Jacob Steinhardt, 1962 |
O capítulo 15 de Lucas conta a famosa parábola do filho
pródigo. Talvez seja preciso lembrá-lo de que ela é contada para uma dupla plateia:
fariseus e pecadores (15,1). O foco da parábola não é a natureza esbanjadora e
irresponsável do filho mais novo (um típico pecador). Tampouco a virtude do mais velho: justo, trabalhador,
responsável e obediente (a imagem de um fariseu). Trata, todavia, do
ressentimento do mais velho, orgulhoso de suas virtudes, sempre à espera de uma
retribuição à altura de suas boas ações: “jamais transgredi teus mandamentos,
onde está minha recompensa?” (Lc 15,29). Embora já tivesse tudo (v.31), via-se
como um despossuído, como um injustiçado.
A reação do filho mais velho lembra o lamento de Jonas,
indignado com o perdão divino concedido aos ninivitas: “Por isso fugi apressadamente para Társis; pois eu sabia que
tu és um Deus de piedade e de ternura, lento para a ira, e rico em amor e que
se arrepende do mal” (Jn 4,2). Vivem
repetindo por aí que Jonas fugiu por medo dos “terríveis ninivitas”. Não era
por medo, era por orgulho, por indiferença, por falta de compaixão por aqueles
que ele via como inferiores, como “gentalha”. Jonas queria mesmo é que o fogo
descesse do céu e consumisse aqueles “pecadores dos infernos” (como Tiago e
João em Lc 9,54).
Tanto o livro de Jonas como a parábola do filho pródigo
sofreram uma adulteração perversa. Originalmente criticavam a arrogância dos
religiosos (judeus exclusivistas do período pós-exílico/fariseus). Mas ambos
tiveram suas mensagens convertidas em sermões moralistas. Jonas tornou-se o
pregador virtuoso que anuncia a mensagem divina apesar da dureza de seu
coração. O filho pródigo geralmente é evocado para destacar o sofrimento
experimentado por aqueles que ousam desafiar as regras morais impostas pela
religião.
Puseram tudo ao avesso.
Jones F. Mendonça
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