Neura era dessas escritoras compulsivas. Escrevia em areia, em
redes sociais, em caderno, em guardanapo, em parede, em vidro embaçado pelo
vapor. Seus dedos pareciam corcéis sem freio desbravando superfícies.
No repouso dos dedos ativava os olhos. Lia como uma louca:
jornal velho, rabisco em placa de trânsito, bilhete amassado, bula de remédio
sem uso, embalagem de shampoo, epitáfio em leito mortuário. Insaciável essa
Neura.
Certo dia, nas instalações de um alfarrabista qualquer,
na obsessão da leitura, tomou nas mãos três velhos exemplares da
revista Veja: “Geisel, um comando firme”, “Collor, caçador de marajás” e “O
poder de Aécio”. Estremeceu. Deixou de ler coisas inúteis. Curou-se.
Jones F. Mendonça
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