sexta-feira, 19 de setembro de 2014

O EGITO, OS POVOS DO MAR E AS ORIGENS DE ISRAEL

Estela de Merneptah
Quem quiser entender a formação de Israel precisa estar atento à primeira metade de um período egípcio conhecido como “Novo Império” (1550-1070 a.C.). Com a expulsão dos hicsos, Ahmose I (1550-1525) fundou a 18ª dinastia, dando início ao período mais célebre e glorioso de toda a vida egípcia. Segundo algumas estimativas a população saltou de 1,5 milhão para algo em torno de 2,5 a 5 milhões de habitantes. Destacam-se nesse período: 1) as cartas de Amarna, uma série de correspondências entre os reis cananeus e os faraós Amenhotep III e IV;  2) A estela de Merneptah (1208), registro feito em granito que revela a existência de um grupo de pessoas (uma tribo?) reconhecido pelo nome de “Israel” contra o qual o faraó Merneptah se gabava de ter destruído em Canaã: “Israel está arruinada; sua semente já não existe mais”.

Por volta de 1200 a glória do Egito foi sendo gradativamente ofuscada por uma série de fatores, tais como o desgaste da estrutura palaciana-faraônica, exaustão dos recursos naturais e dos repetidos ataques dos líbios e dos chamados “povos do mar”, dentre os quais os filisteus, representados em relevos com grandes penachos e corpos esguios. O templo mortuário de Ramsés III, em Medinet Habu, registra o terror causado pelo avanço dos povos do mar:
Os setentrionais em suas ilhas estavam em dificuldade e se moveram em massa, todos ao mesmo tempo. Ninguém resistiu perante eles; de Khati (império Hitita) a Qode (Cilícia), Karkemish (cidade do Eufrates, no norte da Síria), Arzawa (reino da Ásia Menor), Alashiya (Chipre) foram devastadas. Dirigiram-se enfim para o Egito [...] os ânimos deles eram de confiança, cheios de projetos.

O Egito conseguiu repelir os povos do mar, mas não foi capaz de impedir que se instalassem na costa oriental do Mediterrâneo, região outrora administrada por funcionários sediados em Gaza, Kumidi e Sumura. É nesse cenário que devem ser buscadas as origens do povo que consolidou suas tradições numa obra complexa que é a Tanak (Bíblia hebraica). 


Jones F. Mendonça

11 comentários:

  1. Outros achados também devem ser considerados, como a base de uma estatua de Ramses VI, encontrada em Megido (1140AEC) e os vários cartuchos de faraós, de Set I até Ramsés VI, encontrados no templo da deusa Hathor no vale de Timna, que demonstram a influencia egípcia até época bem tardia. Na Biblia Hebraica é notável a falta de menção à esse domínio egípcio, bem como ao avanço do Primeiro Reino Assirio de Tiglate Pileser I, que invadiu as cidades fenícias por volta de 1100 AEC. A menção mais antiga a uma potência estrangeira é a do Reino Arameu de Damasco, que só se formou após as invasões arameias de 1047AEC, que encerraram o primeiro domínio assirio na região.

    ResponderExcluir
  2. Quando ao primeiro domínio assírio no norte penso que até seja compreensível, mas o silêncio em relação à dominação egípcia causa surpresa. A narrativa da conquista pela formas das armas sob a liderança de Josué foi construída no exílio.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Talvez existissem memórias vagas de períodos em que a Palestina fosse ocupada pelos egípcios. Daí o conceito original de "escravos dos Egípcios" evoluiu para "escravos no Egito", com todos os retoques e acréscimos teológicos, ideológicos e políticos necessários.

      Excluir
    2. Este comentário foi removido pelo autor.

      Excluir
  3. Sim, concordo que muito foi construído no Exílio Babilônico. E essa é a origem do que podemos chamar de "Judaísmo". Mas há também, no entanto, uma base muito forte de tradições pre-exílicas, inclusive às que se referem ao culto de Y-H-W-H, que podem ser comprovadas, por outros achados como o da Pedra do Rei Moabita Mesha ou as inscrições de Kuntilet Ajrud. Mas é provável que o culto Pré-Exílico fosse algo bem diferente dos padrões judaicos atuais.

    ResponderExcluir
  4. Resumindo: tradições antigas (pré-exílicas) foram sendo "enriquecidas " (como gostam os exegetas católicos) até que ganhassem uma forma final no período pós-exílico. O antigo Israel talvez tenha sido formado a partir de um nomadismo interno associado com migrações diversas.

    ResponderExcluir
  5. A impressão que tenho é está se formando um novo consenso no meio acadêmico, em virtudo dos achados da arqueologia, em relação as origens de Israel. Mais cavernosa, porém, permanece a questão da cronologia, com sua polêmica sobre baixa e alta cronologia, questão a que tenho me dedicado recentemente sem muito sucesso.

    ResponderExcluir
  6. Por trás da polêmica sobre a baixa cronologia está o debate sobre a monarquia unificada de Davi à Salomão.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É pouco provável imaginar que um reino tão poderoso e rico como a Bíblia se refere a Salomão fosse ignorado por todos os vizinhos. É como se nenhum documento francês mencionasse a existência do Império Britânico.

      Excluir
    2. Este comentário foi removido pelo autor.

      Excluir