1. Faço investigações a respeito das demonstrações de afeto no Antigo
Testamento, particularmente do beijo. É possível encontrar beijos paternos (Gn
31,55), beijos ardentes (Ct 1,2), beijos de reconciliação entre irmãos (Gn
34,4), beijos de despedida no leito de morte (Gn 50,1), beijos entre sogra e
noras (Rt 1,9.14) e até beijos entre homens guerreiros (1Sm 20,41).
2. Em minha pesquisa também procurei saber como as versões traduzem tais
textos. Para minha surpresa a Bíblia de Jerusalém troca “nashaq” (beijo, em
hebraico) por “abraço” quando Jônatas beija Davi (1Sm 20,41 – além de se
beijarem, choram copiosamente) e quando Noemi beija suas noras (Rt 1,9.14). Faz
isso certamente para evitar que o leitor veja nos versos qualquer indício de
relação homoafetiva.
3. Na epopeia de Gilgamesh, uma das histórias mais antigas da terra, o
herói Gilgamesh chora amargamente enquanto se despede de seu inseparável amigo
Enkidu, morto por derrotar o touro celeste enviado pela deusa Ishtar. Não seria
prudente dizer, de forma precipitada, que Enkidu e Gilgamesh (e Davi e Jônatas)
desenvolveram uma relação homoerótica. Ao mesmo tempo não é honesto torcer o
texto com finalidade moralizante.
4. Quem estiver interessado em ler a história de Enkidu e Gilgamesh em
formato HQ, pode encontrar duas obras muito bem ilustradas: “Cânone Gráfico 1”
(autores diversos) e “Os melhores inimigos” (Jean-Pierre Filiu). Aos interessados
em uma análise da relação entre Enkidu/Gilgamesh; Davi/Jônatas, sugiro:
"When Heroes Love: The Ambiguity of Eros in the Stories of Gilgamesh and
David", escrito por Susan Ackerman.
Jones F. Mendonça