segunda-feira, 15 de abril de 2019

GÊNESIS 2: NÃO É “ALMA VIVENTE”, É “GARGANTA VIVA”

O capítulo 2 do Gênesis descreve a criação do homem a partir de um punhado de terra. Ele ganha vida quando Javé Elohim (o Criador) sopra em suas narinas sua neshemah (seu “hálito”). Esse hálito passa por sua néfesh (garganta) e lhe dá vida. Uma tradução honesta nos permite visualizar a cena:
Então Javé Elohim modelou o homem com a argila do solo,insuflou em suas narinas um hálito (neshemah) de vida
e o homem se tornou uma garganta (néfesh) viva (Gn 2,7).
O corpo sem vida torna-se “garganta viva” (e não “alma vivente”). Isso significa que a partir da recepção do hálito divino ele respira, fala, grita, come, bebe, deseja. A ideia de que o corpo que é habitado por uma “alma” ou por um “espírito” é estranha à tradição judaica. O corpo é simplesmente animado pelo hálito (neshemah) ou sopro (ruah) divino. Caso o Criador recolha sua neshemah/ruah, o homem volta a ser pó.

Note que os dois termos aparecem como sinônimos em Jó 34,14-15:

Se levasse de novo a si a sua ruah (“sopro” e não “espírito”), 
se concentrasse em si a sua neshemah (“hálito”, sinônimo de “sopro”)
expiraria toda a carne no mesmo instante,
e o homem voltaria a ser pó.

Eclesiastes reforça essa ideia quando diz que o pó (referindo-se ao corpo) volta à terra e a “ruah” (o sopro divino) volta ao Criador por ocasião de sua morte (Ecl 12,7). Ainda não há qualquer indício de vida eterna. Eclesiastes diz claramente que os mortos não têm recompensa, nem memória (9,5), nem reflexão, nem sabedoria (9,10). A doutrina da vida eterna é desenvolvida aos poucos e só aparece claramente em Dn 12,2:
E muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida eterna, e outros para vergonha e desprezo eterno.
Repare que o texto não fala da “imortalidade da alma” (uma crença grega presente nos escritos de Platão, como no “Fédon”), mas da ressurreição DO CORPO. Aliás, o credo de Niceia (325 d.C.) reafirma a crença na ressurreição com muita clareza: “Esperamos a ressurreição dos mortos; e a vida do mundo vindouro”.



Jones F. Mendonça

3 comentários:

  1. Jones, quanto ao que especificamente você fala sobre os textos que tratou, concordo em gênero, número e grau. Para determinadas tradições do AT, não há nenhum fantasma dentro do corpo - o corpo só está respirando por força do sopro divino, que, quando da morte, é retirado (sem qualquer relação de identidade com o corpo) e volta para a divindade. Nessa tradição, morreu, acabou.

    No entanto, não estou seguro quanto à sua conclusão geral, de que essa tradição represente toda a tradição da época. Acho que não. Acho que havia outras tradições, a do difícil conceito de duplo, por exemplo, que não é exatamente o conceito platônico de alma, mas constitui a crença na permanência da "vida" individual da pessoa no sheol. Passagens como a consulta de Saul à necromante deixam isso claro. Quando a necromante vê o ser que sobe do sheol, ela diz que vê um elohim, e, então, Saul o identifica com Samuel.

    Penso que elohim é uma forma genérica para designar qualquer ser existindo fora do mundo humano (conquanto, por metáfora, também se aplique a lideranças, como juízes e nobres (Sl 58). Assim, em termos genéricos, qualquer ser que habite o mundo dos deuses é um elohim e qualquer ser que habite o mundo dos ortos, também.

    Ou seja, não haveria uma única tradição sobre sobrevivência ou não da vida após a morte. A que você menciona parece ser apenas uma delas.

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  2. De fato. Ao invés de "é estranha à tradição judaica", deveria ter dito, "precisa ser investigada com mais cuidado". Difícil saber, no entanto, se duas (ou mais) tradições caminharam juntas ou se foram sendo superadas por tradições novas.

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  3. PRAVOUVEVER GEVANORREMÁ VAGOZERREZIRRÓ JIERMAFORGUES IZISBALIDISNAY. ELEBARRASURIANDARABIA

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