terça-feira, 21 de junho de 2011

AS ORIGENS DO FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO

Na segunda década do século XX, sob as os escombros do Império Otomano, nasceu a república Turca. Uma figura que destaca nesse cenário é Mustafá Kemal Ataturk, considerado o pai da Turquia moderna. Ataturk deu início à guerra de independência, que culminou em 1923 com a proclamação da república. Na busca por um estado democrático secular ele aboliu o califado e a poligamia. Também substituiu o fez (banete usado pelos povos do oriente) pelo chapéu e o alfabeto árabe pelo latino. Países islâmicos como o Egito de Nasser e o Irã do Xá Reza Pahlevi também tentaram se adequar ao novo mundo instaurando um estado secular. O Egito nacionalizou a economia, tomou posse da imprensa e aboliu o parlamento. No Irã o Xá sonhou transformar o país numa potência militar e industrial do dia para a noite. As conseqüências foram catastróficas. Muitos árabes espalhados pelos países muçulmanos, perdidos nesse processo de fragmentação, viram nas suas escrituras sagradas a única solução para restabelecer a ordem: a instauração da Shari’a, a lei islâmica. Eis alguns nomes que destacaram na construção da ideologia religiosa anti-ocidental.

Hassan El Banna (1906-49) – Fundou a Irmandade muçulmana em 1928 durante o período colonial. Tinha como meta o restabelecimento da ordem desfeita pelo fim do califado otomano de Istambul. O grupo chamava para si a responsabilidade pela dimensão política do Islã. Os irmãos muçulmanos tinham um slogam bem conhecido na órbita islâmica: “O corão é nossa constituição” e “o islã é um sistema completo e total”. Defendia que a solução para os muçulmanos está na implantação de um Estado islâmico, que aplique a chari’a (lei baseada nas Escrituras Sagradas do Islã), como teria feito o califa do antigo império otomano. O movimento teve aceitação entre a pequena burguesia urbana de origem modesta imbuída de uma visão religiosa do mundo.  O grupo soube politizar essa religiosidade. A irmandade foi desmantelada em 1954 pelo recém-criado Estado de Nasser. A irmandade faz parte do reformismo dentro das escolas sunitas.

Sayyid Qutb (1906-1966) – Filósofo enforcado em 29 de agosto de 1966 no Egito de Nasser. Foi influenciado pelos irmãos muçulmanos, e tinha como pano de fundo o seguinte cenário: a Turquia não era mais o Império Otomano e os estados árabes não eram mais colônias européias. Pregava uma ruptura radical com a ordem estabelecida, defendendo a substituição do ideal nacionalista, nascido na luta contra o colonialismo, pelo Estado islâmico. Teve relativa aceitação entre os jovens, mas afastou a maior parte dos intelectuais religiosos e da classe média. Criou um estilo de escrita simples e despojado, distante da complexa retórica dos ulemás (doutores da lei islâmica) e foi autor de duas grandes obras: “À sombra do Corão”, seu comentário corânico, e “Marcos do Caminho”, um “manual prático” do movimento islâmico. Elaborou o conceito de jahiliyyah, a barbárie anterior ao islã. Ela precisava ser destruída assim como fez o Profeta, defendia Qutb, dando lugar ao Estado muçulmano. Influência sob o universo sunita.

Abul Ala Mawdudi (1903-79) – Suas teorias e conceitos serviram para adaptar a ideologia islâmica às novas condições políticas criadas com o advento dos estados independentes não-religiosos. No final dos anos 20 publicou seu primeiro livro em urdu, língua derivada do sânscrito consagrada como língua oficial do Paquistão: “A Jihad no Islã”. Mawdudi declarava que a política era parte integrante da fé islâmica e do Estado islâmico. Fundou um partido chamado “Jama’at-e islami”, que tinha muitos pontos comuns com o modelo lenilista. Não conseguiu atingir as camadas mais pobres, pouco conhecedoras da língua urdu.  Influência sob o universo sunita.

Huholla Khomeini (1902 - 1989) – Popularmente conhecido como Aiatolá Khomeini, fez oposição ao Xá do Irã, Mohammed Reza Pahlavi, com base em conceitos antimodernistas. A reforma agrária iniciada pelo Xá prejudicava o clero, grande proprietário de terras, previa o voto para as mulheres e o juramento solene sobre um livro sagrado que não fosse necessariamente o Corão. Khomeini fez forte oposição a essas medidas. Em seu exílio na cidade santa xiita de Nadjaf, no Iraque, escreveu um livro que reunia uma série de conferências que continham a essência das futuras decisões a serem tomadas pela República islâmica a partir de 79. A obra recebeu o título de “Por um governo islâmico”. Khomeini conseguiu mobilizar verdadeiras redes de adeptos e discípulos, obtendo um sucesso sem precedentes no universo árabe. Seu principal objetivo era destruir a monarquia para instituir um governo islâmico sob a liderança do sábio xiita

Referências bibliográficas:
KEPEL, Gilles. Jihad: expansão e declínio do islamismo. Rio de Janeiro: Bibliex, 2003, 572 páginas.
LIBERO. Chiara. Turquia. São Paulo: Manole, 1998.


Jones F. Mendonça

Um comentário:

  1. Olá, Jones!

    Sou leitor assíduo do teu ótimo blog e como postamos textos citando o Ataturk quase que simultaneamente, vim ver o que você escreve sobre fundamentalismo islâmico, e a ótima dica do livro do Gilles Kepel. É um tema que eu gosto de estudar, obrigado por compartilhá-lo conosco.

    Abraços!

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