quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

ELOCUBRAÇÕES SOBRE O DIVINO

De onde veio o mal, perguntaram-se os primeiros teólogos.  Então...

Os maniqueístas: duas divindades supremas presidem o universo. O mal tem caráter metafísico e ontológico.  Os seres do universo surgiram a partir da luta entre os dois princípios (Luz/alma/bem – Trevas/corpo/mal). Deus deixa de ser responsabilizado pelo mal. O homem também não é responsável pelo mal que faz (o mal é inerente à natureza corpórea).

Plotino: o mal está na matéria, extremo limite do Uno no processo de emanação. O mal é degradação da perfeição, apesar disso é necessário, pois expressa a multiplicidade das essências. O homem é, como Ulisses, um ser desejoso de voltar à pátria. O mal tem caráter ontológico-estético-natural.

Agostinho: O mal não é um ser, mas deficiência e privação de ser. O mal moral é produto da vontade má. O mal físico é conseqüência do pecado original, ou seja, é conseqüência do mal moral.

É, isso cansa. 


Jones F. Mendonça

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

CAUSA MORTIS

Tragédia em Santa Maria, RS. Mais de 200 mortos.

O legista: intoxicação respiratória por inalação de monóxido de carbono;
O fiscal: alvará vencido;
O moralista: promiscuidade dos jovens;
O engenheiro civil: obra mal projetada;
O especialista em segurança: funcionários mal orientados;
O perito da Polícia Civil: artefato pirotécnico inadequado para ambientes fechados.
A vítima do acidente que sobreviveu: músico irresponsável;
A oposição ao governo Dilma: culpa do PT;
A imprensa: qualquer coisa que dê IBOPE;
O religioso: A Divina Providência.

Simplificações para uma tragédia brasileira. 

Jones F. Mendonça

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

ENTENDA AS ELEIÇÕES EM ISRAEL

Leia no Opera Mundi.


SOBRE POLÍTICA, CARNIÇA E ABUTRES

Arte: Carlos Latuff
Repete-se hoje nos países islâmicos o que ocorreu no Irã em 79. A população com tendências laicas protesta ao lado dos radicais islâmicos contra um governo autoritário. De mãos dadas o grupo derruba a antiga tirania. O vácuo de poder é ocupado pelos radicais, que perseguem ferozmente seus opositores (laicos e membros do antigo governo).

Nos céus, com as asas bem estendidas e com um faro super apurado, planam os abutres da Europa e da América, na esperança de obterem alguma vantagem do novo quadro que se formou.

Há algo de novo debaixo do céu?


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

DEUS JOGA DADOS (?)

Stephen Hawking, contrariando Einstein, acha que "Deus"
joga dados. 

Na teologia reformada não existe sorte. A palavra pode até ser empregada por um calvinista, mas possui uma conotação diferente: sorte = evento que tem como origem um decreto divino motivado por um critério misterioso. Por trás de tudo move-se a Providência com seus fios invisíveis e infalíveis. Para a frágil e ingênua criatura humana os ventos que sopram a vela da história parecem “sorte” ou “acaso” ou são frutos da atividade humana. Mas no fundo, dirá um calvinista, o que chamamos “sorte” ou “acaso” não passa de um decreto divino.

Quando o assunto é salvação o processo é o mesmo. Deus “vota”, digamos assim, num indivíduo e ele é incluído gratuitamente entre os eleitos. Não importa se fez uma boa “campanha”, ou se é um “bom candidato”, ou se tem um grande poder de persuasão. O “eleito” também não ganha essa condição por acaso, como ocorre com um dado lançado numa mesa de jogo. Aliás, Deus até pode jogar dados, mas são dados “viciados”. Quando Ele quer que o resultado seja um seis, certamente será um seis. Ponto.

Os problemas começam quando o assunto é o pecado original, uma das doutrinas fundamentais na teologia cristã. Ora, se a desobediência do primeiro casal foi o resultado de um decreto divino, como ambos (e toda uma geração posterior) podem ser responsabilizados por tal ato? Deus jogou o “dado viciado” e o resultado foi: “comer o fruto proibido”. Haveria alternativa senão comê-lo? Deus, neste caso, não se faz autor do pecado?

Calvino dirá que não. Sei...


Jones F. Mendonça

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

ÁGUA DO MAR VERMELHO SERÁ BOMBEADA PARA O MAR MORTO, PREVÊ PROJETO

Imagem: Haarez

Fiz o resumo de uma notícia veiculada pelo Haaretz (versão só para assinantes, 16/01/13):

Alguns estudos indicam que se nenhuma medida for tomada o Mar Morto irá encolher cerca de 10% nos próximos 50 anos, o que traria graves danos ao turismo, às indústrias locais e ao meio ambiente. A solução encontrada pelos governos de Israel e da Jordânia: bombear água do Mar Vermelho. O projeto prevê a construção de uma estação de bombeamento no Golfo de Áqaba e uma estação de dessalinização com capacidade de meio bilhão de metros cúbicos por ano. O elevado custo da obra e críticas vindas de ambientalistas constituem sérias ameaças a esse ambicioso projeto.

Se você é assinante ou se cadastrou (como eu) para acessar 10 artigos do Haaretz por mês gratuitamente, leia o artigo completo aqui.




Jones F. Mendonça 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

NOTÍCIAS DO ORIENTE

Foi-se 2012 e Bashar Al Assad continua firme no poder em Damasco, apesar de opositores terem conquistado alguns territórios do país. Quem se interessa pela política do Oriente Médio deve dar uma olhada neste mapa abaixo publicado pelo New York Times. Também vale conferir este, este e este artigo, todos escritos pelo jornalista Gustavo Chacra em seu Blog. 

Um interessante Blog estrangeiro sobre o Oriente Médio é o do jornalista britânico Jonathan Cook.


Jones F. Mendonça

SALOMÃO GINSBURG, OS BATISTAS E A MAÇONARIA


Famoso por ter criado o Cantor Cristão, Salomão Ginsburg - missionário batista fundador de inúmeras igrejas em território brasileiro - está em Jacobina, no centro norte baiano. É final do século XIX e a reação católica aos protestantes é extremamente hostil. Enquanto prega, uma multidão armada com punhais cerca o dedicado missionário. Salomão ora pedindo livramento a Deus e um pensamento lhe vem de súbito: “Seria possível que naquele lugar houvesse um irmão maçom?”. Sem pensar duas vezes este ilustre maçom protestante faz o sinal da maçonaria e alguns homens o cercam, conduzindo-o a uma das melhores residências da cidade. Ufa!

Este é apenas um caso de ajuda maçônica relatado por Salomão Ginsburg em seu livro “Um judeu errante no Brasil”, publicado pela JUERP (dê uma olhada nas páginas 82, 83 e 110). Os maçons, liberais e progressistas, viram o protestantismo como um ótimo instrumento contra o poder da igreja católica, considerada conservadora e atrasada. Como fez com os templários, a igreja católica logo tratou de demonizar os maçons, artifício que também foi utilizado por evangélicos em relação aos dois primeiros. A influência maçônica entre os protestantes foi tão significativa que em 1903 ocorreu um cisma na igreja presbiteriana.

Na raiz de todas essas disputas está a luta pelo poder. A fé funciona como isca. O demônio, por mais estranho que possa parecer, alimenta a fé. É assim desde os primórdios...


Jones F. Mendonça

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

PAZ

Por Homayoun Mahmoudi - Irã - 02/01/2013

PARA COMPREENDER O CRISTIANISMO PRIMITIVO II [LIVROS]


V.V, A.A. Cristianismo primitivo y religiones mistéricas. Madrid. Ediciones Cátedra, 1995.

Diferentemente do que pode parecer, o livro não trata apenas da relação entre o cristianismo primitivo e as religiões mistéricas. Há muito mais. Como a obra é bastante extensa (possui 33 capítulos), farei uma breve apresentação dos 10 primeiros capítulos.

No primeiro capítulo J. M. Blázquez (autor da maior parte do livro) trata sobre as fontes para o conhecimento de Jesus: A Fonte Q, a autoria, data da redação e a origem dos Evangelhos, as cartas paulinas e os evangelhos apócrifos (fontes judaicas e romanas sobre Jesus são tratadas no capítulo IV). Em seguida, nos capítulos II, III e IV, o mesmo autor trata sobre o mundo em que nasceu o cristianismo, as seitas judaicas e a pessoa de Jesus (sua vida pública, idioma que falava, família, pregação, interpretações de sua mensagem, etc.). O capítulo V, ainda sob os cuidados de J. M. Blázquez trata sobre a estrutura social do cristianismo primitivo. Temas como a situação social da mulher, o ambiente urbano do cristianismo dos primeiros séculos e sua organização eclesiástica são abordados pelo autor.

O capítulo VI, escrito por Arminda Lozano Velilla, Catedrático de História Antiga da Universidade Complutense de Madri, tem como foco o panorama religioso da Ásia Menor na época helenístico-romana. Lozano apresenta algumas das principais características das escolas filosóficas helenísticas desse período: platonismo, epicurismo, estoicismo e cinismo. O culto ao imperador, a astrologia, a ideia monoteísta e a religião solar também recebem atenção especial. O autor prossegue tratando sobre as religiões pagãs e suas principais divindades (Cibele, Atis, Zeus, etc.).

J. M. Blázquez volta à cena nos capítulos VII e VIII. Seu interesse agora se volta para a reação pagã ao cristianismo primitivo (Epícteto, Crescente, Frontón, Luciano de Samosata, Marco Aurélio, Apuleio, Hélio Aistides, Galeno, Celso, Dion Cassio, Cipriano e Porfírio) e a resposta dos apologistas gregos e latinos a esses ataques. Tertuliano recebe uma atenção especial no capítulo VIII (o capítulo XI dedica algumas páginas aos demais apologistas).

Antonio Piñero, autor do IX capítulo, aborda o gnosticismo e sua relação com o cristianismo dos primeiros séculos. No capítulo X, marcando um novo retorno de J. M. Blázquez, são discutidas as influências da filosofia grega nos pensadores cristãos (se este último tema é do seu interesse, vale conferir este post) .

Bem, ficam para um próximo post os demais capítulos dessa valiosa obra.


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

M. C. ESCHER: O MAGO DA PERSPECTIVA [VÍDEO DUBLADO]


RENÉ MAGRITTE: A TENTATIVA DO IMPOSSÍVEL [VÍDEO DUBLADO]

Sensacional:

PARA COMPREENDER O CRISTIANISMO PRIMITIVO [LIVROS]


Dando continuidade à indicação de livros que considero valiosos para a compreensão do chamado “mundo bíblico” (Antigo e Novo Testamento) e do cristianismo primitivo, segue abaixo um breve comentário sobre o seguinte livro:

JAEGER, Werner. Cristianismo primitivo y paideia griega. México, DF, Fundo de Cultura Económica del México, 1985, 151 páginas.

A tese do autor: sem a expansão da cultura grega, promovida pelas conquistas de Alexandre Magno, o cristianismo não teria se tornado uma religião universal. As controvérsias dos séculos II e III entre homens de cultura formados na tradição clássica (tais como Tácito, Marco Aurélio, Galeno e Celso) e cristãos também são discutidas pelo autor. Para finalizar, Jeager discute a síntese do pensamento grego e cristão, bem expresso nas obras de Basílio de Cesareia, Gregorio Nasiaceno e Gregório de Nisa. A morte do autor impediu que seu trabalho fosse concluído, por isso o livreto tem sido considerado (apenas?) um esboço. Eis alguns pontos apresentados pelo autor na introdução da obra:
  • O cristianismo era um movimento judeu, mas tanto os judeus da diáspora quanto os da Palestina estavam helenizados;
  • Foram justamente os “helenistas” de Jerusalém que deram maior impulso à atividade missionária na Palestina;
  • O grego era falado em todas as synagogai das cidades mediterrâneas;
  • Paulo discursava aos judeus em grego com todas as sutilizas da lógica grega;
  • O Antigo testamento era citado segundo a tradução grega dos Setenta (Septuaginta);
  • A expressão “roda da criação” (cf. Tg 3,6) empregada por Tiago tem origem na religião órfica;
  • O livro de Atos apresenta Paulo citando poetas gregos em seu discurso no areópago;
Aqueles que quiserem se aprofundar no tema “Paideia grega” devem ler outra obra do mesmo autor: “Paideia: a formação do homem grego”, publicado pela editora Martins Fontes. 


Jones F. Mendonça

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

UMA PEDRA OU UM PATO?

Paisagem com patos (detalhe),
de Jakab Bogdány
Digo que o objeto é uma pedra. Ele diz que é um pato. Explico que aquela coisa não emite sons, não tem penas, nem bico, nem asas. Não parece um pato. Então o sujeito cita um especialista: - De acordo com o Dr. Eurich Wünder, o maior especialista em patos de todos os tempos, alguns patos podem se parecer com pedras, ainda que nenhum tenha sido encontrado até hoje.

Acha que com tal argumento foi capaz de provar que aquele objeto imóvel, duro e pesando meia tonelada é um pato. De gente assim o mundo está cheio.


Jones F. Mendonça

PARA COMPREENDER OS EVANGELHOS [LIVROS]


Como estou de férias no STBC tenho aproveitado meu tempo para reler e arrumar alguns livros que fui adquirindo ao longo dos anos.  Pensei que seria uma ótima oportunidade para indicar algumas obras que considero essenciais para a compreensão do Antigo Testamento, do Novo Testamento e do cristianismo primitivo. Hoje farei alguns comentários a respeito de duas obras:
JEREMIAS, Joachim. Jerusalém no tempo de Jesus: pesquisa de história econômico-social no período neotestamentário. São Paulo: Paulus, 1983, 518 páginas.


SAULNIER, Christian; ROLLAND, Bernard. A Palestina no tempo de Jesus. São Paulo: Edições Paulinas, 1983, 98 páginas.
O alemão Joachim Jeremias, autor do primeiro livro, escreveu outras duas famosas obras: “As parábolas de Jesus” e “Teologia do Novo Testamento”. Em “Jerusalém no tempo de Jesus”, o autor faz uma minuciosa investigação na tentativa de reconstruir a Jerusalém no primeiro terço do primeiro século. Dentre os vários temas abordados no livro estão: profissões, comércio, movimento de estrangeiros, classes sociais, direitos, etc. Um tema particularmente interessante da obra é o dedicado às classes sociais e ao papel que cada indivíduo desempenhava na sociedade da época: escravos, mulheres, publicanos, anciãos, fariseus, saduceus, sacerdotes, escribas, etc. As informações prestadas ao leitor vêm acompanhadas de fontes documentais antigas e comentários (algumas notas chegam a tomar metade da página). Regras de conduta em relação às mulheres ainda em uso hoje por judeus ortodoxos são mais bem compreendidas quando lemos o conselho dado por Yose ben Yhanan (cerca de 150 a.C.): “Não converse muito com uma mulher [isso vale] no caso da tua mulher e mais ainda em relação à mulher do próximo”(p. 474). 

O segundo livro consiste numa espécie de versão resumida da primeira obra (Joachim Jeremias é inclusive citado). Se por um lado o livro perde para o primeiro na quantidade de documentos apresentados no rodapé, ganha por conter gráficos, mapas, plantas, e assuntos chave que despertarão maior interesse dois leitores que estão em busca de informações mais essenciais. Na página 80 há um quadro contendo sete espécies de fariseus citadas no Talmude (os fariseus faziam chacota de si mesmo). O legalismo e a hipocrisia, comportamentos tão criticados pelo Jesus dos Evangelhos, mostra-se evidente em pelo menos cinco dos sete tipos de fariseus. São eles: “de costa larga” (escrevem suas boas ações nas costas), “vagarosos” (retardam o salário dos empregados em nome de um preceito urgente), “calculadores” (acumulam méritos a fim de pagar pecados cometidos), “econômicos” (buscam acumular méritos com pequenas boas ações), “escrupulosos” (buscam com afinco os pecados ocultos a fim de compensá-los com boas ações), e finalmente os “do amor”, que agem como Abraão.

Tenho as duas obras em papel, mas não é difícil encontrá-las digitalizadas em sites como o 4shared, esnips, calameo, etc. 

Jones F. Mendonça

domingo, 23 de dezembro de 2012

A RELIGIÃO E AS MULHERES

O Irã era uma monarquia autocrática até o final da década de 70. Os EUA e a Inglaterra apoiavam o atual líder do país, o xá Mohammad Reza Pahlevi. Em 79 veio a Revolução iraniana e o país se transformou numa República islâmica comandada pelo Aiatolá Khomeini. O Irã mergulhou nas trevas. As mulheres, como sempre, foram as maiores vítimas do governo autoritário comandado pelos ulemás. Em "Persépolis" Marjane Satrapi, ainda menina quando eclodiu a revolução,  conta sua história. Abaixo uma tirinha:


O problema, com na maioria das vezes, está nos olhos...


Jones F. Mendonça

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

GNOSTICISMO, TEILHARD DE CHARDIN E LITERATURA BRASILEIRA

Os Evangelhos gnósticos, 
de Elaine Pagels

Fala-se aqui e ali a respeito do que teria sido gnosticismo. Para uns, os gnósticos foram ascetas. Para outros, amantes da vida. Para uns eles defendiam a abstenção sexual. Para outros o prazer carnal. Há quem pense que o movimento foi uma heresia cristã. Outros entendem que foi um cristianismo mais autêntico. Geralmente se diz que o dualismo radical é uma de suas características fundamentais. Mas de acordo como Elaine Pagels a corrente gnóstica mais influente, o valentianismo, difere essencialmente do dualismo (dualistas seriam os gnósticicos sethinianos). Ora, não havia apenas um gnosticismo como também não havia (e não há até hoje) um só cristianismo. É preciso analisar os escritos gnósticos com cautela a fim de evitar simplificações. Muito do que foi escrito sobre o gnosticismo veio de seus opositores. A coisa não é tão simples como parece.

Em linhas gerais o movimento gnóstico defendia que o mundo foi criado por um deus menor, maligno, chamado de Demiurgo (artesão, em grego). Daí viria a rejeição pela matéria, obra desse deus mau. Libertar-se do corpo seria a maior meta do gnóstico. Livre desse “corpo de morte”, a alma poderia ascender até Deus e unir-se a Ele. Uma acentuada distinção entre o mundo terreno e o supra-terreno parece ser uma conseqüência óbvia dentro desse movimento. Agora veja só. O livro gnóstico de Tomé (também conhecido como “os ditos de Jesus”) anuncia que Deus não está distante dos homens. O lógion 77 declara que Ele pode estar tanto debaixo de uma pedra como dentro de uma madeira rachada pelo homem. O texto parece refletir a crença numa espécie de panteísmo (Deus e o universo se confundem) ou panenteísmo (o universo está contido em Deus), doutrina aparentemente incompatível com o dualismo maniqueísta que alguns afirmam ser doutrina fundamental para os gnósticos. O autor do livro de Tomé tem crenças muito parecidas com a de Valentino. No gnosticismo de Valentino a criação imperfeita não provém de uma falha moral do Demiurgo, mas de sua inferioridade em relação às entidades superiores. Tal crença permitiu que fosse construída uma visão mais otimista do mundo. Os padres apologistas combateram incansavelmente o gnosticismo e o cristianismo chamado ortodoxo venceu.  Mas com a descoberta dos manuscritos de Nag Hammadi, em 1945 no Egito, o movimento ganhou novo fôlego.  Recentemente acabei descobrindo por acaso que essa descoberta influenciou alguns escritores brasileiros.  

Há alguns dias recebi um pedido de ajuda do Wladimir, doutorando na UFBA e interessado na relação entre o gnosticismo e literatura brasileira (particularmente na obra de Lêdo Ivo). Queria saber se na história do cristianismo houve algum movimento ou personalidade que individualmente tivesse enfatizado a “transcendência na imanência”. Também buscava possíveis relações entre o gnosticismo e a ideia de um Deus indiferente, que não se ocupa da rotina diária dos homens. Expliquei-lhe que não sou especialista no assunto, mas que tentaria ajudá-lo dentro de minhas possibilidades. Respondi o e-mail e citei, dentre outras personalidades ligadas à Igreja, o padre jesuíta Teilhard de Chardin como sendo um interessante caso a ser investigado. Wladimir agradeceu a ajuda e me recomendou, caso o tema fosse do meu interesse, a leitura da tese do professor e poeta Cláudio Willer sobre a influência do gnosticismo na poesia contemporânea.

Aceitei sua sugestão e baixei a referida tese. Caso você também se interesse pelo assunto, tanto no aspecto teológico como literário, acho que valerá a pena dar uma lida.

Para baixar a tese, clique aqui.


Jones F. Mendonça

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

OS MANUSCRITOS DO MAR MORTO AGORA NUMA BIBLIOTECA DIGITAL

Por ocasião do 65º aniversário da descoberta dos manuscritos do Mar Morto a Autoridade de Antiguidades de Israel e o Google anunciaram na segunda-feira o lançamento de um site que disponibiliza aos estudiosos e a milhões de usuários em todo o mundo detalhes dos manuscritos do Mar Morto invisíveis a olho nu. Com tecnologia desenvolvida pela NASA ele exibe imagens infra-vermelhas em uma resolução de 1215 dpi, em escala 1:1, equivalente em qualidade aos pergaminhos originais.

Para dar uma olhada nos manuscritos, acesse o site The Leon Levy Dead Sea Scrolls Digital Library.  

Abaixo um vídeo de divulgação: 



Jones F. Mendonça

CURSO BÁSICO DE ÁRABE ONLINE [EM ESPANHOL]


Quem se interessa pelo árabe, idioma falado do Marrocos ao Iraque (os iranianos são persas e não árabes), certamente encontrará uma boa ajuda no site almadrasa.org. As lições estão em espanhol e foram preparadas por Muhammad Kanafani

A gramática, em 13 lições, encontra-se disponível aqui

Ouça o som das vogais e consoantes aqui

Baixe o curso em PDF aqui


Jones F. Mendonça

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

PASSEIO VIRTUAL EM JERUSALÉM

Que tal dar um passeio em Jerusalém sem correr o risco de se envolver numa briga entre radicais árabes e judeus? É, será um passeio virtual e você não poderá sentir o cheiro e as texturas dos objetos do lugar ou ouvir o "arranhado" som das consoantes guturais pronunciadas tanto por árabes como por judeus. Fazer o quê? 


Jerusalém vista a partir do Monte das Oliveiras

Jones F. Mendonça

domingo, 16 de dezembro de 2012

PERSÉPOLIS [LIVRO E ANIMAÇÃO]

Irã, 1978. O xá, Mohammad Reza Pahlavi, vinha tentando modernizar o país, mas acabou mergulhando o Irã no caos. Interessados no petróleo, os EUA e a Inglaterra o apoiaram. Enquanto isso, na França, exilado, o líder xiita Aiatolá Khomeini articulava a revolução e queda do xá. Seus pronunciamentos, transmitidos por telefone, eram gravados por seus seguidores e vendidos ao povo iraniano. O exército combatia os opositores do governo com violência. Teerã se transformou numa zona de guerra.

Com câncer e gozando de pouca popularidade, o xá fugiu do país em janeiro de 1979, abrindo espaço para o retorno do Aiatolá, que depôs o primeiro ministro Shapour Bakhtiar e criou uma república islâmica. O governo de Khomeini mostrou-se ainda mais violento que o do xá, apesar de suas promessas de “libertar o Irã da opressão”. Os costumes ocidentais, tais como maquiagem, jogo, cinema e música foram proibidos. Simpatizantes do xá foram perseguidos e executados.

No meio dessa confusão estava a família de Marjane Satrapi, uma menina de apenas dez anos que se viu obrigada a aceitar as rígidas imposições do regime islâmico. Aos 14 ela foi enviada para a Áustria por seus pais, que temiam a crescente violência que assolava o país. Marjani cresceu e escreveu um belíssimo livro em forma que quadrinhos: Persépolis. Nele ela relata suas angústias, aspirações e decepções em um mundo governado por muitos interesses (e ainda há que veja o mundo em preto e branco!).

Meu filho tem 12 anos, quase a mesma idade de Marjane quando irrompeu a revolução islâmica no Irã.  Pensei que seria uma boa leitura para suas férias. Até o momento ele tem se debruçado sobre o livro com muito interesse (mais pelo humor da autora e a qualidade dos desenhos que pelo aspecto político, confesso). Marjane não critica apenas os fanáticos religiosos muçulmanos. Também sobram críticas (algumas vezes bem sutis) para a política de alguns países ocidentais. Ah, mais um detalhe, os diálogos de Marjane com Deus (nem sempre amistosos) são uma barato. Se você tem um filho ou uma filha de doze anos, fica a sugestão.

Caso prefira assistir à animação, eis o vídeo:



Jones F. Mendonça

CTRL C; CTRL V - COPIAR E COLAR

O sujeito quer discutir a interpretação de um texto bíblico proposta por você. Ele sequer lê direito o que você escreveu. Só sabe que discorda da conclusão. Então ele faz o seguinte. Busca no Google um texto que apoie sua opinião e que foi escrito por alguém que ele julga dominar o assunto. Depois ele copia todo o conteúdo e cola no espaço reservado aos comentários do Blog (e nem se dá ao trabalho de citar a fonte). Diz que no grego a palavra em questão é um adjetivo pronominal, nominativo, masculino plural (em suma, encheção de linguiça visando me impressionar). Cita uma série de "estudiosos" que corroboram a interpretação que ele quer dar ao texto. Por fim (essa é clássica), afirma que "as melhores versões em português dizem que...". 

E o sujeito ainda acha que está abafando. 

Novatos...


Jones F. Mendonça

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O PAPIRO DE NASH ESTÁ ONLINE

Acabei de saber pelo Paleojudaica que o papiro de Nash, um pequeno fragmento de papiro contendo o decálogo e o shemá ("Ouve Israel", Dt 6,4) em hebraico (séc. II a.C.), está disponível on line. O documento é o mais antigo texto do Antigo Testamento e foi encontrado em 1902 no Egito. 

Para dar uma boa olhada no papiro visite o site da Biblioteca Digital da Universidade de Cambridge

Veja outros manuscritos hebraicos (como o Pentateuco samaritano - séc XII d.C.) disponíveis na biblioteca digital aqui

Jones F. Mendonça

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

ACHEI O SITE PERDIDO

Depois de uma busca incansável, encontrei o site perdido: The Metropolitam Museum of Art.  Lembrei-me que o site tinha uma linha do tempo, então fiz buscas no Google por "timeline", "artifact" e "archaeology". O tiro foi certeiro. 

Experimente fazer buscas com o recurso "timelines". Depois é só escolher a região, como por exemplo o "oeste da Ásia" e depois o "Mediterrâneo oriental" (para ver artefatos da Siro-Palestina) ou Iraque (para ver artefatos da Mesopotâmia). 

Escolhida a região, faça busca por período. Sensacional. 


Jones F. Mendonça

sábado, 8 de dezembro de 2012

VISÕES DE EZEQUIEL: SOBRE DEUSES, TRONOS E QUERUBINS [PARTE II]

No Salmo 18 Yahweh é apresentado voando montado em um Keruv (palavra geralmente traduzida por querubim, no plural). Na cena, raios e trovões abalam os céus. Das narinas de Yahweh saem fogo. Da sua boca fogo consumidor. Saraiva e brasas incandescentes anunciam o esplendor de sua glória.

Curiosamente pouca gente se pergunta de onde o salmista tirou os elementos dessa descrição, principalmente o trecho que descreve Yahweh voando num querubim.

Como o salmista, o profeta Ezequiel (caps. 1 e 10) também apresenta Yahweh voando sobre querubins (também chamados de grifos ou esfinges). Na mitologia oriental eles têm a função de proteger o recinto sagrado (é possível vê-los em templos assírios, babilônicos, persas, egípcios, etc.).  

Abaixo uma esfinge neo-assíria (chamada de Lamassu – 883-859 a.C.) com cabeça humana, corpo de leão e asas de ave (que também lembram as bizarras figuras presentes no livro de Daniel).

Fonte: The Metropolitam Museum of Art
Abaixo a representação de uma esfinge encontrada em Samaria (séc. VIII/IX a.C.), atualmente no Museu de Jerusalém, Israel. A influência egípcia é evidente:

Fonte: Google Art Project
Na visão de Ezequiel os querubins carregam o trono divino. Num selo sírio do século XIX/XVIII a.C. é possível ver uma cena semelhante. Nele uma divindade aparece sentada sobre um trono sustentado por touros (neste caso, sem asas):

Fonte: The Metropolitam Museum of Art

Não se deu por vencido? Quer a imagem de uma divindade sobre um trono carregado por um animal alado? Tudo bem, que tal esses selos fenícios do período aquemênida (séc. VI a IV a.C.)?

Fonte: site da Universidade de Oxford

Finalizo este post com a tela “A visão de Ezequiel”, de Rafael (perdoem Rafael pelos anjinhos nus rosados, coisa do renascimento). 

Fonte: Web Gallery of Art

Jones F. Mendonça

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

TESOURO PERDIDO, TESOUROS ACHADOS

Na busca por um site perdido usando o buscador do Google (conforme expliquei no post anterior), acabei encontrando Europeana. Muita coisa interessante! A página de exibições fica aqui. Mas talvez você queira ir direto para a página dos tesouros. Então clique aqui

Outro site muito útil é este aqui. Explore! 

Uma galeria de fotos de sítios arqueológicos, aqui

Também veja isto, isto, istoisto e isto

Por fim, dê uma olhada nisto, nisto e nisto

E o que eu queria mesmo não encontrei. Estou inconformado. 

Ah, não deixe de olhar isto


Jones F. Mendonça

UM SITE QUE SE PERDEU [QUE DROGA]

Passei o dia inteiro buscando em "meus favoritos" por um site que disponibiliza artefatos arquelógicos das mais diversas partes do planeta. As buscas podem ser feitas por período e por região. Uma "mão na roda". Andei navegando pelo referido site há alguns meses, mas infelizmente não tive o cuidado de guardar seu endereço.  Parece-se com o Google Art Project e com a Biblioteca Digital Mundial. Enfim: Não o achei. 

Esgotei todos os meus recursos. Não sei mais o que fazer. Alguém por aí pode me ajudar?

Jones F. Mendonça

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

VISÕES DE EZEQUIEL (PARTE I)

Estou em busca representações de tronos. Mas não de tronos comuns. Quero imagens de tronos sustentados por esfinges, grifos, querubins, "seres viventes" ou qualquer outro nome que lhes deem. Aliás, quero mais que imagens. Quero saber onde foram encontradas, quando, por quem, período em que foram confeccionadas e em que museu estão hospedadas. 

Ando fazendo buscas no Museu de Israel (via Google Art Project). Cliquei em "Coleções", "escolha o local", "Oriente Médio" e finalmente "Israel". Pronto, o acervo do museu surgiu em minha tela. A imagem que eu buscava finalmente apareceu:

Gravura em marfim encontrada em Megido, Israel
séc. XIII a.C. 

O Museu Nacional de Beirute ainda não colocou seu acervo no Google Art Project. Uma pena. Farei minhas próximas buscas no Museu Britânico e no Louvre de Paris. Os capítulos 1 e 10 do livro do profeta Ezequiel começam a fazer sentido. 

Jones F. Mendonça

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

NATIONAL GEOGRAPHIC PHOTO CONTEST 2012

O National Geographic Photo Contest 2012 termina hoje (30 de novembro). Abaixo uma das fotos enviadas pelos participantes.


Veja as 33 imagens selecionadas pelo The Big Picture aqui.

Técnica de pesca no Sri Lanka.

PALESTINA AGORA É UM ESTADO OBSERVADOR NÃO-MEMBRO

Israel, EUA e Canadá (e mais outros 6 países de menor expressão) opuseram-se à aceitação da Palestina como Estado observador não-membro (condição idêntica a do Vaticano). A Liga Anti-Difamação, o organização americana pró-Israel, classificou os países europeus que apoiaram o novo status da Palestina como covardes. A covardia, me parece, foi demonstrada pelos nove países que votaram contra. 

Jones F. Mendonça

terça-feira, 27 de novembro de 2012

O HEBRAICO E OS PICTOGRAMAS

No princípio eram os pictogramas, desenhos estilizados que representavam objetos ou seres. Mas escrever com pictogramas era uma atividade complicada e pouco prática. Movido pelo desejo de facilitar a nobre arte de escrever um sujeito iluminado teve a ideia de criar o sistema silábico. Os antigos símbolos gráficos passaram a representar sons e não mais ideias. E os pictogramas se fizeram sílabas e passaram a habitar entre nós. 

No site mantido por Jeff A. Benner você poderá conhecer a origem de algumas palavras hebraicas a partir de antigos ideogramas. A palava "pai", por exemplo, seria a junção do ideograma "cabeça de boi" (força) com o ideograma que representa uma casa. O resultado: pai = a força da casa (as mulheres não gostarão muito disso). Confesso que algumas das explicações não me convenceram, mas no geral elas fazem muito sentido. Divirta-se!


Imagens: http://www.ancient-hebrew.org. 

Jones F. Mendonça

domingo, 25 de novembro de 2012

A OMISSÃO DO VERBO “SER/ESTAR” NO HEBRAICO E A REVELAÇÃO DE YAHWEH A MOISÉS EM EX 3,14

Uma das características do hebraico bíblico é a omissão do verbo ser/estar (fenômeno semelhante ocorre no russo e no árabe). Cabe ao tradutor inseri-lo. Veja Ez 27,3 (trecho em hebraico):


O mesmo ocorre no aramaico bíblico. Veja Esd 5,14 (trecho em aramaico):


Há quem veja ligação entre a omissão do verbo e a revelação de Yahweh a Moisés em Ex 3,14: “E disse Deus a Moisés: Eu sou o que sou” (ou serei o que serei). Veja:

Ex 3,14 E disse Elohim (Deus) a Moisés:   SOU O QUE SOU.



Argumenta-se que o verbo é ocultado no hebraico para que nenhuma criatura se declare “Eu sou”, como fez Yahweh em Ex 3,14. Será?


Observe que em 1Sm 23,17 o mesmo verbo aparece (também na 1ª pessoa do singular no imperfeito do QAL). Quem fala não é Yahweh, mas Jônatas:

1 Sm 23,17  e tu reinarás sobre Israel, e eu serei contigo...


Mesmo que você não conheça o hebraico perceberá que o verbo (em vermelho) é o mesmo de Ex 3,14. Tal teoria, como se vê, não se sustenta.



Jones F. Mendonça

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

RASCUNHOS ESCATOLÓGICOS: A ARTE DE COSTURAR SONHOS


São Miguel, Ercole de Roberti
1470-73, Museu do Louvre
A escatologia, estudo das últimas coisas (ou das coisas últimas, como queiram), é um dos temas mais controversos do cristianismo. Nas teologias sistemáticas é aquela salada: Isaías + Ezequiel + Daniel + Jl + Zc + Dn +Mt + 2Ts + cartas joaninas + Apocalipse = mapa detalhado do fim dos tempos. Os teólogos são alfaiates, que cheios de criatividade costuram com muitos ajustes e remendos o destino da humanidade.

No Antigo Testamento as formulações escatológicas fluem como o rio de Heráclito. Inicialmente a era de ouro é apresentada como um governo davídico redivivo (como Is 9,1-6; 11,1-10; 16,5; Jr 23,5s.; 33,5s.). É o futuro à luz do passado. Não há céu nem inferno, só o Sheol, mundo de sombras, onde não há conhecimento nem sabedoria. No Egito já se falava em ressurreição, como atestam textos da XVIIIª Dinastia (1550-1307). Em Israel pregavam-se apenas recompensas terrenas. Ainda não havia surgido remédio para a morte.

Num segundo estágio (ou terceiro, como se verá adiante) surge a ideia de um governo divino sobre um povo restaurado. É o próprio Yahweh quem intervém no mundo. No chamado “grande apocalipse de Isaías” (Is 24-27, texto que deve ser datado para um período que vai do século VI ao IV e que não deve atribuído ao proto-Isaías), consta que Yahweh vai “arrasar e devastar a terra”, punindo todos os que “desobedecem aos seus decretos”. Sinais nos céus anunciarão este dia, no qual Yahweh “destruirá a morte” e “enxugará toda a lágrima”. A ira de Yahweh, executada por meio de sua “espada severa”, castigará o Leviatã, a “serpente veloz” (uma variante lingüística para Lotan, um dragão derrotado por Baal na mitologia de Ugarit) e Israel, finalmente, será um só povo. Surge o antídoto para a morte (vida eterna na terra e ressurreição dos mortos), mas ainda não se fala em céu (recompensa num mundo supraterreno), nem em inferno (punição eterna).

É curioso notar que no Trito-Isaías (Is 65-66), aparentemente escrito numa época mais recente, não aparece a crença na vida eterna na terra, mas a esperança de que o povo de Yahweh terá “vida longa como a árvore” (ver Is 65,20-22). Tampouco se fala em ressurreição dos mortos. Ao que parece, se considerarmos a ideia da ressurreição uma inovação dos teólogos israelitas do período exílico ou persa, Is 65-66 possui uma redação mais antiga que Is 24-27. Talvez seja necessário inserir o pequeno apocalipse de Isaías entre o primeiro e o segundo estágio. Caso consideremos até aqui uma evolução em três estágios, as idéias escatológicas fluem da seguinte forma:
1) Primeiro estágio: Messias da dinastia davídica (Proto-Isaías);

2) Segundo estágio: É o próprio Yahweh quem restaura Israel (Trito-Isaías – Is 65-66);

3) e o terceiro estágio: Ressurreição dos mortos e a vida eterna (Grande apocalipse de Isaías – Is 24-27). 
No último estágio, bem representado pelo livro de Daniel (que deve ser situado na época do levante macabeu e não no século VI), aparecem algumas inovações: fala-se de uma ressurreição para a “vida eterna” e outra para a “vergonha eterna” (Dn 12,2). A intervenção divina se dará pela ação de um “rei guerreiro” (Dn 11,3). Vale notar a designação dada a Yahweh como “Deus do céu”, presente em livros pós-exílicos como Esd, Ne, Jt e Tb. Yahweh ultrapassa sua limitação à religião judaico-israelita e se torna o Deus universal. Não é sem razão que este último estágio tem sido chamado de “estágio transcendental”. O embate entre Miguel, o “cabeça dos primeiros” e seu oponente, o “cabeça do reino da Pérsia”, anuncia o dualismo que vai marcar toda a teologia do Novo Testamento.

Em breve espero publicar algo sobre a escatologia nos livros apócrifos.


Jones F. Mendonça