Uma
tartaruginha marinha sai do seu ovo numa praia qualquer da América do Sul. Surpreendentemente ela não hesita e parte imediatamente para o lugar mais
improvável: as agitadas ondas do mar. Ninguém ensinou aquela coisinha miúda a
andar, nadar, tampouco que o mar é um bom lugar para se viver. Mas é para lá
que ela vai com todas as suas forças.
Uma
ninhada de pintainhos acaba de nascer numa fazenda no sul da França. Mal saem
dos ovos os desajeitados pintainhos partem para uma área descoberta e se deparam com um falcão. A
reação é imediata. Os pintainhos fogem apavorados. O comportamento se repete até mesmo quando
avistam um falcão de madeira. Curiosamente eles não temem aves como pombos
ou pelicanos. Tal comportamento não foi ensinado pelos pais ou por outros
membros da espécie, mas recebidos por herança. A origem desse fenômeno está no
sistema nervoso central e é acionado pelos “mecanismos liberadores inatos”.
Outro
fenômeno curioso observado em animais é a estampagem (imprinting). O etólogo Konrad Lorenz notou que nas primeiras horas
de vida um patinho tem grande probabilidade de se apegar à primeira coisa que
vê. Ele adorava entrar na sala de aula acompanhado de patinhos “apaixonados”. Diferentemente
do comportamento das tartarugas e dos pintainhos, a ligação entre os patinhos e
o “objeto amado” é adquirido em vida. Estudos sobre a ocorrência da estampagem
em seres humanos não são conclusivos.
Há
paralelos entre as observações feitas pelos etólogos e a psicanálise. Carl Jung,
por exemplo, percebeu que a psiquê humana possui um substrato psíquico comum de
caráter inato (que ele chamou de inconsciente coletivo). Tal substrato psíquico
pode se manifestar em sonhos ou mitos, apresentados na figura dos arquétipos. O
inconsciente coletivo se distingue do inconsciente pessoal. Este último não possui
caráter universal ou hereditário, mas contém lembranças perdidas ou reprimidas
(não apenas de cunho sexual, como sustentava Freud).
As
implicações das teorias de Jung são óbvias: no subterrâneo da nossa psique agem
forças que escapam ao nosso controle. O homem não está preso somente ao passado
de sua infância, mas também ao passado de sua espécie. Coube a Jung colocar a psiquê
dentro do processo evolutivo.
Jones
F. Mendonça
"Mecanismos liberadores inatos", sempre quiz saber o nome disso!
ResponderExcluirMuito interessante a descoberta do Carl Jung. Do pouco que eu estudei de Freud eu concordo com quase tudo, mas com certeza deve haver algo mais.
Tiarles,
ResponderExcluirHá ainda o "Mecanismo liberador inato modificado pela experiência" (MLIME) e o "Mecanismo liberador aprendido" (MLA).
Mas sem dúvida o MLI é o mais fascinante.
Um abraço!