quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A CRIPTOMNÉSIA DE NIETZSCHE

Also Sprach Zaratustra, de Strauss
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A criptomnésia ou “memória escondida” pode nos pregar peças. Eis que você está escrevendo um artigo, uma crônica ou até mesmo um texto no seu Blog quando, de repente, surge uma nova ideia ou imagem. Você pensa que tais pensamentos foram produzidos por sua imaginação, mas não foram. 

Um famoso caso de criptomnésia foi percebido por Carl Jung enquanto lia “Assim falava Zaratustra”, de Friedrich Nietzsche. Jung achou um trecho da obra de Nietzsche muito parecido com um diário de bordo de 1686 cujo resumo foi publicado em 1835 (meio século antes do livro do filósofo alemão). Intrigado, Jung escreveu uma carta a irmã de Nietzsche, que confirmou que o livro fora lido por ela e por Nietzsche, quando este tinha 11 anos. 

Na opinião de Jung a história ficou gravada na memória de Nietzsche por décadas até que se deslocou do inconsciente para o consciente. Apesar de não ser impossível que Nietzsche tenha copiado o trecho do livro e inserido em sua obra, para Jung é mais provável que seu inconsciente tenha lhe pregado uma peça. 

Compare a passagem a respeito do diário de bordo e o trecho correspondente redigido por Nietzsche (o negrito é por minha conta): 
Diário de bordo:
Os quatro capitães e um comerciante, Mr. Bell, desembarcaram na ilha do Monte Stromboli para caçar coelhos. Às três horas reuniram o equipamento para regressar a bordo quando, para seu indizível espanto, viram dois homens voando velozmente no ar em sua direção. Um estava vestido de preto, outro de cinza. Passaram perto deles em grande velocidade, e para ainda maior susto seu desceram na cratera do terrível vulcão. Reconheceram-nos como dois conhecidos de Londres.

Assim falava Zaratustra: 

Nesta época em que Zaratustra residia nas Ilhas Happy, aconteceu de um navio ancorar na ilha onde fica o vulcão fumegante e a tripulação descer à terra para caçar coelhos. Ao meio-dia, no entanto, quando o capitão e seus homens se haviam reunido novamente, viram, de repente, um homem que vinha pelo ar em sua direção e uma voz que dizia nitidamente: 'É tempo, é mais que tempo!' 
Mas quando a figura aproximou-se deles, passando rápido como uma sombra em direção ao vulcão, reconheceram com grande espanto que era Zaratustra. .. 'Vejam!' , disse o velho timoneiro, 'vejam Zaratustra que vai para o inferno!'. 

A criptomnésia de Nietzsche é discutida na obra de Jung "On the Psycology of So-called Occult Phenomena", no volume I das Obras Completas. A citação acima foi retirada da seguinte obra: JUNG, Carl. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002.



Jones F. Mendonça

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