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Salmos, Isaías e Jó contém resquícios de relatos da criação conhecidos pelos hebreus antes da redação do Gênesis, oriundos do ambiente cananeu. Vejamos:
Sl 74,12-17 Tu porém, ó Elohim, [...] 13 dividiste o mar com teu poder, quebraste as cabeças dos monstros das águas; 14 tu esmagaste as cabeças do Leviatã dando-o como alimento às feras selvagens; 15 Tu abriste fontes e torrentes, tu fizeste secar rios inesgotáveis; 16 o dia te pertence, e a noite é tua, tu firmaste a luz e o sol, 17 tu puseste todos os limites da terra, tu formaste o verão e o inverno.
Textos descobertos no século XX em Ugarit, Síria, revelaram
que este texto do Salmo é um resumo de um mito da criação cananeu que descreve
Baal, deus da tempestade, derrotando Yam, o deus do mar e seus ajudantes.
Em Is 27,1 e Jó 26,12-13 a luta entre o deus de Israel e os monstros
mitológicos (“Leviatan, serpente escorregadia”; “Leviatan, serpente tortuosa”,
o “Monstro que habita o mar”, “Rahav” e “Yam”) inquietam leitores desavisados:
Is 27,1 Naquele dia, punirá Javé, com a sua espada dura, grande e forte, a Leviatã, serpente escorregadia (Leviatan nahash bariah), a Leviatã, serpente tortuosa (Leviatan nahash ‘aqalaton), e matará o monstro que habita o mar (hataniyn ’asher bayam).
Jó 26,12-13 Com seu poder aquietou o Mar (Yam), com sua destreza aniquilou Rahav. 13 O seu sopro clareou os Céus e sua mão traspassou a Serpente escorregadia (nahash bariah).
Descrições semelhantes podem ser encontradas nos mitos
ugaríticos:
Quando você matou Litan, a serpente fugitiva, aniquilou a serpente sinuosa, o potentado de sete cabeças (SMITH, Mark S. The origins of monotheism, p. 33).
O relato de Gênesis, ao invés de se inspirar no mito
cananeu, busca na Mesopotâmia elementos para a elaboração de seu relato da
criação. O redator israelita atua como uma espécie de C. S Lewis, usando
mitologia estrangeira para incutir teologia israelita na mente do povo (C. S.
Lewis usou mitologia nórdica em seu “As crônicas de Nárnia” para incutir
teologia cristã).
A luta entre divindades e monstros não se restringe aos
cananeus (Baal versus serpentes
marinhas) ou babilônios (Marduk versus
Tiamat). Na mitologia grega, Zeus mata Typhon; na mitologia nórdica Thor mata
Jörmungandr; na mitologia hindu, Indra mata Vrtra; na mitologia eslava, Perun
mata Veles; e na mitologia hitita; Tarhunt mata Illuyanka.
Até hoje a luta entre heróis e monstros poderosos que
ameaçam a ordem fazem sucesso hipnotizando multidões. O tema é muito bem
explorado, por exemplo, nas trilogias de J. R. R. Tolkien (“O senhor dos anéis”
e “Hobbit”). Quem não se lembra da batalha travada entre o mago Gandalf e o
demônio Balrog na ponte Khazad dûn? Ou do confronto entre Bard e o dragão Smaug,
morto com uma flecha negra após um certeiro disparo feito de uma torre prestes a
ruir?
Jones F. Mendonça
Não entendi, então o deus do VT não é Deus?
ResponderExcluirO único Deus da Bíblia meu amigo é aquilo que sempre foi.
ExcluirO logos, a lógica , só que a religião vendeu este personagem como indivíduo para o mundo.
Não se trata disso. Tudo o que podemos dizer é que os escritores bíblicos se apropriaram de relatos mitológicos estrangeiros com o propósito de inculcar sua própria teologia no povo. O Salmo 18, por exemplo, descreve Javé voando nas asas de um querubim. Ora, também era assim que as divindades dos povos vizinhos se locomoviam no céu.
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