Há
quem interprete a música Gitâ, de Raul Seixas, como sendo uma espécie de poema
dito pelo próprio Satã. Outros, no entanto, pensam que Raul está se colocando
como o próprio Deus. A composição seria uma espécie deboche dirigido aos
cristãos. Mania de perseguição...
Na
verdade a canção recebeu inspiração do Bhagavad-Gîtâ (bhagavan - Deus; gita - canção), belíssimo poema hindu
que faz parte da epopeia
Mahâbhârata. O poema ganhou sua forma atual entre os séculos V e I a.C. e tem
como pano de fundo uma batalha entre os membros do clã Kula. Esse dramático
cenário é apesentado num diálogo entre Krishna (divindade hindu) e Arjuna (guerreiro
perturbado por ter que lutar com seus parentes). O narrador é Sanjaya.
Tanto
no Bhagavad-Gîtâ como na letra da música de Raul Seixas aparece a ideia de que
todas as coisas existem ou surgem na divindade, mas o divino, não obstante, transcende
todas as coisas (metafísica panenteísta).
Seguem
alguns trechos do Bhagavad-Gîtâ (em azul) em paralelo com a música de Raul (em vermelho):
16.
Eu sou a oblação, o sacrifício,
a oferenda aos antepassados, a erva bendita, o hino sagrado, a manteiga
purificada, o fogo e também a vítima consumida em holocausto.
Eu sou o seu sacrifício
A placa de contra-mão
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição
A placa de contra-mão
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição
17.
Sou pai, mãe, sustentador, avô
deste Universo. Sou o objeto do conhecimento, o purificador, a sílaba OM e
também o Rik, o Sâma e o Yajur.
Mas eu sou o
amargo da língua
A mãe, o pai e o avô
O filho que
ainda não veio
O início, o
fim e o meio
19.
Eu dou o calor, retenho e envio a chuva, sou a imortalidade e a morte, sou o ser e o não-ser, Arjuna.
Eu sou a vela que acende
Eu sou a luz que se apaga
Eu sou a beira do abismo
Eu sou o tudo e o nada
Eu sou a luz que se apaga
Eu sou a beira do abismo
Eu sou o tudo e o nada
32.Sou princípio, meio e fim de
todas as coisas criadas, Arjuna; entre as ciências sou a ciência do espírito
supremo e sou o argumento Vâda entre os que discutem;
O início, o fim e o meio
Eu sou o
início
O fim e o meio
Eu sou o
início
O fim e o meio
33.Sou a vogal A entre as letras; o
composto copulativo entre as palavras compostas. Sou o tempo infinito, o mestre
ordenador, cujas faces estão em toda parte.
Das telhas eu sou o telhado
A pesca do pescador
A letra A tem meu nome
Dos sonhos eu sou o amor
A pesca do pescador
A letra A tem meu nome
Dos sonhos eu sou o amor
Raul Seixas: meu teólogo panteísta preferido!
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