Nas extremidades do cabo de força que atravessa a Síria há dois
pilares principais de potências militares: a) Russia e Irã apoiam o ditador Bashar al-Assad;
b) EUA e alguns países europeus depositam suas fichas nos rebeldes que querem
derrubá-lo. Esses dois principais grupos de interesse agem, de forma bastante simplificada, do seguinte modo:
Grupo 01 (Rússia/Irã) - Embora seja um ditador sanguinário, Assad mantém um governo
laico que sempre protegeu minorias religiosas, tais como cristãos, drusos, alawítas
e xiitas. A Rússia marca sua presença na Síria no porto de Tartus, sua única
base naval no Mediterrâneo. O Irã age no país armando o Hezbollah, grupo
paramilitar libanês.
Grupo 02 (EUA/Europa) - EUA e Europa, ávidos pela queda do ditador, estão dispostos
inclusive a apoiar rebeldes extremistas para alcançar seus interesses. A
pergunta é: sem Assad a vida na Síria será melhor ou seu destino será
semelhante ao da caótica Líbia depois da queda de Kaddafi pela intervenção
militar da NATO em 2011?
No meio dessa disputa está o povo, que atravessa desertos e mares
na esperança de encontrar uma terra segura para viver. Quem atribui a culpa
pelo conflito a apenas um país, religião, governante ou grupo armado ignora ou finge ignorar os diversos fatores que fizeram da Síria uma canoa à deriva num oceano em revolta.
Ontem, enquanto lia (com embrulho no estômago) texto escrito
pela missionária ex-presidente da missão JOCUM no Brasil, Braulia Ribeiro (Título: “Não tenho culpa pela tragédia do menino sírio”), deparei-me com esta frase referindo-se aos refugiados sírios: “vão
se entrincheirar em guetos culturais e exigir a prática legal da Lei Sharia” [para
quem não sabe, a Lei Sharia é a lei islâmica]. Mais adiante diz: “O culpado
único desta tragédia é o islamismo em todas as suas formas, radicais ou não”
(destaque para “radicais ou não”).
É claro, óbvio, que a Europa precisa ter cuidado com
refugiados que atravessam suas fronteiras, sejam eles muçulmanos,
cristãos, budistas, etc. Mas Braulia trata todos os fugitivos da guerra como se fossem
fundamentalistas defensores de um Estado governado pela lei islâmica. Enxerga o
conflito como se fosse o resultado de um agente apenas: o islamismo. Tem visão atomizante
e reducionista do mundo. Revela uma percepção manca da realidade.
Jones F. Mendonça
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