de Coulanges, em sua "Cidade Antiga" (1864). Não faz qualquer sentido o uso de "epilético" em Mt 4,24 e 17,15. É preciso bani-lo, definitivamente, assim como "leproso".



Jones F. Mendonça