Alguns rabinos estão a discutir a respeito da consoante que inaugura o
livro de Bereshit (Gênesis). Querem
saber por que o primeiro livro da Torá começa com a segunda letra do alfabeto
hebraico (beyt) e não com a primeira
(álef). É um belo final de tarde e um
raio de luz atravessa a janela da sinagoga. Os talmidim (discípulos) estão ansiosos pelas respostas que serão
apresentadas por seus mestres.
Um dos rabinos se levanta e diz: “A letra beyt é a segunda letra do alfabeto e também simboliza o número dois. O que
nos ensina que para criar o texto bíblico foram necessárias pelo menos duas pessoas: Deus e o seu parceiro, o ser humano”. Outro rabino se põe de pé e
apresenta uma explicação diferente: “O beyt
é a letra de bênção (berakhá) e o álef a da maldição (arirá)”. Um terceiro rabino se levanta e apresenta uma explicação
baseada no formato da letra beyt. O
ferreiro martela a bigorna. Saem faíscas mil. Texto, depósito de infinitos sentidos.
Com um método de leitura desses não há qualquer diferença entre ler o Corão,
os Vedas, o Avesta, uma receita de bolo ou uma lista telefônica. O que dirige a
leitura é o devaneio criativo do leitor. Texto, caleidoscópio de sentidos. Gaveta
de segredos da alma.
Talvez revele algo sobre o leitor. Já em relação ao redator...
Jones F. Mendonça
O livro de interpretação bíblica de Roy B. Zuck descarrega críticas na alegoria, denunciando que a Igreja usou e abusou dela. Estranhei a primeira vez que li: um conservador escrever isso?!... Até que cheguei ao capítulo da Reforma, e Roy B. Zuck revela-se em toda a sua pujança: com Lutero, acaba a alegoria - e passamos a interpretar histórico-gramaticalmente... Morri de rir...
ResponderExcluirA interpretação da Igreja, hoje, é igual a desses rabinos - com uma diferença: o devaneio tem uma chave apenas - Jesus: em cada letra, palavra, frase e texto do AT, enfiam-se o intruso - como é mesmo o nome disso? Alegoria...
Sem alegoria, não há como pôr nenhuma doutrina cristã no AT...
Não é por outra razão que os pregadores não sabem o que fazer com a leitura acadêmica da Bíblia - ali, sim, a alegoria foi guardada na gaveta da história...