Enquanto Lutero, Calvino,
Zwínglio e outros reformadores discutiam (e até se matavam por) especulações a
respeito da natureza de Cristo, da Trindade, da predestinação, do livre
arbítrio, da Eucaristia e do batismo, Sebastian Castellio chamava a atenção para
a necessidade da tolerância religiosa. Uma voz praticamente única num mundo
religioso acostumado a punir com a morte o pecado da heresia.
Vendo como absurdo o apoio de
Calvino à condenação de Serveto, Castellio escreveu em março de 1554 o tratado
“De haereticis na sint persequendi?” (Os hereges devem ser perseguidos?). Não
via razão para condenação dos hereges à morte uma vez que considerava que a
Bíblia contém passagens difíceis, que constantemente deixam margens para
dúvidas (não é o que admite 2Pe 3,16?). Insistia em colocar o caráter e o amor
ao próximo acima das especulações doutrinárias.
Theodore Beza, escolhido por
Calvino para elaborar uma resposta, reagiu dizendo que a tolerância religiosa é
impossível para aqueles que aceitam a inspiração das Escrituras. Qualificou as
vozes que se opuseram à morte dos hereges como “emissários de Satanás”.
Castellio voltou à luta em “Contra libellum Calvini”. Mais tarde, em seu “De
arte dubitandi” ("A arte de duvidar”), antecipou-se a Descartes, colocando
a dúvida como elemento fundamental na busca da verdade.
Castellio combateu o fanatismo
religioso como nenhum outro de seu tempo. Sua postura lança por terra a tese
que justifica os discursos de ódio de Lutero dirigidos aos judeus e a
condenação de Serveto à fogueira pelo conselho de Genebra como sendo atitude
aceitável por todos naquele tempo. Com uma voz extraordinariamente dissonante,
Castellio morreu na miséria aos 48 anos (1563). Calvino, em seu conhecido
fanatismo, declarou que a morte prematura de seu opositor fora o resultado de
uma sentença divina.
No próximo dia 31 - data em que
os protestantes comemorarão 499 anos da Reforma - Castellio não pode ser
esquecido.
Jones Mendonça
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