1. Em Gn 32,24 lemos a seguinte narrativa a respeito de Jacó: “E foi deixado Jacó sozinho, e empoeirou-se um homem com ele até a subida da alvorada”. Uma vez que o contexto sugere ter havido algum tipo de embate entre Jacó e este homem desconhecido, a decisão de traduzir o verbo “empoeirar” (אבק) por “lutar” me parece bem razoável (é como entendeu o texto grego da LXX).
2. É possível que o uso de “empoeirar” – um verbo que só aparece aqui – tenha como finalidade indicar a poeira que sobe do chão quando dois indivíduos lutam freneticamente agarrados um ao outro. No Rio de Janeiro, quando dois ou mais indivíduos brigam ferozmente, costumamos dizer que “o couro comeu” (talvez seja uma referência ao cinto de couro usado para disciplinar os filhos).
3. Traduzir expressões idiomáticas e até mesmo algumas formas verbais oriundas de um idioma antigo é uma tarefa difícil, porque em boa parte das vezes nem o falante tem condições de explicar com clareza sua origem. Sem a contribuição do falante original, as palavras ganham asas, tornam-se lisas como limo em calçada velha. No verso seguinte a dificuldade da tradução é outra. Veja:
“E vendo [o homem desconhecido] que não prevalecia sobre ele [Jacó], tocou A PALMA DO QUADRIL DELE [o que é isso?] e arrancou (ou “deslocou?) a palma do quadril enquanto Jacó SE EMPOEIRAVA com ele”.
4. Meus queridos, o que raios é essa “palma do quadril” (כף־ירך)? O primeiro termo é geralmente usado para indicar a palma das mãos e a sola do pé. O segundo para designar a região que vai da cintura à coxa (e inclui os testículos), daí “palma do quadril”. De modo geral os tradutores optam por “junta da coxa”. Mas será que é isso mesmo?
5. Outra questão: depois que foi “tocada” pelo homem desconhecido, a “palma do quadril” de Jacó foi “deslocada” – como prefere a maioria dos tradutores – ou foi “removida”? O verbo empregado aqui (יקע) possui campo semântico amplo.
6. Não é fácil a vida do tradutor.
Jones F. Mendonça
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