domingo, 13 de março de 2016

SOBRE COISAS INÚTEIS, VÃS E SEM SENTIDO

“Vaidade das vaidades, tudo é vaidade”, diz Qohelet (ou “o pregador”, em Ecl 1,2). Vaidade aí é hevel = sopro, fumaça, névoa, como em Jó 7,16: “minha vida é um sopro (hevel), ou como em Zc 10,2 “os adivinhos oferecem consolações vãs (hevel)”.

Uma vez que a palavra “vaidade” (=natureza daquilo que é vão, inútil) tem, nos dias de hoje, sentido bastante restrito, geralmente designando alguém que se preocupa demais com sua própria aparência, a tradução clássica “vaidade das vaidades, tudo é vaidade” acaba não reproduzindo bem o sentido do texto hebraico.  

Quem lê o livro com atenção percebe a tônica do seu discurso: “não há nada de novo debaixo do sol” (Ecl 1,9), logo, “tudo, inclusive o que parece novo, inédito, é hevel, névoa”. “Muita sabedoria, muito desgosto” (1,18), por isso “tudo, inclusive a sabedoria, é hevel, neblina”. “Quem ama o dinheiro nunca está farto” (5,10), daí a declaração “tudo, inclusive a riqueza, é apenas fumaça”.

O livro teria tom pessimista e negativo se aconselhasse a abolição da vida, a supressão do prazer ou o desprezo pelo mundo sensível, mas na verdade consiste numa “exaltação da alegria” (8,15; ver ainda 52,24 e 5,18). Embora a vida pareça suspensa sobre o vazio – diria Qohelet - viva-a com todas as tuas forças.



Jones F. Mendonça

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