Em hebraico: "havel havalim 'amar qohelet havel havalim hakol havel". |
É muito conhecido o versículo de Eclesiastes que diz: “vaidade das vaidades, diz o pregador, vaidade das vaidades, tudo é vaidade” (Ecl 1,2). A palavra traduzida por vaidade neste texto é hevel e pode significar, dentre outras coisas, sopro, névoa ou fôlego. Em Ecl 1,2 ela aparece sob diversas formas: construto, plural e em pausa, por isso a pequenas variações vocálicas (pontinhos e/ou tracinhos abaixo das letras).
E curioso notar que havel (uma variação de hevel) é o nome do filho de Adão que foi assassinado por seu irmão Caim. Como sabemos, Havel (Abel na forma aportuguesada) teve a vida curta como um sopro. Obviamente o nome foi colocado intencionalmente por quem contou a história, coisa típica na literatura israelita.
Em minha opinião traduzir o termo por vaidade não expressa bem o sentido que tem no texto original. A palavra vaidade vem do latim vanus = vazio. Teoricamente é adequada para traduzir a palavra hebraica hevel (coisa que se vai com facilidade ou sem sentido), porém no contexto atual vaidade nos remete à presunção, ostentação, vanglória, etc. Em suma, a palavra perdeu o sentido que tinha originalmente.
A Almeida Revista e atualizada e a Bíblia de Jerusalém ainda empregam o termo “vaidade” como tradução para hevel. A NVI e a BLH, apesar de muito criticadas (algumas vezes com certa razão, principalmente e BLH), expressam melhor o sentido de hevel:
“Que grande inutilidade!”, diz o Mestre. “Que grande inutilidade! Nada faz sentido!” (NVI).
É ilusão, é ilusão, diz o Sábio. Tudo é ilusão (BLH).
Quem lê todo o livro percebe que a intenção de Qoelet (pessoa que preside uma assembleia) é mostrar a efemeridade e falta de sentido da vida: Tudo se repete num ciclo sem fim; algumas vezes o perverso prevalece sobre o justo; os bens materiais de nada valem, não há sequer retribuição no além, etc. No fim do livro, após discorrer sobre tantas questões cujo sentido não pode ser encontrado, Qoelet se agarra ao que julga ser seu único fundamento:
Agora que já se ouviu tudo, aqui está a conclusão: Tema a Deus e guarde os seus mandamentos, pois isso é o essencial para o homem (Ecl 12,13).
Bem, é claro que não estou levando em conta as várias camadas redacionais do livro. É provável que o extrato original fosse bem mais pessimista. Como Eclesiastes aniquila a teologia da retribuição, talvez venha daí seu papel de “patinho feio” do Antigo Testamento. É um dos meus preferidos.
De longe, meu preferido para "teologia". Não tenho dúvidas de que 12,13 é acréscimo. Aliás, no v, 12,1, é "criadores", não "criador"...
ResponderExcluirPlural como em Is 54,4 (se bem que o verbo lá é outro). Bem estranho...
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