Há poucos anos o professor de uma escola pública
em Santos aplicou um teste cujos enunciados foram inspirados no cotidiano de
uma favela: narcotráfico, violência, etc. Numa das questões (de matemática) o
professor pediu para que os alunos calculassem o lucro da venda da cocaína
levando em conta que nela foi adicionada certa quantidade de bicarbonato de
sódio. Não foi uma boa ideia. Um famoso colunista da Veja, indignado, culpou o
educador Paulo Freire pelo disparate (!). De quebra, como de costume, culpou Marx,
Lula, Dilma e toda a “gentalha da esquerda”. Para ele o ideário socialista está
na raiz da maioria das canalhices do mundo.
O raciocínio no nosso colunista é o seguinte:
Paulo Freire enfatizava que o contexto sócio-cultural do educando deve ser
valorizado (ensinamento que me parece bastante razoável). O tal professor, aplicando
de forma equivocada o método de Freire (se é que o conheceu), fez uma
contextualização infeliz. Ora, como Paulo Freire era socialista, pensou ele,
logo a culpa é de Marx. Por conseguinte, no sentido inverso, do PT, do Lula, da
Dilma e dos demais “petralhas”. Aristóteles, pai da lógica, deve estar se
contorcendo no túmulo.
Mas há também uma esquerda tão neurótica quanto alguns
jornalistas lunáticos da Veja. Neste caso as mazelas que assolam o mundo são
interpretadas como sendo a concretização dos diabólicos planos elaborados pelos
“demônios da Casa Branca”. Um terremoto atinge o Irã e dizem que foi provocado
por um sofisticado equipamento americano capaz de fazer tremer a terra. Faça-me
o favor...
Um exemplo recente da polarização entre a retórica
da esquerda e da direita são as ameaças atômicas vindas da Coreia do Norte.
Para as “carpideiras descabeladas” da direita o líder norte-coreano é a própria
encarnação do mal. Os EUA, bastião da moralidade e da justa conduta, devem
puni-lo até que se dobre diante do capitalismo, um santo remédio capaz de
transformar o egoísmo na “riqueza das nações”.
Mas da esquerda também são ouvidas declarações
estapafúrdias. Há quem exalte o governo de Pyongyang, visto como uma das
últimas resistências ao “maléfico imperialismo americano”. Mas as ameaças da
Coreia do Norte são tão alarmantes que nem mesmo a China e a Rússia, seus
antigos aliados, têm apoiado a arriscada manobra que visa forçar os EUA a se sentarem
à mesa de negociações. Sejamos honestos, a
Coreia do Norte está muito, mas muito longe do paraíso utópico vislumbrado por
alguns marxistas. E isso não se deve apenas às sanções impostas pelos EUA e
seus aliados.
Transformar o mundo numa arena na qual lutam representantes
do bem e do mal (como também fizeram com Jean Willys e Feliciano) é um ótimo
negócio para quem quer manipular as massas. O debate é “vencido” no grito, na
desmoralização do adversário, nos argumentos falaciosos, nas entonações de voz
exaltadas e mãos com o dedo em riste.
São indivíduos doentes seguidos por andrajosos moribundos.
Querem apenas doses diárias de morfina. E nada mais.
Jones F. Mendonça
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