segunda-feira, 28 de junho de 2021

ISRAEL FINKELSTEIN E AS TRADIÇÕES DO NORTE

Neste vídeo, o arqueólogo israelense Israel Finkelstein fala sobre o Reino do Norte no contexto do século VIII a.C., época em que são situados reis como Jeroboão II e profetas como Amós e Oseias. O século VIII também é marcado pela invasão assíria, que conquista Samaria e cobra tributo a Acaz, rei de Judá. O arqueólogo vê nas narrativas heroicas presentes no livro de Juízes, na história de Jacó, nos traços positivos atribuídos ao rei Saul e nos ciclos de Elias e Eliseu elementos que os ligam ao Norte. Uma das perguntas que Finkelstein busca responder é a seguinte: como e quando as tradições do Norte foram incorporadas às tradições do Sul? Ah, uma informação importante: embora o áudio esteja em inglês, é possível adicionar legendas em português. Assista a todos os vídeos aqui.


Jones F. Mendonça



MÁRIO LIVERANI E O ÊXODO

1. Na opinião de Mário Liverni o Êxodo possui um fundo histórico que pode ser rastreado, por exemplo, em trechos mais antigos do livro do profeta Oseias que ele data para o século VIII: “Efraim [Israel do Norte] voltará para o Egito, na Assíria comerão alimento impuro” (Os 9,3). A Assíria aqui, segundo Liverani, aparece como um “Novo Egito”. No passado estiveram sob controle egípcio; agora serão subjugados pelos assírios. Guarde isso.

2. A memória preservada por Oseias, para Liverani, não diz respeito à narrativa do Êxodo tal como conhecemos: saída sob a liderança de Moisés com sinais e prodígios, etc. Embora diga que Javé tenha usado um profeta (נביא) para tirar Israel do Egito (Os 12,13), nenhuma menção ao nome de Moisés, aos sinais miraculosos, ao Mar Vermelho, ao Sinai aparecem no texto. O assiriólogo entende que Oseias apenas está fazendo menção à época em que Israel vivia sob controle egípcio na Canaã no período do Bronze recente (algo que está bem documentado).

3. O autor cita textos – como as Cartas de Amarna – que empregam expressões como “fazer sair”, “fazer voltar”, “fazer vir” (ele chama de “código motor”), como indicação de libertação da influência de uma potência estrangeira. A narrativa do Êxodo, tal como a conhecemos, seria o resultado de reelaborações (séculos VII ao V), com a finalidade de legitimar a pose da terra, na medida em que a “Saga dos Patriarcas” fornecia uma legitimação insuficiente, situada em um passado muito remoto, sem jamais mencionar a posse de toda a terra, mas apenas de alguns lugares símbolo, como túmulos e árvores sagradas.

4. Assim, a narrativa do Êxodo, somada à narrativa da conquista armada, sob a liderança de Josué, cumpriria o papel de legitimar de forma mais contundente a posse da terra. Você lê a exposição completa do assunto em “Para além da Bíblia”, de Mario Liverani (Loyola, 2008, p. 339-343).

 

Jones F. Mendonça

terça-feira, 22 de junho de 2021

MÁRIO LIVERANI E AS 12 TRIBOS DE ISRAEL

Mario Liverani reserva uma seção de seu “Para além da Bíblia” para falar sobre as doze tribos de Israel. Inicialmente o assiriólogo italiano destaca o caráter artificial do número doze, rejeitando, por exemplo, a tese da anfictionia de Martin Noth (seguida por von Rad), que supôs um modelo de organização tribal semelhante ao que existiu nas antigas sociedades gregas e itálicas.

Evidências desse caráter artificial poderiam ser facilmente percebidas a partir de uma análise atenta às diversas listas tribais – com quantidades e nomes diferentes – extraídas de alguns textos. Veja:

 ·  Jz 5 (Cântico de Débora) → 10 tribos (séc. IX): Efraim, Makir, Benjamim, Zebulon, Isaacar, Ruben, Gile’ad, Dan, Asher e Neftali;

 · Dt 33 (Bênçãos de Moisés A) → 10 tribos (séc. VIII): José, Benjamin, Zebulon, Isaacar, Ruben, Gad, Dan, Asher, Neftali e Judá;

 ·  Dt 33 (Bênçãos de Moisés B) → 12 tribos (séc. VII): Efraim, Manassés, Benjamin, Zebulon, Isaacar, Ruben, Gad, Dan, Asher, Neftali, Judá e Levi.

 ·  Ez 48,1-29 → 12 tribos (séc. VI): Efraim, Manassés, Benjamin, Zebulon, Isaacar, Ruben, Gad, Dan, Asher, Neftali, Judá, Simeão.

 ·  Ez 48,1-29 → 12 tribos (séc. VI): José, Benjamin, Zebulon, Isaacar, Ruben, Gad, Dan, Asher, Neftali, Judá, Levi e Simeão.

Ele sugere que os levitas eram originalmente um “grupo funcional”, elevado ao status de tribo pelos sacerdotes pós-exílicos (neste caso, teríamos treze e não doze tribos). Outra questão que ele levanta diz respeito à tribo de Simeão, situada nos limites fronteiriços de Judá: a tribo teria sido inserida artificialmente na região com a finalidade de afirmar que a perda de territórios mais ao sul não tinha refletido sobre Judá. O deslocamento de Dan da região mais central (na Shefelah) para o extremo norte (Jz 18) teria a finalidade de afirmar direitos sobre um território apenas transitoriamente incluído no reino de Israel.


Jones F. Mendonça