1. O saudosismo está na moda. Mania de achar que carro bom era o Fusca, tênis bacana era o Kichute, futebol de verdade era aquele jogado no terreno baldio em declive, brinquedos educativos eram aqueles feitos com lata velha e embalagens de Yakult. Talvez seja necessário convocar os psicólogos ou antropólogos para explicar as razões que motivam parcela da população a idealizar o passado dessa maneira. Ao que parece, no fundo sentimos saudades da alegria de ganhar um tênis novo, de poder jogar futebol no fim da tarde com os amigos, do carro que cabia no bolso de nossos pais, que nos levava e trazia da casa de nossos avós enquanto a chuva noturna fazia caminhos reluzentes no para-brisa.
2. O que chamamos de “memória”, já dizia Jöel Candau, “é muito mais um enquadramento do que um conteúdo”. Seria muita ingenuidade imaginar que nossas experiências são memorizadas, conservadas e recuperadas em sua integridade. A memória não é algo que pode ser acessado do mesmo modo como recuperamos uma foto ou um arquivo perdido em um computador. Apegamo-nos ao passado porque tememos a perda de nossas referências e a diluição de identidades. Sem lembranças, acerta de novo Candau, “o sujeito é aniquilado”. O medo da fragmentação nos faz inventar um passado idílico no qual possamos nos agarrar.
3. Bem, não precisamos ser tão duros com os saudosistas. Mas podemos ao menos pedir um pouquinho de noção da realidade.
Jones F. Mendonça
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